Al Pacino está em dose tripla nos cinemas brasileiros

Agência Estado
23/04/2015 às 17:33.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:45
 (divulgação/arquivo)

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Havia algo de doloroso, pungente, no jovem Al Pacino. O garoto corrompido pela droga de O Parque das Agulhas/Panic in Needle Park, de Jerry Schatzberg; o idealista que vira o frio estrategista na luta pelo poder dentro da Máfia de O Poderoso Chefão, de Francis Ford Coppola; o outro idealista, cada vez mais isolado dentro da polícia corrupta de Serpico, de Sidney Lumet. O que ressalta nesse primeiro Pacino é o olhar agônico, de bicho acuado. E, então, no Chefão 2, Coppola completa a transformação. Como Michael Corleone, Pacino alterna silêncios com explosões assustadoras de fúria. E está pronto para seus papéis desmesurados - o Scarface de Brian De Palma; o policial homofóbico de Parceiros da Noite, de William Friedkin.

Mas ele nunca deixou de guardar a inocência nem o romantismo dentro dele. Basta lembrar do chapeiro apaixonado pela garçonete de Frankie e Johnny, de Garry Marshall, e a propósito ela era Michelle Pfeiffer. Clair de Lune fornecia a trilha para a love story dos dois. Onde fica essa lanchonete, por Deus? Ator de teatro, Pacino foi sempre apaixonado por Shakespeare. Fez até um filme como diretor - À Procura de Ricardo (o 3.º). Elevado à condição de mito, tem a capacidade de rir de si mesmo - "Mito era Marlon Brando, não eu." Só seus dois filmes em cartaz - o ótimo Não Olhe para Trás, de Dan Fogelman, e O Último Ato, de Barry Levinson, baseado em A Humilhação, de Phillip Roth, já valeriam que se falasse de Alfredo Pacino e de suas extraordinária carreira. Mas neste fim de semana tem mais. O programa na seleção de clássicos restaurados/remasterizados da rede Cinemark é Perfume de Mulher, de Martin Brest. Pacino foi muitas vezes indicado para o Oscar. Perfume de Mulher foi o filme com o qual, finalmente, ganhou o prêmio da Academia.

Não há muito o que dizer sobre O Último Ato, exceto que o filme de Barry Lervinson não faz justiça ao belo livro de Roth e o retrato do ator em crise não honra nem o talento de Pacino. A conversa é outra quando se trata de Não Olhe para Trás. O filme poderia ser melhor, mais complexo. No cerne da trama está a ideia do cantor e compositor acomodado que, de repente, recebe essa carta que não havia sido enviada - e que foi escrita para ele, 30 anos atrás, por John Lennon. Uma carta com palavras que, para o velho Pacino - ele se chama Danny Collins -, parecem sábias. Nosso homem muda de vida. Abandona as drogas, a mulher mais jovem, e parte em busca do filho que não conhece.

E se a carta fosse falsa, uma iniciativa do manager (Christopher Plummer) que vê o amigo naufragar? Seria outro filme. Melhor? Talvez. O filme tal como está é bom, embora a última frase (você vai entender quando vir, ou se já viu) seja dispensável. Haveria suspense, um final em aberto, quem sabe, mas pode ser que também cortasse o cordão umbilical que une pai e filho por graça das interpretações de Pacino e Bobby Cannavale, o bronco Kowalski de Woody Allen em Blue Jasmine. É um filme feito de químicas - no plural. Pacino e a gerente do hotel, Annette Bening, que não aceita seu convite para jantar, mas o estimula a compor. Pacino e a nora, interpretada pela sra. Ben Affleck, Jennifer Garner. Elektra, a super-heroína, perdeu seus poderes, virou dona de casa. E chora! Pacino e a neta, uma garota que, como o filho de Mommy - a obra-prima de Xavier Dolan -, sofre do déficit de atenção. Não Olhe para Trás é divertido, emocionante, até piegas. E daí? Imagine - a canção de John Lennon, integrada à trilha, imagina por você. Imagine agora Al Pacino cego, cansado da vida. Ele contrata um jovem, Chris O'Donnell, para... Você vai terminar entendendo. Um cego que dirige uma Ferrari e dança o tango com a deslumbrante Gabrielle Anwar.

O papel em Perfume de Mulher é tão emblemático que a Academia de Hollywood não aguentou e deu a Pacino seu Oscar. Finalmente! Antes dele, e pelo mesmo papel - trata-se de um remake -, Vittorio Gassman já havia sido melhor ator no Festival de Cannes pelo outro Perfume de Mulher, de Dino Risi, que é melhor que o de Brest, mas isso não tira o mérito do filme que você vai poder (re)ver com imagem e som zero bala.

Al Pacino! Na vida, ele admite que foi um pai omisso, cuidando mais da carreira que da primeira filha, hoje adulta. As delícias da paternidade descobriu só aos 61 anos, como pai dos gêmeos que teve com a atriz Beverly D'Angelo (e tiveram mais uma filha, também). Aos 75 anos, que completa no fim de semana - nasceu em 25 de abril de 1940, em Manhattan -, Al Pacino pode até não se achar mito como Marlon Brando, com quem dividiu a cena - e de quem eventualmente roubou a cena - no primeiro Chefão. Mas ele é, sim - mito.
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