MPF investiga omissão da Faculdade de Direito da UFMG em fala homofóbica de professor

Hoje em Dia
08/07/2015 às 16:21.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:49
 (Frederico Haikal / Hoje em Dia)

(Frederico Haikal / Hoje em Dia)

A Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) terá 15 dias para acatar recomendações feitas pelo Ministério Público Federal (MPF) sobre atos homofóbicos praticados por um professor da instituição, em março deste ano. O MPF instaurou um inquérito sobre o caso e denunciou omissão da instituição educacional quanto ao episódio.   Segundo o Ministério Público Federal, uma representação encaminhada pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), detalha que nos dias 23 e 26 de março deste ano, o professor e também desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, teria feito comentários discriminatórios em sala de aula ["Graças a Deus, existe um pouco de heterossexualidade no Direito"], além de críticas às cenas com um casal de lésbicas da novela Babilônia, da TV Globo.   Após a suposta fala preconceituosa, vários alunos se retiraram da sala de aula, como forma de manifestar sua discordância com o que fora dito pelo professor. Ele, então, teria repreendido os estudantes, chamando-os de "vagabundos".   Os alunos chegaram a realizar protestos contra a atitude do professor e pedindo a saída dele da instituição. O caso também ganhou repercussão nas redes sociais e pela imprensa. Até um "beijaço" foi organizado em frente ao prédio da UFMG como forma de protesto pelo comentário do educador.   Segundo a assessoria de imprensa da UFMG, logo que a diretoria da Faculdade de Direito tomou conhecimento dos fatos, em março deste ano, criou uma sindicância para apurar o caso. Atualmente o trabalho está em caráter de sigilo e em fase de apuração. A instituição classificou como inverídica a acusação de que está sendo omissa sobre o episódio e informou que não recebeu a notificação oficial do MPF.   Inquérito   Segundo o MPF, houve uma série de fatos que demonstram que a Diretoria da Faculdade de Direito, a Coordenação do Curso e a própria Reitoria da UFMG omitiram-se na investigação do ocorrido, inclusive com possível assédio aos alunos para que relevassem os fatos.   Após receber um requerimento da turma do 5º período pedindo o afastamento do professor, a coordenação do curso convocou uma reunião durante a qual afirmou que tal ato seria "impossível" e o melhor seria que os alunos se abrissem ao diálogo. A diretoria, por sua vez, resistindo à instauração de procedimento administrativo para apurar os fatos, além de lembrar que a turma continuaria tendo aulas com o mesmo professor inclusive nos períodos subsequentes, ainda teria afirmado que, em caso de sindicância, "se quisesse, poderia manipular a comissão". O vice-diretor também teria insistido na tese de que a melhor solução seria por meio do diálogo, já que eventual denúncia formal "transformaria a situação em puro litígio" e que eventual punição ao professor "não passaria de advertência".   Inconformados com a postura adotada pela direção da escola, professores e alunos protocolizaram, na Reitoria da UFMG, um documento intitulado "pedido de instauração de processo administrativo disciplinar", por meio do qual pediu-se não só a apuração dos fatos, como o afastamento cautelar do professor, do diretor e vice-diretor da Faculdade de Direito e da coordenadora do curso. Mas, também na Reitoria da UFMG, o caso não teve qualquer andamento.   A situação, já repudiada oficialmente pelos órgãos de representação dos alunos, como o Centro Acadêmico Afonso Pena (CAAP) e o Centro Acadêmico do Curso de Ciências do Estado (CACE), foi alvo ainda de cartas de repúdio emitidas pelo Conselho Nacional dos Direitos Humanos e pela seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que pediu "rigorosa apuração dos fatos, através de devido processo legal, esperando que caso uma vez confirmadas as graves denúncias, sejam os autores punidos e, ainda, a retratação pública do professor.   Homofobia institucional   Para o MPF, a sequência dos fatos indicam a necessidade de se apurar "a possível omissão da Universidade Federal de Minas Gerais na adoção de medidas administrativas aptas a coibir, seja prevenindo, seja sancionando, a ocorrência de práticas e discursos discriminatórios em razão da orientação sexual, no âmbito acadêmico".   "A omissão leva à reiteração de condutas assemelhadas e não poderá prevenir possíveis retaliações a discentes, docentes e servidores que, por se sentirem agredidos ou por qualquer outro motivo, levarem ao conhecimento das autoridades a notícia da ocorrência de atos homofóbicos", afirma o procurador regional dos Direitos do Cidadão substituto, Helder Magno da Silva.   Segundo ele, diante das denúncias que recebeu, era dever da direção da escola instaurar sindicância para apuração dos fatos, conforme determina o próprio Regimento Interno da UFMG. A falta de qualquer ação nesse sentido, inclusive pela própria Reitoria, "podem caracterizar a existência de verdadeira homofobia institucional, internalizada nas práticas cotidianas no âmbito dos diversos órgãos da administração da UFMG".   O MPF oficiou a todos os órgãos de direção pedindo esclarecimentos sobre os fatos no prazo máximo de 15 dias. Foi encaminhado ofício também ao professor., indagando se ele deseja se retratar publicamente e celebrar termo de ajustamento de conduta para compensar os danos morais individuais e coletivos decorrentes de seus atos.   Além dos ofícios, foram encaminhadas duas recomendações. A primeira, dirigida ao diretor e ao vice-diretor da Faculdade de Direito, assim como à coordenadora do curso, recomenda a substituição cautelar do professor nas disciplinas subsequentes à de Direito Processual Civil I, afastando-se o costume vigente na faculdade segundo o qual um mesmo professor ministra todas as disciplinas da matéria, acompanhando a turma. Recomendou-se ainda a adoção de mecanismos específicos para revisão de notas e abono de faltas atribuídas pelo professor aos alunos da Turma A do 5º período, de forma a afastar qualquer possível ato de retaliação.   A segunda recomendação, encaminhada ao reitor da UFMG, além de reiterar a necessidade de substituição cautelar do professor e de revisão das notas e faltas atribuídas aos alunos, pede imediata apuração dos fatos e adoção de mecanismos internos para coibir a ocorrência de práticas e discursos homofóbicos no âmbito da universidade.
  Atualizada às 19h

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