Governo deve diminuir participação em infraestrutura, recomenda o Ipea

Bruno Moreno - Hoje em Dia
23/12/2014 às 07:52.
Atualizado em 18/11/2021 às 05:28
 (Frederico Haikal)

(Frederico Haikal)

Com a projeção de um cenário pouco favorável para a economia brasileira nos próximos anos, técnicos do Instituto de Políticas Econômicas Aplicadas (Ipea) recomendam uma menor intervenção do governo e maior participação da iniciativa privada nos investimentos, assim como um aumento da presença do capital estrangeiro. A medida teria como objetivo suprir áreas em que o Estado brasileiro não consegue atuar. Além disso, os recursos do Tesouro Federal já compõe a maior parte da carteira do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), sendo que em 2006 era menos de 10% (veja infográfico).

A recomendação consta do livro “Brasil em desenvolvimento 2014: estado, planejamento e políticas públicas”, editado por Leonardo Monteiro Monasterio, Marcelo Côrtes Neri e Sergei Suarez Dillon Soares, publicado pelo instituto neste mês. O Ipea é uma fundação pública federal, vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.

Esse é um dos temas mais polêmicos no debate entre tucanos e petistas. Enquanto os partidários de Aécio Neves (PSDB) defendem um Estado mais enxuto, os correligionários da presidente Dilma Rousseff (PT) acreditam que o Estado deve ter participação forte na condução da economia.

A receita petista de crescimento econômico com inclusão social, segundo os pesquisadores do Ipea, cumpriu sua função, como o Hoje em Dia mostrou em reportagem publicada nesta segunda-feira (22). Mas, agora, com a escassez de recursos, é preciso atrair ainda mais o parceiro privado para áreas que eles ainda não têm grande participação na economia brasileira, como a infraestrutura, principalmente.

“É necessário, pois, um maior esforço do governo brasileiro no sentido de ampliar a transparência das finanças públicas do país e reduzir o intervencionismo excessivo na economia – sobretudo no que tange ao controle dos preços administrados e às mudanças de regras para concessões”, recomenda o livro.

Taxa baixa

Atualmente, a taxa de investimento no Brasil é de cerca de 18% do Produto Interno Bruto (PIB), mas o mínimo ideal seria 21%, segundo o instituto. Como o poder público, em todas as esferas, está amargando quedas de arrecadação, a saída, segundo o estudo, é recorrer à iniciativa privada, com foco no dinheiro vindo de fora do país.

"Se suprido por capitais estrangeiros, este montante exigiria a duplicação do volume de investimento estrangeiro direto (IED) recebido pelo país, que foi de US$ 64 bilhões em 2013. (…) Caso seja financiado internamente, mantidos os atuais indicadores fiscais, o programa de investimentos do governo federal implicaria um aumento do déficit em transações correntes superior a 6% do PIB, o que configura um patamar insustentável no médio prazo dado seu impacto explosivo sobre o endividamento público. Assim, na ausência de um profundo ajustamento das contas públicas para a expansão da poupança doméstica, o país deverá recorrer ao capital estrangeiro como uma fonte”, aponta.

No documento, os pesquisadores ressaltaram, ainda, que é “necessário também o aumento da demanda por investimentos por parte do setor privado. Para tanto, o investimento público também desempenha um papel decisivo, seja como provedor das condições básicas de infraestrutura para a viabilização dos projetos de expansão das firmas, seja como catalisador dos investimentos privados, proporcionando o efeito multiplicador”.

Capital privado aguarda marcos regulatórios para aumentar participação nas PPPs

Mesmo reconhecendo que o incentivo a uma maior participação do setor privado em projetos de infraestrutura econômica e social é uma das principais estratégias do governo para tirar os projetos da gaveta, um dos principais instrumentos, as Parcerias Público-Pricadas (PPP), ainda patinam no país, dependentes de crédito público.

“As PPPs em desenvolvimento no país ainda são em sua quase totalidade dependentes dos canais de crédito público, sobretudo por meio do BNDES. Para que os projetos de parceria com o setor privado possam ter acesso a outras linhas de financiamento, se faz necessário que o marco regulatório que rege estas concessões também favoreça sua integração com o mercado doméstico de capitais”, avalia o Ipea.

Incentivos

Quem concorda é o bacharel em Direito, Bruno Ramos Pereira. Coordenador do portal PPP Brasil, ele avalia que é preciso que haja incentivos também aos bancos privados para que entrem no segmento, mas é preciso garantir maior segurança do retorno do capital.

Ele avalia que, atualmente, não é preciso mudar a legislação para aperfeiçoar as PPPs no país. “Se o contrato for desenhado com cuidado, poderia reduzir a percepção de risco dos bancos”, avalia.

Apesar de não ter visto avanços institucionais na área de PPP nos governos petistas, Bruno se mostra esperançoso em relação à boa vontade do novo governo Dilma com o setor, principalmente pelos indicativos que a nova equipe econômica já deram ao mercado, demonstrando simpatia com a participação da iniciativa privada.

Grandes obras ainda dependem de dinheiro público

Apesar de indicar que a participação da iniciativa privada em setores estratégicos do país é crucial para a retomada do crescimento, o Ipea avalia que não será uma transição rápida. Ainda há uma dependência muito grande em relação aos recursos provenientes de bancos públicos, principalmente Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Caixa e Banco do Brasil.

“As limitações do setor público para o financiamento de longo prazo não poderão ser superadas apenas por uma expansão dos canais privados de crédito”, afirma o estudo.

Vale lembrar que, no início dos anos 1990, as privatizações foram financiadas pelo BNDES. Mais recentemente, para as obras da Copa do Mundo 2014, muitos estádios foram reformados ou construídos por meio de Parcerias Público-Privadas, financiadas pelo banco.

Assim, o governo federal tem prejuízos por conta de repasses subsidiados à iniciativa privada e se vê obrigado a assumir todos os riscos para estimular a participação dela, explicam os pesquisadores do livro.

“Portanto, ainda que se verifique no país o crescente esgotamento do atual modelo de financiamento de longo prazo baseado no crédito subsidiado do BNDES e em aportes do Tesouro nacional custeados pela emissão de dívida pública, não há perspectiva para os próximos anos de uma mudança substancial na dependência em relação ao setor público”, afirma o estudo.

Brasil concorre com demais emergentes por financiamento

Uma das principais pautas dos recentes encontros do grupo das 20 maiores economias do mundo (G-20) é a busca por fontes de financiamento para projetos de infraestrutura nos países emergentes nas próximas décadas, informa o estudo do Ipea.

Atrair o capital internacional é um dos maiores desafios. O mundo inteiro precisa de dinheiro para financiar investimentos e, por isso, atraí-lo para o Brasil requer ações coordenadas.

O Banco Mundial estima que, para manutenção e expansão de seu capital fixo, anualmente seriam necessários gastos de cerca de US$ 406,7 bilhões na Ásia Oriental e no Pacífico, US$ 284,4 bilhões na África Subsaariana, US$ 81,2 bilhões na América Latina e no Caribe e US$ 78,5 bilhões no Oriente Médio e norte da África.

Outras estimativas apontam um requerimento da ordem de US$ 40 trilhões para atender às necessidades mundiais de infraestrutura nos próximos vinte anos, aponta o texto do Ipea.

De acordo com o instituto, a previsão é a de que o governo invista, nos próximos quatro anos, quase R$ 800 bilhões no setor de infraestrutura, sendo cerca de R$ 300 bilhões em transportes e energia e R$ 500 bilhões em telecomunicações e saneamento básico, afirma o estudo do instituto.

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