O estrago da pegada: medida ecológica de uso da água mostra rastro dos hábitos de consumo

Patrícia Santos Dumont
pdumont@hojeemdia.com.br
05/03/2017 às 09:38.
Atualizado em 15/11/2021 às 13:37

Coletar a água da chuva para regar o jardim da sala e aproveitar a “sobra” do banho para lavar roupas são atitudes sabidamente amigas do meio ambiente. Pouco se fala, porém, o quanto nossos hábitos de consumo(inclusive alimentares) contribuem para extinguir os recursos hídricos do planeta. Você sabia, por exemplo, que se eliminasse o refrigerante da dieta economizaria muito mais água do que se desligasse o chuveiro para sempre? Se a resposta é não, vale a pena começar a prestar atenção no que os especialistas chamam de “pegada hídrica”.

Trata-se da “medida” usada para contabilizar a água oculta em cada coisa disponível no mundo e, portanto, escondida nos hábitos adotados ao longo da vida. Desenvolvida na Holanda, nos permite ficar vigilantes quanto às escolhas que fazemos diariamente, tendo como base os impactos delas no meio ambiente. 

Os cálculos da water footprint (nome em inglês) envolvem a soma de três etapas: cultivo (água verde, que vem da chuva), modelagem de matérias-primas e ingredientes (água azul, retirada de rios e mananciais) e volume necessário para diluir poluentes do processo produtivo ou fabricar embalagens (água cinza) – caso da indústria de refrigerantes, classificada como hidro-intensiva.

No Brasil, a Agência Nacional de Águas (ANA) é o órgão responsável por implementar e coordenar a gestão dos recursos hídricos e por regular o acesso a água de maneira sustentável. “É preciso compreender que os hábitos de consumo têm um impacto enorme sobre toda a cadeia econômica de um país. Produtos de base orgânica, por exemplo, demandam menos agrotóxicos, exigem menos água e, portanto, impactam menos no meio ambiente. Essa mudança de cultura tem reflexos positivos diretos não só na saúde, como no uso dos recursos naturais”, pondera o especialista em recursos hídricos e o assessor do órgão regulador Marcos Neves.

Ele diz que a pegada hídrica é válida desde que considerada a disponibilidade hídrica de cada região. “Não se pode comparar isoladamente a pegada do país X com a do país Y sem que seja considerada a quantidade de água que cada uma das nações dispõe para determinada atividade”, explica. Ele ressalta, porém, que esse uso deve ser consciente, independentemente de haver mais ou menos água disponível nesta ou naquela localidade.

entre 170 e 310 litros de água, conforme a metodologia da pegada hídrica

Impactos na cadeia

Produzir um quilo de carne bovina consome nada menos do que 15 mil litros de água, considerando-se desde o recurso empregado na manutenção das pastagens ao que é utilizado para fazer funcionarem as engrenagens da indústria. 

Para o economista e advogado Alessandro Azzoni, especialista em direito ambiental e consultor na área, esses números não devem ser utilizados para chocar as pessoas, mas para educá-las quanto aos próprios hábitos. 

“A pegada hídrica também serve para nos fazer refletir sobre o impacto de uma crise hídrica no nosso sistema de produção, principalmente de alimentos. É exagero, mas você já parou para pensar como será produzida toda a cadeia do que consumimos se ficarmos sem água?”, alerta. 

Gasto de água no mundo

– Há grandes diferenças na pegada hídrica de cada nação. Nos Estados Unidos, a medida per capita média, por ano, é equivalente à quantidade necessária para encher uma piscina olímpica (2.842 m³ ou 2,8 milhões de litros). Na China, a pegada média é de 1 .071 m³, por ano, para cada habitante.

– Países com recursos hídricos limitados, como o México, os do Norte da África e do Oriente Médio, costumam depender de bens importados para atender a todas as necessidades das populações, tendo, portanto, pegada hídrica interna reduzida. O mesmo acontece em locais com extensão territorial reduzida, caso do Japão, que “gasta” apenas 23% da própria água e “importa” o s outros 77%. 

– A Europa,, embora rica em recursos hídricos e extensão territorial maior, tem 40% da pegada de água fora das próprias fronteiras. Já no Brasil, que tem área considerável, somente 9% dos recursos empregados na produção de alimentos e bens de consumo vêm de outros países. 

– Para calcular o nosso próprio gasto de água é preciso contabilizar todos os recursos usados para produzir os alimentos que consumimos, a energia utilizada na nossa casa e tudo o que usamos no dia a dia, desde o livro de cabeceira ao carro que nos leva ao trabalho. 

– O site waterfootprint.org ajuda a fazer esse cálculo per capita. Basta acessar este link: http://waterfootprint.org/en/resources/interactive-tools/personal-water-footprint-calculator/.

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