'Sniper Americano' é um filme de guerra indicado ao Oscar com dois pesos e duas medidas

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
19/02/2015 às 07:55.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:04
 (Warner/Divulgaçao)

(Warner/Divulgaçao)

Quando tem uma arma ao lado, o diretor  parece se tornar outra pessoa, retomando um velho personagem da extensa carreira como ator: Harry “Dirty” Callahan, policial que não pensa duas vezes antes de exagerar na violência no trato com criminosos.

O realizador sensível de “Menina de Ouro” (2004) e “A Troca” (2008) se transforma no americano típico do Meio-Oeste, que tem perfil conservador, racista e nacionalista. “Sniper Americano”, último filme dos oito indicados ao Oscar a estrear em telas brasileiras, segue essa linha.

Embora o filme se inicie e feche com uma pequena crítica à má formação desses americanos, para quem ter um revólver em casa e brincar com ele diante dos filhos é algo banal, o discurso patriótico é maior e mais bem desenvolvido do que um valor universal: o amor à família.

Ao invés de ser a voz da razão, às vezes literalmente, já que ela conversa constantemente com o marido atirador em meio à guerra, a esposa de Chris Kyle ganha uma “condenação” na narrativa, tirando-o daquilo que o soldado realmente ama fazer: estar no deserto iraquiano.

Inspirado na autobiografia de Kyle, que integrou a elite do exército americano durante a caça a Bin Laden, após o ataque terrorista ao World Trade Center, em 2001, “Sniper Americano” trabalha em torno de dois conflitos: o familiar e a luta contra perigosos muçulmanos travestidos de crianças e mulheres.

O perigo no deserto é mais real e importante, parece dizer Eastwood. Da maneira como o filme mostra, a cobrança da esposa para que Chris seja “mais humano” parece exagerada, pois o atirador já está sendo testemunha da complexidade humana, dentro da ótica dos americanos.

No lugar de pôr em questão o motivo de estar participando daquele massacre, ele não só entende que sempre foi a missão dele, fazendo jus ao título “Lenda” que recebeu dos colegas, pela precisão no tiro, como questiona os métodos adotados pelos inimigos da Al Qaeda.

O problema não está nessa visão distorcida da realidade da guerra, mas o fato de o filme assumir esse viés também, exibindo crianças e mulheres que aceitam missões suicidas e formas de tortura (uma broca é uma delas) praticadas pelos terroristas no próprio povo.

Do lado americano, apenas lealdade, coragem e empenho, transformando um grupo de SEALs numa grande família. “Sniper Americano” deixa de imprimir a guerra interior desses soldados, mostrando os problemas como efeitos colaterais, de certa forma naturais.

O fim deixa ainda mais claro esse tom heróico, que poderia ser irônico ou o triste retrato da chamada América Profunda. Caminho tortuoso que Eastwood trilhou, por exemplo, em “Gran Torino”, ao apresentar um racista veterano da Guerra da Coreia como “salvador”.

Mesmo que o personagem – interpretado por Eastwood –retroceda em alguns dos pensamentos, como acreditar que a economia e a cultura americanas foram devastadas pelos imigrantes asiáticos, o cineasta de 80 anos cria uma imagem estereotipada dos personagens sul-coreanos.

Há uma boa sequência, quando os soldados se perdem numa tempestade de areia, que poderia ser simbólica dessa guerra se a intenção do filme fosse outra. Até mesmo as cenas de batalha não superam o que vimos em obras como “Falcão Negro em Perigo” (2001) ou “Zona Verde” (2010).

Assista o trailer:

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