Lei de origem popular não tem eco no país

Aline Louise - Hoje em Dia
23/06/2014 às 08:16.
Atualizado em 18/11/2021 às 03:06
 (Arquivo Pessoal)

(Arquivo Pessoal)

A Constituição Federal garante à população o direito de participar de forma mais direta nas decisões políticas do país por meio de projetos de iniciativa popular, mas as dificuldades para a formalização das propostas, seja pelo numero de assinaturas que precisam ser coletadas ou pela validação do conteúdo, limitam o uso desse mecanismo nos três níveis de governo.

Na Câmara dos Deputados, por exemplo, não tramitou até hoje nenhum projeto de lei de origem genuinamente popular. Nem a conhecida Lei da Ficha Limpa, cujo projeto recebeu mais de um 1,3 milhão de assinaturas. O texto aprovado era, na verdade, de autoria do Executivo, da gestão do então presidente Itamar Franco. A proposta foi recuperada por abordar o mesmo tema. A maciça adesão popular foi fundamental para pressionar os parlamentares a aprovarem a lei, mas a própria Câmara dos Deputados admitiu que foi inviável verificar uma a uma as assinaturas, conforme exige a Lei de Soberania Popular (9.709/98).

Em Minas Gerais, de acordo com levantamento da Assembleia Legislativa, desde 1959, seis projetos de iniciativa popular tramitaram na Casa. Apenas o Projeto de Lei 1.644, de 1993, que dispõe sobre a criação do Fundo Estadual de Habitação, foi convertido em norma jurídica, já revogada.

ASSINATURAS

Em Belo Horizonte, também não há registro de nenhuma lei que tenha sido originária de projeto de iniciativa popular. Na capital, são necessárias 100 mil assinaturas, o equivalente a 5% do eleitorado municipal, para a apresentação de um projeto de iniciativa popular à Câmara Municipal, conforme determina a Constituição Federal.

Em Minas Gerais, a exigência é menor, pelo menos 10 mil subscrições, conforme a Constituição estadual. No caso de projeto de lei de iniciativa popular apresentada à Câmara dos Deputados, o texto deve ser subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído por pelo menos cinco estados.

Segundo o advogado Henrique Carvalhais, presidente da Comissão de Advocacia Pública Municipal da OAB-MG, estes requisitos difíceis de serem superados podem indicar uma necessidade de revisão da legislação quanto à efetiva participação da iniciativa popular. Contudo, diz que são precisos critérios rigorosos, sob pena de se ferir a legitimidade do Poder Legislativo e ainda inviabilizar seus trabalhos.

“Nossa democracia é essencialmente representativa, a ampliação é desejável, mas facilitar demais poderia inviabilizar a vida do Legislativo. Haveria uma enxurrada de projetos populares. E as exigências também garantem que o projeto tenha penetração e maior discussão social”, diz.

- Certificação digital é vista como alternativa em BH

Tramita na Câmara Municipal de Belo Horizonte um projeto de resolução, de autoria do vereador Marcelo Álvaro Antônio (PRP), que prevê que projetos de iniciativa popular e requerimento de convocação de plebiscito sejam subscritos por meio eletrônico, com uso de certificação digital. Segundo ele, o objetivo é facilitar a participação popular, “aproximando mais as pessoas do processo legislativo”.

O vereador argumenta que em grandes centros urbanos, como Belo Horizonte, é difícil coletar assinaturas de forma presencial, e que o uso da internet superaria essa limitação. Ele lembra que a certificação digital “tem sido empregada satisfatoriamente para facilitar a tramitação de atos do processo judicial”. Contudo, o advogado Henrique Carvalhais, presidente da Comissão de Advocacia Pública Municipal da OAB-MG, destaca que a certificação digital é ainda uma tecnologia de acesso muito restrito e que dessa forma a lei corre o risco de não atingir seu objetivo.

O professor de direito da PUC Rodolfo Viana considera a iniciativa válida, como forma de fortalecer a democracia participativa, mas chama a atenção para o rigor na verificação das assinaturas online. “É preciso aprimorar a questão tecnológica, para se evitar fraudes”, diz.

Segundo o vereador Marcelo Álvaro, a viabilidade tecnológica do seu projeto de resolução ainda está sendo estudada pela equipe técnica da Câmara Municipal.

“O pessoal do TI da Câmara está estudando como seria aceita essa assinatura digital. O que importa é a aprovação do projeto, a regulamentação pode ser vista depois. O importante é garantir a possibilidade da assinatura virtual”, defende.

O projeto de resolução foi aprovado em primeiro turno, em fevereiro deste ano. Se for aprovado em segundo turno, passa a valer automaticamente, porque o projeto de resolução não precisa ser sancionado pelo prefeito.
 

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