A morte de Thomas Skidmore

14/06/2016 às 07:39.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:53

Desligado do noticiário no domingo, somente ontem tomei conhecimento da morte de Thomas Skidmore, o historiador norte-americano, brasilianista, autor do clássico ‘Brasil: De Getúlio a Castelo’, escrito no calor do golpe de 64 e lançado em 1967. Li o livro ainda na faculdade, na década de 80. Apesar de ter ficado fascinado com a clareza do texto, a profundidade da pesquisa e a isenção da análise, fingíamos, no meu círculo, que o autor não nos agradava. Skidmore não era vinculado à historiografia marxista e tinha entre suas fontes participantes da ditadura. Uma tremenda bobagem juvenil, a nossa.

No final da década de 80, Skidmore complementou a pesquisa com o volume dois, Brasil: De Castelo a Tancredo. Se no primeiro tratou das raízes do golpe, apontando os erros estratégicos da esquerda e do próprio Jango no poder (que era o que nos irritava), o segundo volume trouxe a história da ditadura e da reconstrução democrática.

Este último está na minha lista de prioridades de leitura há anos, de modo que só posso comentar o primeiro livro. Imperdível por que está entre os melhores sobre a ditadura (rivaliza com a série de Elio Gaspari, que acaba de lançar o quinto e último volume sobre o tema), e também por que lança luz sobre o momento atual. Não que o golpe contra Dilma seja uma reprise do sofrido por Jango, mas os dois encontram paralelos e foram construídos a partir da mesma matéria: a fragilidade das nossas instituições democráticas e a incapacidade da classe média em aceitar políticas distributivas.

Seu livro começa com uma análise da Revolução de 30 e do período autoritário do Estado Novo, passa pela Segunda Guerra Mundial até chegar aos anos conturbados do governo de João Goulart e o golpe de 64. É impressionante a capacidade de Skidmore de costurar os grandes acontecimentos e fatos esparsos, de menor relevância, para nos mostrar por completo a dinâmica social, política e econômica que desembocou na ditadura militar.

Skidmore nos mostrou que a raiz do golpe se estendia à volta de Vargas ao poder, em 1950, com o apoio das classes trabalhadoras. Sua sombra, encarnada no populismo e no radicalismo à esquerda do governo Jango, gerou a reação conservadora e a desestabilização social e econômica do pré-golpe.

A derrubada de Dilma ainda merecerá análise detida e aprofundada que, esperamos, seja feita por alguém tão gabaritado quanto Thomas Skidmore. Mas, já de saída, podemos contar com a lição deixada pelo brasilianista: no Brasil, não se mexe na estrutura de privilégios impunemente.

Câmbio assassino
No discurso de posse no Banco Central, o novo presidente, Ilan Goldfajn, afirmou que irá resgatar ”o velho e bom tripé macroeconômico” e defendeu firmemente o regime de câmbio flutuante e a “parcimônia” no uso das ferramentas de controle do valor da moeda. Então, apertem os cintos por que o pior ainda está por vir. 

É de se perguntar: quem, em sã consciência, é capaz de defender o câmbio flutuante num país em que as exportações são a única alternativa para salvar a economia da recessão e que, de muito longe, pratica as maiores taxas de juros do mundo?

Os preços das commodities desabaram nos últimos dois anos e não se recuperarão no curto ou no médio prazo. O que resta, então, senão a desvalorização do real para garantir competitividade ao produto brasileiro e rentabilidade para o exportador? Eu não sei e duvido que Ilan Goldfajn saiba. Mas, câmbio flutuante faz parte da sua religião e é intocável, mesmo que a economia desça pelo ralo.

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