Alceu Valença grava DVD com Orquestra Ouro Preto no Palácio das Artes

Raphael Vidigal - Do Hoje em Dia
01/11/2012 às 10:50.
Atualizado em 21/11/2021 às 17:46
 (Rafael Motta)

(Rafael Motta)

Alceu Valença está com passagem comprada para Belo Horizonte. E não pretende ficar pouco tempo na capital. No próximo sábado (3), o cantor e compositor pernambucano grava o DVD "Valencianas" com a Orquestra Ouro Preto no Palácio das Artes e, dia 17, é uma das atrações do projeto "BH Music Station", homenageando a Luiz Gonzaga, na estação Vilarinho.

A respeito do primeiro evento, Alceu comenta sobre a parceria que leva frevos e forrós cantados nos carnavais para o ambiente orquestral: "Fiquei muito emocionado com o tratamento que o maestro Rodrigo Toffolo e o arranjador Mateus Freire deram às minhas músicas. São jovens virtuosos, com um carinho muito especial pela música de concerto, mas também pela música popular brasileira".

Verdadeiro

Ver músicas compostas sob uma aura popular alcançarem o arco da erudição deixa o autor de tantas pérolas da MPB justificadamente orgulhoso. "Estou me sentindo quase um clássico", ri.

Ao mesmo tempo, ele salienta que a aproximação da música popular com a erudita é algo cada vez mais natural. "E é ótimo que seja assim. No passado, Bach, Beethoven e Villa-Lobos, entre muitos outros, beberam na cultura popular para conceber suas obras eruditas". No Brasil, acrescenta, vários compositores populares mereceram releituras eruditas de suas canções. "Podemos citar Dorival Caymmi, Luiz Gonzaga, Tom Jobim, Cartola, Milton Nascimento, entre tantos outros", lista.

Possíveis diferenças de estilo concebidas a respeito dos dois recortes musicais são imediatamente refutadas pelo cantor, ao utilizar um valor próprio para conceituá-las: "Não vejo separação. A separação está entre o que é verdadeiro e o que é manipulado, entre o que possui identidade e o que não possui. Se um artista copia outro, ele será sempre um subproduto. Se afirma sua identidade, inevitavelmente sua arte será autêntica e permanecerá para muitas gerações", enfatiza.

Clássicos

A definição de clássico reside, para Alceu Valença, em esfera superior à técnica utilizada. O autor de versos tão repetidos quanto ditados populares avisa: "Clássico é aquilo que resiste ao tempo. Luiz Gonzaga é um clássico, assim como Capiba (compositor de frevos e do samba-canção "Maria Bethânia", lançado por Nelson Gonçalves, que inspirou o pedido do então menino Caetano Veloso para batizar a irmã mais nova).
E são criadores extremamente populares, cujas obras expressam seu povo", considera.

A concepção do show "Valencianas" passa também pelas similaridades que amalgamam Olinda, cidade onde o cantor de "Morena Tropicana" possui residência, e Ouro Preto, casa da Orquestra mineira: "Olinda e Ouro Preto são como cidades irmãs. Uma é solar, tropical, nordestina. A outra possui o astral maravilhoso das Alterosas. Ambas são patrimônio da humanidade, onde as influências barrocas, ibéricas, coloniais, deixam suas marcas mais visíveis e expressam uma parte significativa da nossa história".

União

Prova disso é a contada fábula que uniu os arreios sonoros de Alceu às cortinas líricas da Orquestra: "Já há algum tempo, meu compadre e produtor artístico das 'Valencianas', Paulo Rogério Lage, sonhava em realizar um concerto com a minha obra".

O que fremia somente como fantasia começou a arrendondar-se de maneira palpável em 2010: "Foi quando fui a Ouro Preto me apresentar no encerramento do 'Festival de Inverno' e me apresentaram ao maestro Rodrigo".

A sintonia foi imediata. Tanto que, no verão seguinte, Rodrigo e Mateus Freire (arranjador do espetáculo) foram à sua casa, em Olinda, para mostrar as ideias que haviam desenvolvido. Depois de alguns ensaios, com a orquestra, em Belo Horizonte, veio a estreia de "Valencianas", no Palácio das Artes, "Uma noite de muita emoção para mim, para os músicos e para a plateia. E agora voltaremos a este templo das artes e da cultura em Minas Gerais para a gravação do DVD. É um privilégio".

O intérprete a se arvorar em experiência inédita na carreira não concorda que exista resistência do público em relação à música erudita.

Para ele, há um controle midiático a impedir o contato com esse tipo de arte: "As pessoas sabem o que é bom". Segundo ele, se música de qualidade for oferecida ao público, não haveria dúvidas de que seria aceita e admirada. "Mas num momento em que a mídia é completamente dominada por invenções mercadológicas, pelos ‘tchu tchu tchus’ e ‘tcha tcha tchas’ da vida, fica difícil exigir que se escute e que se admire um Villa-Lobos, um Guerra-Peixe, um Cussy de Almeida..." Até mesmo um ícone popular, como Luiz Gonzaga, que é muito falado atualmente por causa de seu centenário. "Mas que as rádios nunca tocam", argumenta.

Cinema

Combatente histórico a favor da prevalência dos critérios artísticos, Alceu Valença lançou recentemente um manifesto na internet contra a falta de músicas em português nas rádios e espaços públicos.

Sem fugir da raia, o compositor reafirma seu lugar de destaque em cenário dominado por obras descartáveis: "Já dizia isso desde os anos 70. Precisamos de mais pontos-de-vista e menos pontos-de-venda"

Alceu conta que acabava brigando com todas as gravadoras pelo fato de o mercado não pensar assim. O capitalismo, diz, é fundamentado na ideia do lucro e, portanto, seria natural que o mercado dite as regras do jogo. "Mas o verdadeiro artista faz sua arte sem concessões".

Sobre o futuro, Alceu certifica a inquietude marcante por essa estrada que percorre há mais de 40 anos: "Costumo dizer que meu tempo é tríplice. Presente, passado e futuro caminham juntos, são alicerces indissociáveis".

Para o futuro, digamos assim, imediato, Alceu acalenta vários projetos. No próximo ano, além do DVD das "Valencianas", enfim lançará o filme "A Luneta do Tempo". E há mais dois DVDs no forno: um com a recriação do show "Vivo!", de 1976, gravado agora em Recife. Outro, ainda a ser gravado, com o show em homenagem a Gonzagão, com o qual percorre o Brasil. Os mineiros terão a oportunidade de assisti-lo no dia 17 de novembro. "Sou múltiplo, multicultural e, acima de tudo, brasileiro", conclui.


Serviço

Alceu Valença e Orquestra Ouro Preto. Neste sábado (3), às 20h30, no Grande Teatro do Palácio das Artes (avenida Afonso Pena, 1537, Centro). Informações: 3236-7400.


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