Aldir Blanc, mais importante parceiro de João Bosco, concede entrevista exclusiva ao Hoje em Dia

Elemara Duarte - Do Hoje em Dia
04/07/2012 às 10:41.
Atualizado em 21/11/2021 às 23:18
 (Joana Mendonça/Divulgação)

(Joana Mendonça/Divulgação)

O nome do compositor Aldir Blanc tem sido citado nas últimas semanas por causa dos 40 anos de carreira do músico João Bosco, um de seus mais importantes parceiros musicais e que faz show em BH na quinta-feira (5). Referência mais que merecida, considerando-se que ele é autor de mais de 500 canções, dentre elas “O Bêbado e o Equilibrista” - “hino” da anistia - e “O Mestre Sala dos Mares”. Mesmo com o vasto legado que há anos dá à MPB, Blanc, aos 65 anos, não para. Uma de suas atividades atuais é escrever um romance policial, como informa nesta entrevista exclusiva ao Hoje em Dia. Os depoimentos foram concedidos poucos dias após a leitura do emocionante discurso que escreveu para apresentação no Prêmio da Música Brasileira, que homenageou seu grande amigo mineiro.

Em 1973, você abandonou a medicina. Um ano antes, João Bosco largou a engenharia. Qual a parcela de culpa de Bosco nisso?

Houve uma noite decisiva. Fui chamado para tocar tumbadora no grupo do João, ao lado de músicos como Don Chacal e Paschoal Meireles. Ainda exerci esporadicamente medicina durante um tempo, mas não dava mais
.
Pois é, você se especializou em psiquiatria. Qual era a sua linha?

Eu comecei psiquiatria atirado no fogo, numa enfermaria de indigentes no Hospital do Engenho de Dentro, 120 pacientes em andrajos para 40 leitos, quase sem remédios. Foi uma experiência terrível, mas me ensinou muito sobre o Brasil sem maquiagem. Nunca tive uma linha ortodoxa. Na psiquiatria de hoje, quem não aproveita o melhor de Freud, Jung, Reich e outros, junto com as descobertas da neurociência, está marcando bobeira.

Nos primeiros anos da parceria com Bosco, você vivia no Rio e ele, em Minas. Como o intercâmbio criativo era feito?

João me viu tirando o segundo lugar em 1969, no Festival Universitário. Então ele disse pro cara que estava vendo o programa com ele a meu respeito: “Que figura! Gostaria de conhecê-lo”. Por uma coincidência absurda, esse cara já era meu amigo e disse: “Quando você quiser”. João veio ao Rio, então eu ouvi uma quantidade espetacular de músicas sem letra, e acertamos a parceria na casa desse nosso amigo. As primeiras foram por fita nos Correios. Hoje, João vem aqui em casa, tomamos cafezinhos, muito raramente uma cerveja, mas a garra e a vontade de trabalhar são a mesma de sempre.

Quem é a musa que sofreu a “queda de patins em Paquetá”, em “Latin Lover”?

Uma soma de todas aquelas moças adoráveis da época.

E a Elis?

Elis é tudo, ontem, hoje e sempre. Regina. Eterna.

E a Clara Nunes?

Clara era a encarnação de seu próprio nome, pura luz. Seu talento associado à extrema bondade deu outra guinada em minha carreira.

E a canção “De Frente Pro Crime”?

Alguns jovens nem sabem e têm até hoje dois versos em nosso rico imaginário futebolístico, quais sejam “Tá lá o corpo estendido no chão” e o próprio título, quando o goleiro fica diante do batedor de pênalti. Coisas assim são essenciais para o compositor popular.

“Amigo é Para Essas Coisas”, seu primeiro sucesso em 1970, o diálogo realmente aconteceu?

A ideia do diálogo veio do contraste entre o que as primas e os bordões faziam no violão do compositor Sílvio da Silva. “Primas” são as cordas de baixo do violão. Assim, o violão de seis cordas tem cordas primas, mais agudas, embaixo, e bordões, com som grave, as de cima. No caso de “Amigo”, as agudas solavam: “Salve!”, e as graves respondiam: “Como é que vai?”. Assim acontecia um diálogo que estendi das notas para as palavras.

O que realmente aconteceu para que a dupla “Bosco e Blanc” se separasse em 1982?

Costumo responder debochadamente que todas as versões são verdadeiras. O que nos reuniu depois de 2000, de fato, foi a morte de nosso amigo comum Marco Aurélio Braga Nery.

Como está a sua saúde?

Tenho alguns problemas, mas chuto o balde. Minha diabetes 2, adquirida dias antes da última Copa, não me impede de tomar minha cervejinha.

Além da música na trilha da novela “Gabriela”, está trabalhando em outro projeto?

Escrevo um livro policial, que se passa na Tijuca. E tenho músicas para letrar de João Bosco, Cristóvão Bastos, Jayme Vignolli, meus parceiros mais frequentes no momento. Componho até dormindo.

Para você, quem no mundo artístico carrega a “dignidade de um mestre-sala”?

Como fiz, com Moa-cyr Luz, um samba em que chamo Nelson Sargento de “Mestre-sala dos Mares singrando as águas da baía (de Guanabara)”, fico com ele. Meu grande amigo e também uma figura sempre inspiradora.

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