Sem saída, classe média troca escola e encara o SUS

Raul Mariano
rmariano@hojeemdia.com.br
13/06/2016 às 07:19.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:52
 (Flávio Tavares/Hoje em Dia)

(Flávio Tavares/Hoje em Dia)

O aumento de despesas típicas da classe média em níveis superiores à inflação somado ao crescimento dos índices de desemprego estão levando milhares de pessoas a abandonarem os serviços privados de saúde e educação e migrarem de volta para os serviços públicos em Belo Horizonte. 

No acumulado de janeiro de 2012 a maio de 2016, as mensalidades escolares do ensino infantil subiram 91%. No mesmo período, a elevação da inflação foi de 41,7%, conforme dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead). A consequência, segundo especialistas, é o êxodo de famílias de volta aos serviços gratuitos. 

No caso dos planos de saúde, a alta foi de 36,28% no mesmo período. Um percentual menor que a inflação, mas que não impediu o abandono dos serviços privados de saúde. Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) revelam que, em Minas, o número de usuários de planos de saúde teve uma redução de 215.223 pessoas entre março de 2015 e março de 2016. 

A cineasta Carem Abreu precisou deixar o plano de saúde depois de 11 anos utilizando o serviço privado. “O modelo de negócios do setor audiovisual é todo baseado em leis de incentivo. Este ano recebi apenas em junho repasses que deveriam ter sido feitos em março. Isso me levou a abandonar o plano de saúde e acabei descobrindo que o atendimento público em Belo Horizonte tem sido melhor do que o particular”, relata.

O luthier Paulo Penteado também foi obrigado a rever os gastos com o plano de saúde que pagava para a família de quatro pessoas. 

“Eu pagava um plano que estava passando dos R$ 800 por mês e acabou ficando inviável. Estou em fase de troca e agora devo adotar um plano familiar que custa um pouco mais de R$ 600. Continua não sendo barato, mas se adequa a meu orçamento”, explica Penteado.

Educação

O mesmo movimento foi observado nas escolas particulares, que tiveram uma diminuição de 7% no número de alunos no último ano. O percentual equivale a cerca de 80 mil estudantes migrando para o ensino público, segundo o presidente do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG), Emiro Barbini.

“Tivemos um aumento recente de impostos, como o ISSQN, em cerca de 50%. Sem falar no aumento do preço da água, luz, transporte e produtos de limpeza. Tudo que a escola usa aumentou. Na educação infantil, há um agravante porque temos que funcionar com um número reduzido de alunos pois, quanto menor a idade, maior a atenção demandada”, justifica Barbini.

Para o presidente, a impossibilidade de manter o reajuste das mensalidades abaixo da inflação tem custado caro às escolas particulares no Estado. 
“Temos uma inadim-plência cada vez mais alta e uma migração para as escolas públicas que seriam impedidas se tivéssemos uma saúde financeira melhor”, destaca.

“O Brasil chegou a ter uma indústria incipiente de equipamentos hospitalares, que acabou sendo destruída pela abertura comercial. Então há uma tendência natural de elevação dos custos da saúde,já que a maioria dos equipamentos precisa ser importada” Cláudio Gontijo - Economista


Queda da demanda por serviços é recorrente durante crises

A debandada de usuários de planos de saúde rumo ao SUS, bem como a de estudantes deixando as escolas particulares e indo para escolas públicas já aconteceu em outras crises, segundo o professor de economia da UFMG Cláudio Gontijo.

Ele explica que no início da década de 1980, quando a economia brasileira viveu um período de recessão, o mesmo movimento foi observado. “A tendência agora é que o problema seja mais acentuado. Os Estados e municípios estão com a corda no pescoço devido à queda nas transferências de recursos da União, queda de arrecadação e a mordaça da lei de responsabilidade”, observa o professor.

Com a implantação do programa do governo interino de Michel Temer, avalia Gontijo, medidas em prol do ajuste fiscal, como a reforma previdenciária, podem tornar a situação da saúde pública ainda mais delicada. “Com a possível desindexação entre o piso dos aposentados e o salário mínimo , a demanda pelos serviços públicos de saúde pode crescer ainda mais”.
 

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