Padre não foi excomungado por defender gays, diz Igreja

Chico Siqueira, especial para a AE
30/04/2013 às 18:33.
Atualizado em 21/11/2021 às 03:18

Um dia depois de excomungar o padre Roberto Francisco Daniel, mais conhecido como padre Beto, a Igreja Católica tenta desvincular a relação da pena eclesiástica da defesa que ele fazia dos direitos dos homossexuais pela internet, em declarações, nas aulas e nos sermões das missas. Em nota distribuída pela assessoria do bispado de Bauru (SP), o juiz-instrutor da excomunhão diz que o ato se deu porque padre Beto não obedeceu aos superiores e insistiu em manter um comportamento em desacordo com as regras do sacerdócio. Embora o bispo de Bauru, d. frei Caetano Ferrari, tenha exigido que o padre retirasse da internet os vídeos em que critica a postura da Igreja em relação aos temas sexuais, a nota afirma que o sacerdote não foi excomungado por defender os interesses dos homossexuais porque "isso não é matéria para excomunhão na Igreja".

O comunicado diz que a pena aconteceu "(...) de modo automático, em virtude da sua contumácia (obstinação) num comportamento que viola, gravemente, as obrigações do sacerdócio que ele livremente abraçou". A nota completa: "A excomunhão foi declarada porque ele se negou, categoricamente, a cumprir o que prometera em sua ordenação sacerdotal: fidelidade ao Magistério da Igreja e obediência aos seus legítimos pastores", diz no texto o juiz-instrutor, cuja identificação não foi divulgada pela Igreja, alegando motivos de segurança. O juiz é designado pelo Vaticano e foi nomeado para o caso pelo bispo Caetano.

Padre Beto reagiu à nota com indignação: "Então, um padre pode ser pedófilo que ele não será excomungado só porque obedece aos seus superiores?", questionou. De acordo com o presbítero, a nota do instrutor é "uma artimanha para tirar o foco da questão, pois hoje, em pleno século 21, a sociedade não tolera mais isso, não tolera mais inquisições", diz. Padre Beto também negou a versão dada pelo juiz-instrutor de que a excomunhão não tem relação com as declarações em defesa dos gays. "Se fosse realmente isso, o bispo não teria exigido que eu retirasse os vídeos da internet com minhas reflexões sobre o assunto e pedisse perdão."

"Vejo essa carta como um pedido de socorro numa tentativa desesperada da Igreja de tirar foco sobre uma atitude intolerante que eles praticaram contra minha liberdade de reflexão e pensamento." "Se não queria saber das minhas reflexões, por que a Igreja gastou dinheiro com minha formação, enviou-me para estudar e fazer doutorado na Alemanha, na mesma universidade em que estudou o papa Bento XVI e frei Leonardo Boff?", afirma.

'Nem com fogueira'

Segundo o bispado de Bauru, após a punição religiosa, o eclesiástico enfrentará agora um processo para demissão do estado clerical, quando, então, não poderá mais ser chamado de padre e ficará impedido do exercício do ministério sacerdotal. Durante o processo, padre Beto ainda poderá ser chamado para dar esclarecimentos a um juiz-notário nomeado para reunir provas. Por outro lado, se o clérigo demonstrar arrependimento, a Igreja poderá retirar a excomunhão, mas não a demissão. No entanto, não é esta a intenção de padre Beto. "Não me arrependeria dos meus atos nem que ainda existisse fogueira", afirma.
http://www.estadao.com.br

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