Site de streaming investe em filmes de arte assinados por nomes consagrados

Paulo Henrique Silva
30/12/2018 às 07:00.
Atualizado em 05/09/2021 às 15:48
 (Netflix/Divulgação)

(Netflix/Divulgação)

Na imprensa e nas redes sociais, a última semana foi marcada pela divulgação de listas e mais listas de melhores filmes do 2018. A tradicional votação de final de ano suscitou controvérsia, menos pelos filmes e mais pelo local de exibição, já que não restou outra alternativa aos críticos a não ser incluir os lançamentos dos sites de streaming, em especial da Netflix.

Algumas das melhores produções não passaram perto das sala de cinema antes de ir para os canais da internet. Entre eles, “Roma”, de Alfonso Cuarón, grande vencedor do Festival de Veneza e nome certo entre os indicados ao Oscar 2019; e “A Balada de Buster Scruggs”, dos prestigiados irmãos Coen (de “Fargo”).

“A Netflix teve esperteza ao investir no segmento dos chamados filmes de arte. Além de ter blockbusters no catálogo, a empresa notou que também seria importante, em termos de prestígio e de imagem, investir em obras elogiadas pela crítica e premiadas em festivais. Eles não só entraram com dinheiro na produção de filmes de diretores consagrados, como também passaram a comprar direitos de exibição de outros que passaram por festivais importantes”, registra Bruno Ghetti, crítico da Folha de São Paulo.Netflix/Divulgação

"A BALADA DE BUSTER SCRUGGS” Assinatura dos irmãos Coen


Catálogo variado

Para o crítico pernambucano Luiz Joaquim, do site Cinema Escrito, é uma estratégia de mercado, levando-se em conta que, “por princípio comercial, o público da Netflix deve ser irrestrito – ou seja, do cliente que ama ‘Sessão da Tarde’ ao que se amarra na mais atual produção alternativa da Bielorrússia”. Assim se justificaria investir no mais variado catálogo que estiver ao seu alcance.

Chico Fireman, do blog “Filmes do Chico”, lembra que, até o ano passado, era difícil fazer uma lista de grandes filmes originais da Netflix. “Tentei e desisti. Neste ano, bancando ‘Roma’, abraçando os irmãos Coen e finalizando um filme do Orson Welles (‘O Outro Lado do Vento’), a Netflix baixou a crista e procurou e apostar em autores respeitados”, registra.

Ponto de consenso entre os críticos é o benefício da investida, já que o acesso do público a filmes de arte é, historicamente, limitado. “Com o alcance mundial, fazer-se um canal de escoamento de filmes mais autorais só pode ser bom”, pontua Joaquim. “Projetos condenados a jamais saírem do papel – ou a nunca conseguir espaço no circuito comercial – se tornaram viáveis”, concorda Ghetti.Netflix/Divulgação

“LAZZARO FELICE” Drama italiano premiado de Alice Rohrwacher

Críticos receiam que Netflix impeça exibição nos cinemas

Para Bruno Carmelo, crítico do site “Adoro Cinema”, era de se esperar que a Netflix buscasse a legiti-mação das grandes premi-ações de cinema e dos festivais internacionais, provando a capacidade de fazer filmes tão bons quanto aqueles das produtoras consagradas, em atividade há décadas.

“Compreende-se que, em meio às produções firmemente controladas dos estúdios tradicionais, nomes como Alfonso Cuarón, Bong Joon-ho e Martin Scorsese fossem seduzidos pela liberdade que a Netflix aparenta dar a seus criadores”, afirma Carmelo.

Entre os filmes mais vistos em 2018 na telona, os super-heróis continuam dando as cartas. No Brasil, o terror “A Freira” e o drama erótico “50 Tons de Liberdade” ganharam destaque

Segundo ele, esta é a contrapartida necessária para dominar a cadeia produtiva de um filme, desde a produção até a distribuição, concentrando também os lucros ao privar os exibidores das sessões em cinemas tradicionais. Um dos pontos, aliás, que vêm sendo contestados por realizadores e críticos.

Carmelo observa que, para além da batalha entre produtores e exibidores, o quadro que se desenha agora é a dissolução do cinema como evento, como forma de espetáculo, em que ver um filme implicava no deslocamento à sala, à compra do ingresso e à experiência coletiva. 

“Agora, é reduzido ao objeto-filme, independente das condições da exibição – seja ela no cinema, na TV ou na tela do telefone celular. Perde a aura cinéfila associada à qualidade do ver para se ater ao conteúdo visto, ou à quantidade de filmes vistos”, lamenta o crítico do “Adoro Cinema”.

Imersão

Bruno Ghetti sublinha que um filme não deixará de ser grandioso devido à forma de exibição. Mas concorda que a experiência de ver numa tela grande, em sala escura, com som e projeção de qualidade, sem interrupções, tende a ser melhor, por ser “mais imersiva”.

“São percepções distintas, a de ver filmes assim em casa e vê-los numa boa sala de cinema. É científico. Dimensão, nitidez, isolamento e volume influenciam na nossa capacidade de imergirmos num filme”, observa Luiz Joaquim. O medo dele é que, cada vez mais, os filmes não tenham a possibilidade de serem exibidos numa tela grande.

O diretor e crítico Arthur Tuoto concorda que são experiências dfierentes, mas ressalta que, muitas vezes, as projeções nos cinemas não são boas. "Devemos ver o filme, sim, nas melhores condições possíveis, mas não podemos deixar isso nos limitar. Um filme será bom em qualquer formato. Na sala de cinema ou no notebook, vamos tirar alguma coisa daquela experiência", analisa.

  Editoria de Arte

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