Comissão perinatal diz que mortes maternas em BH poderiam ser evitadas

Iêva Tatiana - Hoje em Dia
05/11/2015 às 06:50.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:20
 (Samuel Costa)

(Samuel Costa)

Do início de janeiro ao final de abril deste ano não houve em Belo Horizonte morte materna (após o parto) de mulheres residentes na cidade. Nos cinco meses seguintes, no entanto, foram registrados oito óbitos. As principais causas, segundo a Comissão Perinatal da Secretaria Municipal de Saúde, foram o uso excessivo de medicamentos (como a ocitocina, hormônio sintético usado para indução do parto) e as cesáreas desnecessárias.

Na maior parte dos casos, o quadro clínico das pacientes apontava para uma “morte evitável”. “É aquela que poderia ter sido evitada por ação do serviço de saúde, que deveria prevenir e não adicionar riscos à assistência”, destaca a coordenadora da Comissão Perinatal, Sônia Lansky. É o que nós chamamos de hipermedicalização, um dos principais problemas que enfrentamos em BH e no Brasil para reduzir a morte evitável”, acrescenta a médica.

Na avaliação de Sônia, é preciso incentivar o parto normal, principalmente na rede privada, e aprimorar a atuação dos profissionais da saúde. “Além de identificar riscos oportunamente e tratar as possíveis complicações com a implementação de protocolos”, ressalta.

Opinião divergente

O obstetra e diretor da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais (Sogimig), Carlos Henrique Mascarenhas, discorda da coordenadora da comissão. “O erro que vejo na divulgação (de dados) feita pela prefeitura é a associação das mortes a causas que não são as mais importantes. O tipo de parto e os medicamentos são um resumo indesejável, porque não é só isso”, afirma.

Conforme o médico, o óbito de uma mãe após o nascimento do filho é uma situação trágica, mas pouco tem a ver com a cesárea, já que o procedimento vem tornando-se mais frequente, enquanto a mortalidade materna está reduzindo no país. “É um movimento inverso, mais um exemplo de que o tipo do parto não é decisivo para o óbito.
 
Ela é um instrumento, mas não a causa do problema. Temos que avaliar o que foi acompanhado durante o pré-natal. A cesárea é um meio utilizado para salvar a mãe, a criança ou as duas, quando não podemos esperar o tempo do parto normal”, enfatiza o obstetra.
 
‘A maioria dos óbitos é de mulheres saudáveis’, diz médica
 
Em um aspecto, Sônia Lansky, da Comissão Perinatal, e Carlos Henrique Mascarenhas, da Sogimig, têm a mesma opinião: o atendimento de gestantes em maternidades públicas e privadas tem pouca ou nenhuma relação com o registro de mortes na capital. Dos oito óbitos em BH, neste ano, quatro foram em unidades de saúde suplementar e quatro em hospitais particulares.

Também há consenso entre os especialistas no que diz respeito a alterações identificadas no pré-natal. “Infelizmente, a maioria (das mortes) é de mulheres saudáveis, com gravidez normal”, diz Sônia. “A gravidez provoca profundas mudanças no organismo materno. Para umas (mulheres), ela é normal, mas para outras, nem tanto”, completa Mascarenhas.

O advogado Rodrigo Carvalhar, de 46 anos, viu de perto essa situação. Há cerca de três anos, a mulher dele, Cristiana, de 39, teve complicações no parto e morreu horas depois de dar à luz Bruna, primeira filha do casal. A mulher, que sempre teve pressão arterial baixa, apresentou um quadro de pré-eclâmpsia (hipertensão) no sétimo mês de gestação e passou os 30 dias seguintes dando entradas no hospital.

“Ela ficou bastante inchada e a gravidez foi interrompida aos oito meses. Quando a Bruna nasceu, minha esposa estava consciente, mas teve uma hemorragia na sala de cirurgia. O sangramento foi controlado com medicamentos, mas, mais tarde, o médico viu que precisaria fazer outra cirurgia para retirar o útero dela”, lembra Carvalhar. No segundo procedimento, o quadro de Cristiana se complicou. Ela entrou em coma induzido e acabou morrendo no hospital. Ao se ver “sozinho” com a filha recém-nascida, o advogado tomou uma decisão: separar o luto pela morte da esposa da alegria de tornar-se pai.

Busquei a Bruna no hospital com um objetivo: ela não era a causa nem a responsável pela minha tristeza. Então, não poderia sentir em mim o que eu estava sentindo, não poderia carregar esse peso. Hoje, ela é um criança feliz”, orgulha-se.

Capacitação

De acordo com a coordenadora da Comissão Perinatal, exemplos como o de Cristiana reforçam a necessidade de os médicos estarem preparados para lidar com complicações inesperadas.

“Eles precisam aprimorar a atuação não apenas no alto risco, porque nos casos de mortes maternas ainda predomina o baixo risco, o que infelizmente aponta para um maior potencial de prevenção”, diz.

Segundo o diretor da Sogimig, 90% das mães morrem por causa de infecção, sangramentos ou hipertensão. “Temos que melhorar o tratamento das hemorragias e aprimorar a prevenção”, afirma.

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