Ensinar alunos a ter visão de negócio ainda está restrito a cursos de administração

Igor Patrick
Ipsilva@hojeemdia.com.br
08/06/2016 às 21:46.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:48
 (Lucas Prates)

(Lucas Prates)

O administrador Felipe Siqueira trabalhava como executivo em um clube de negócios e tinha dificuldades em encontrar alfaiates para confeccionar peças sociais sob medida. Foi quando percebeu nessa área uma boa oportunidade de negócio e levou a ideia para o Núcleo Acadêmico de Vocação Empreendedora, iniciativa que funciona há cinco anos no Instituto Brasileiro de Mercados e Capitais (Ibmec), onde Felipe estudava. Assim nasceu a Social Tailor, que confecciona camisas sob medida para cada cliente.

“Foi um empurrão essencial para aplicar os conceitos da academia, como precificação e público-alvo, e determinar o sucesso financeiro da ideia”, conta o CEO que, em um ano de funcionamento, já acumula 1.500 clientes fixos de peças que vão de R$ 250 a R$ 360.

Na contramão da crise, a empresa, que já atua em BH e no Rio, deve chegar a Brasília e São Paulo ainda neste ano. O negócio já se paga há seis meses e conta com 21 funcionários. A contratação, porém, não para: em média, de três a quatro pessoas são admitidas mensalmente. “Trabalhamos com clientes com renda e padrão de consumo que não são afetados por crise. Isso torna o negócio mais sólido”, diz Felipe.

O sucesso do administrador é resultado do estímulo dado pelo Ibmec ao desenvolvimento da atitude empreendedora nos alunos. Segundo o professor João Bonomo, coordenador do Núcleo, faltam ações nas universidades brasileiras para pensar o empreendedorismo além da introdução.

“De cem, talvez uma ou duas tenham ações voltadas para desenvolver essas habilidades nos alunos. Faltam diretrizes acadêmicas que fomentem a criação de programas de aceleração de startups, hackathons (maratonas de programação) e ciclo de palestras sobre o tema”, diz.

A opinião de Bonomo é sustentada em números. Pesquisa do Sebrae realizada em 2014 com 6.215 universitários identificou que os amigos são mais incentivadores na hora de empreender que a própria universidade. Mais de 36% dos entrevistados disseram que o apoio dos amigos foi fundamental, enquanto que 24,4% atribuem a atitude empreendedora aos próprios professores.

Reforma curricular

Buscando solucionar essa lacuna do ensino, a UNA trabalha empreendedorismo durante todo o currículo. Segundo a vice-reitora da instituição, Carolina Marra, uma reforma nas disciplinas de todas as graduações ajudou nessa tarefa.

“Agora, nossos alunos já entram no curso fazendo uma matéria que chamamos de Laboratório de Interdisciplinaridades (LAI). Daí serão desdobrados projetos interdisciplinares (PI) que orientamos com um viés mais prático”, conta Marra.

A instituição, agora, vai profissionalizar ainda mais o apoio. Os melhores PIs serão apresentados para uma banca formada por empresários e fundos de investimento dispostos a colocar dinheiro nas ideias. A própria Anima Educação – empresa controladora da UNA – vai investir em pelo menos dez projetos. “Queremos estimular o aluno a criar e esse é um incentivo para fazer negócios saírem do papel”, diz a vice-reitora.

Já na Universidade do Vale do Rio Verde (UninCor), o empreendedorismo é trabalhado dentro dos mais de 180 projetos de pesquisa e extensão desenvolvidos pelos alunos. A ideia é aliar mercado de trabalho e teoria.

“Nos projetos, os eixos transversais passam por assuntos de empreendedorismo, liderança, criatividade, inovação responsabilidade social e sustentabilidade”, conta a reitora Gleicione Bagne. Segundo ela, a ideia é despertar o senso crítico. “Deixar o aluno inquieto e incomodado é o primeiro passo para realizarem novas descobertas e procurarem respostas”.
 Editoria de Arte / N/A

Conhecimento que se adquire antes de chegar à faculdade

Antes restrito à universidade, o ensino das habilidades empreendedoras começa a chegar a alunos da escola regular. No Colégio Loyola, um laboratório de inovação e empreendedorismo, o iLO, funciona desde o início de 2015 com a missão de encontrar novas soluções para problemas do dia a dia.

A ideia surgiu durante uma visita dos estudantes ao Laboratório de Inovação da Universidade de Harvard. O diretor-geral da instituição mineira, padre Germano Cord Neto, gostou da experiência norte-americana e resolveu transpor para os ensinos fundamental e médio.

“Trabalhamos com alunos a partir dos 11 anos. Os grupos apresentam projetos que são avaliados levando em conta criatividade, originalidade e compromisso ético. Em 2015 tivemos 48 inscrições e dez selecionados. Em 2016, foram 62 inscritos e nove selecionados”, conta o coordenador do iLO, Carlos Alberto de Freitas Júnior.

Os estudantes escolhidos são acompanhados, durante um ano, por profissionais reconhecidos no campo de conhecimento da ideia. A Fundação Dom Cabral – reconhecida pelo jornal britânico “Financial Times” como a melhor escola de negócios da América Latina – apadrinhou a ideia e disponibiliza profissionais que orientam e aplicam os conceitos técnicos de executabilidade nas ideias desenvolvidas no laboratório.

Boa ideia

O esforço no ano passado deu resultado. Bruno Foresti, aluno de 14 anos, desenvolveu um aplicativo com um sistema de logística que chamou a atenção de empresários. A família do estudante está em fase de negociação para viabilizar a ferramenta.

Carlos Alberto, porém, diz que, mais que criar grandes produtos, o maior ganho do iLO é desenvolver a atitude empreendedora nos alunos. “Nem todos vão criar um produto propriamente dito, mas percebemos que desenvolvem uma atitude mais madura com o colégio e com a comunidade, avaliando erros como oportunidades”.

Participante do iLO neste ano, Roberta Pena, de 16 anos, concorda. Ao contrário da maioria dos grupos em 2016, ela não pensa em criar nenhuma tecnologia nova. Seu projeto está desenvolvendo ações de sustentabilidade no colégio que culminarão em uma “Semana Verde”. Ela, que pensa em seguir na área de Ciências Humanas, diz que o iLO a despertou para a necessidade de empreender. “Mesmo não seguindo imediatamente na área de negócios, pretendo fazer uma especialização ou um mestrado em empreendedorismo porque percebi que, seja médico, seja empresário, todo mundo precisa ter essa atitude empreendedora”, afirma a estudante.

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