Dra. LiubianaDra. Liubiana é PhD em Neuropediatria, com doutorado-S na Harvard Medical School. Professora de Medicina da UFMG, neurocientista e palestrante

Cuidado com a exposição a imagens de guerra: crianças e adolescentes podem sofrer estresse tóxico

Publicado em 19/10/2023 às 06:00.

É inegável que as cenas de massacres e guerras que atualmente inundam as redes sociais e os meios de comunicação são lamentáveis e de conteúdo extremamente pesado. Essas imagens chocantes nos perturbam, não apenas pela violência que retratam, mas também porque somos seres que desejam sempre o bem a todos.

Se isso choca os adultos, que podem experimentar sentimentos de tristeza e repulsa, imagina o que pode gerar em uma criança ou em um adolescente que ainda está em fase de formação cerebral?

A infância e a adolescência são fases cruciais no desenvolvimento cerebral, marcadas pela plasticidade e pela formação de conexões neurais essenciais. Nesse contexto, a exposição a imagens de guerra é uma preocupação crescente, uma vez que a violência visual pode ter efeitos significativos no desenvolvimento dessas faixas etárias.

O cérebro infantil e adolescente é altamente maleável, adaptando-se constantemente às experiências vividas. Durante essas fases, estão construindo circuitos neurais complexos que afetarão sua cognição, emoções e comportamento ao longo da vida. Portanto, experiências traumáticas podem ter impactos profundos.

Nesse contexto, as imagens de guerra podem ser caracterizadas com experiências adversas. Essas são frequentemente acompanhadas de violência, sofrimento e perda, o que pode induzir níveis significativos de estresse nas crianças e adolescentes que as testemunham. Esse estresse, quando muito elevado ou crônico, é chamado também de Estresse Tóxico e tem sido associado a alterações no cérebro, secundárias ao aumento da produção de hormônios do estresse, como o cortisol e a adrenalina. Isso pode afetar a estrutura e a função cerebral, como, por exemplo, na região do hipocampo, que desempenha um papel importante na memória e no processamento emocional, com consequências de dificuldades em manejar as emoções.

Devido à imaturidade neurológica, essa exposição também pode gerar preocupações diversas, como o risco da mesma situação acontecer aqui na cidade em que eles residem, de atingir seus entes queridos ou o sentimento de estar exposto a sofrer esse tipo de agressão a qualquer momento. Como o cérebro ainda não tem capacidade de elaborar e discernir de forma completa, essas exposições podem tornar as crianças mais propensas a problemas de saúde mental, como ansiedade, depressão, medo e pânico. Essas condições têm efeitos negativos na regulação emocional, o que pode impactar o desenvolvimento saudável do cérebro e a capacidade de estabelecer relacionamentos interpessoais positivos.

Diante desses desafios, é fundamental que os pais estejam atentos ao acesso à internet de seus filhos, evitando que eles tenham acessos a conteúdos de risco. É importante ressaltar que as crianças não devem ter acesso às redes sociais, pois essas não têm filtros de idade e de classificação indicativa e apresentam diversos conteúdos de forma livre e aleatória. Mesmo sem intenção de busca, as crianças podem ser expostas a imagens perturbadoras e, uma vez exposta, o cérebro já grava a informação. Assim, selecionar conteúdos construtivos para que o cérebro registre e crie redes neurais positivas é o caminho.

Além disso, é vital que os pais assumam o papel de educadores, ensinando seus filhos sobre a importância da paz, da igualdade, do amor e do desejo de um mundo feliz para todos. Promover valores positivos desde tenra idade é essencial para construir uma sociedade mais compassiva e acolhedora, onde todos possam crescer com respeito pelo próximo e a capacidade de lidar com as adversidades do mundo de forma construtiva.

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