"O Mercado de Notícias" por Jorge Furtado

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
29/04/2014 às 07:34.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:20
 (Daniela Nader)

(Daniela Nader)

RECIFE – Jorge Furtado teme que a cultura do “grátis” prejudique um dos pilares do jornalismo: a investigação. A transformação provocada pela internet na imprensa é um dos temas abordados pelo diretor gaúcho no documentário “O Mercado de Notícias”, apresentado no domingo (27), no Cine PE.

“É uma revolução, não se sabe o que irá acontecer. O mesmo autor de ‘A Cauda Longa’, Chris Anderson, escreveu o livro ‘Free’, em que afirma que o que não for grátis, irá acabar. Mas não se faz jornalismo investigativo sem que alguém seja pago para ir lá e buscar a informação. A informação custa dinheiro”, assinala Furtado.

O filme entrevista 13 jornalistas de renome sobre o papel e o futuro da atividade, entre eles Jânio de Freitas, Luís Nassif e Mino Carta. Uma das preocupações é com a concorrência de blogs, um tipo de jornalismo individual, feito sem que outras pessoas possam analisar a qualidade de texto e promover revisões, de acordo com os depoimentos.

“Os blogs não substituem os jornais. E acho inadmissível que os grandes veículos publiquem (na parte dedicada a comentários das reportagens) ofensas e absurdos sem ninguém ler. Tenho um blog e não inclui a parte de comentário porque é preciso que alguém leia. Quero ler um texto em que a palavra ‘você’ esteja escrita de forma ortograficamente correta”, critica.

Formado em jornalismo, Furtado conta que, apesar de não ter exercido a profissão, ela é uma das suas obsessões (“Gosto de notícia, não vivo sem ler um jornal”) agora retratada num filme que tem como ponto de partida uma peça de 1625, “O Mercado de Notícias”, do inglês Ben Jonson.

“O texto é de uma extrema atualidade, com todas as questões do jornalismo atual, mostrando a relação com a fonte, o financiamento da notícia e os seus interesses”, registra Furtado, ressaltando que Jonson era um cronista de seu tempo. “Era como um jornalista, lidando com assuntos daquele momento. E, não à toa, foi preso várias vezes”, destaca Furtado.

Além das entrevistas, o cineasta recorre a cenas da peça e ainda surge no filme como um Michael Moore, postando-se à frente das câmeras.

"Temos que duvidar sempre", diz diretor

Furtado também não abre mão do humor. “Juntei essas três linhas narrativas num filme que pretende discutir o jornalismo, que vive uma revolução equivalente à de sua invenção, no século 17”, argumenta.

O elemento cômico serve de “alívio narrativo” e também é reflexo de uma preferência de Furtado. “Sou meio comediante. Gosto de uma piada com pitadas tristes. Esse é o meu tipo predileto de filme, que foi feito por Ettore Scola, Federico Fellini, Mario Monicelli e Charles Chaplin, o maior artista que o cinema já produziu”, explica.

Nas cenas em que faz as vezes de Moore, ele cita quatro casos de erros graves cometidos em jornais. Três deles contra o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2002 a 2010). “Juro que gostaria de incluir alguma barriga contra o de Fernando Henrique (Cardoso), mas não achei. Apesar de entrevistar jornalistas de várias tendências, não nego que o filme ficou com um certo viés esquerdista”.

Ideologias à parte (a produtora do diretor realizou os programas do PT no Rio Grande do Sul), o diretor espera despertar o sentimento de dúvida. “Temos que duvidar sempre e não acreditar simplesmente na manchete. Espero que, após esse turbilhão provocado pela internet, a qualidade de informação prevaleça e sobrevivam apenas os veículos sérios”, anseia.

(*) Viajou a convite da organização do Cine PE

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