Sonegação de impostos: o desamor à pátria de cada dia

Giulia Mendes - Hoje em Dia
12/06/2015 às 06:33.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:27

O foco do debate nacional em torno da corrupção acaba encobrindo males de grandes proporções, com custo muitas vezes superior ao estimado em relação ao desvio de dinheiro. É o caso da sonegação de impostos, prática que passou a ser considerada “normal” por muitos brasileiros, cidadãos que enaltecem o amor à pátria, mas deixam de pagar impostos que deveriam ser utilizados para investimento em saúde, educação, saneamento básico e segurança pública.


A cada ano, R$ 500 bilhões deixam de ser recolhidos aos cofres públicos no país com a sonegação de impostos, segundo o Sindicato dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz). O valor equivale a sete vezes o tamanho da corrupção (R$ 67 bilhões anuais), conforme estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).


Nos primeiros meses de 2015, já foram sonegados quase R$ 250 bilhões, enquanto cerca de R$ 900 bilhões foram pagos pelos cidadãos, até agora.


Cultura


A cultura brasileira é permissiva com a sonegação e a corrupção, na opinião do presidente do Sinprofaz, Heráclio Camargo.


“Esse é o país da impunidade. Além de ser uma questão cultural em todos os segmentos da sociedade, o problema fica mais grave porque o governo ainda não adotou uma postura de combate com efetividade à corrupção dos grandes lavadores de dinheiro”, diz Camargo, lamentando a existência de mecanismos sofisticados para práticas de lavagem de dinheiro e caixa dois. “Sem a estruturação necessária, fica muito difícil combater esses crimes”, diz.


Combate defasado


Segundo o presidente do Sinprofaz, a carreira que combate crimes de sonegação está sucateada.


“Temos mais de 400 vagas de procurador da Fazenda Nacional sem preenchimento, não temos apoio, nem estagiários e as instalações são precárias”, critica.


O professor de antropologia da Universidade do Estado do Mato Grosso do Sul (UEMS) João Paulo Aprígio avalia que não adianta ir a manifestações contra a corrupção se atos que batem de frente até mesmo com a moral são cometidos.


“A corrupção é uma palavra muito vaga. Porém, é necessário ter consciência de que ela não está lá longe, no político. Ela está aqui, em todos nós, e é importante combatê-la em todas as instâncias”, afirmou.


A corrupção no Brasil é institucionalizada por meio do “jeitinho brasileiro”. “As pessoas estão muito preocupadas com os atos do outro e se esquecem do que fazem”, diz Aprígio.


‘Fuga’ do pagamento de tributos onera toda a sociedade


A história de que o brasileiro paga impostos e não recebe serviços adequados tem servido como álibi para a má conduta cidadã, vitimizando quem deveria contribuir mais para o bem estar social, avalia o presidente do Sinprofaz, Heráclio Camargo.


“Essa história de sonegar como legítima defesa é uma grande estupidez, é inocência. Normalmente, quem diz isso não sabe que está pagando na fonte todo mês, em serviços e produtos, e premiando aqueles que conseguem sonegar verdadeiramente, os grandes corruptos”, afirmou.


Para o presidente executivo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributação (IBPT), João Eloi Olenike, a sonegação, a inadimplência de impostos, a pirataria e a informalidade são praticadas também por pessoas que não têm condições de pagar os tributos. “Nem sempre esse tipo de situação ocorre porque as pessoas são ‘sem vergonha’ ou querem burlar o Fisco. A alta carga tributária acaba levando a esse processo de ‘defesa’ de alguns contribuintes”, disse.


Segundo Olenike, o dinheiro arrecadado com impostos no Brasil acaba sendo utilizado com o próprio governo, funcionalismo público e com os gastos correntes da União. “Infelizmente, não é direcionado para a população, como gostaríamos.”


O mestre em Ciência Política e professor do Ibmec Adriano Gianturco acredita que os hábitos corruptivos são frutos dos sistemas implantados no país. “O Brasil tem o sistema fiscal mais complexo do mundo, o que acaba incentivando atos para burlar as regras”, observa.


Dentre pessoas físicas fiscalizadas pela Receita, as autuações se concentram nos contribuintes cuja principal ocupação declarada é a de proprietário de empresa

Os tributos mais sonegados incidem sobre atividades de pessoas jurídicas, nos âmbitos federal, estadual e municipal. As autuações se concentram no segmento industrial

 

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