19ª Mostra de Tiradentes começa nesta sexta-feira celebrando encontro de gerações

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
22/01/2016 às 07:56.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:07
 (Universo Produção/Divulgação)

(Universo Produção/Divulgação)


As leis de incentivo, com as suas intrincadas regras, e a mudança da película para o digital criaram um fosso geracional no cinema brasileiro, forçando a saída de cena da velha geração e apresentando novos rostos que acompanharam as revoluções tecnológicas.

A passagem forçada de bastão aconteceu nas duas últimas décadas, mas agora há um gradual retorno de nomes consagrados, apoiados por jovens realizadores. Esse “grande encontro” será celebrado na 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, com início nesta sexta (22) na cidade histórica.

“Não foi nada programado. Veio mesmo da produção que se apresenta ano a ano, o que gerou um momento histórico para a Mostra e para o cinema nacional. Veteranos e novos realizadores nunca estiveram tão juntos como agora”, comemora Raquel Hallak, coordenadora-geral do festival.


Mistura que deu certo

Entre as figuras tarimbadas que estarão presentes na programação, até o dia 30, destaca-se Helena Ignez, musa do Cinema Marginal, nas décadas de 1960 e 70, que dá prosseguimento às experiências cinematográficas do marido (já falecido) Rogério Sganzerla.

Também virão Julio Bressane, parceiro de Sganzerla e dono de um estilo muito particular, voltado à transcriação e à intertextualidade; e Walter Lima Jr., diretor de “O Menino do Engenho”, que deu seus primeiros passos ao lado dos fundadores do Cinema Novo, nos anos 60.

O moçambicano Ruy Guerra, de 84 anos, residente no Brasil desde 1958, ainda não confirmou se poderá acompanhar, com as filhas Dandara e Janaína, a exibição de seu mais recente longa-metragem, “Quase Memória”, baseado em livro de Carlos Heitor Cony.

Parcerias

“Todos eles vão a Tiradentes porque estão com filmes novos”, sublinha Raquel Hallak, coordenadora-geral da Mostra, que destaca a vitória desses veteranos sobre um sistema de leis e tecnologias que não existia em sua época. E uma explicação para um retorno tão marcante é justamente a colaboração dos mais jovens.

Ela cita as parcerias entre Walter Lima e a atriz Virginia Cavendish, que também é produtora do filme “Através da Sombra”; de Bressane com o produtor Bruno Safadi, que se reuniram para adaptar um conto de

Jorge Luis Borges, com Marjorie Estiano como protagonista.

“Os veteranos se tornaram ídolos dessa nova geração, uma referência para eles. É um encontro muito bacana para os dois lados – de se filmar com quem se admira e de se experimentar novos processos”, assinala Raquel.

Andrea Tonacci divide a experiência em construir roteiros

Primeiro curta de Andrea Tonacci completa 50 anos

Um dos diretores de maior influência para as novas gerações, Andrea Tonacci considera um risco participar de projetos com realizadores mais jovens. “Um risco para eles, quero deixar claro”, brinca o cineasta ítalo-brasileiro, que será homenageado na noite desta sexta (22), na abertura da 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes.

“Fico feliz de eles me terem em consideração. Espero poder contribuir com alguma coisa, mas tenho certeza que vou aprender muito”, registra, referindo-se, particularmente, aos convites de Paulo Sacramento e Adirley Queirós para dividir sua experiência com eles na construção de roteiros. Projetos não faltam, garante o cineasta.

Recentemente, porém, fechou a produtora que tinha para não ter que inchar orçamentos de filmes. “Para cumprircom as obrigações como pessoa jurídica, tendo que fazer a grana girar, o orçamento vai inflando e vira um balão”, critica.

“Serras da Desordem”

Diretor de filmes como “Blá Blá Blá” (1968), “Bang Bang” (1971) e “Serras da Desordem” (2006), Tonacci foi pego de surpresa com a homenagem, imaginando que a organização apenas lembraria os dez anos de lançamento de “Serras da Desordem”, ocorrido no festival. “Acabei entrando junto”, diverte-se.

A homenagem também coincide com os 50 anos de seu primeiro curta, “Olho por Olho” – que, a exemplo de “Blá Blá Blá” e “Bang Bang”, estava carregado de muita revolta, raiva e impotência, principalmente devido ao contexto político da época do regime militar.

O cineasta confessa que não pensa muito no que já fez. “Estou em busca de outras histórias, de coisas novas. Claro que, muitas vezes, eu tenho que voltar a eles, quando preciso pensar na restauração da minha obra, mas a sensação é de uma recriação daquela experiência, como se estivesse vendo pelo retrovisor”.

"Bang Bang": uma das obras mais importantes do cinema brasileiro, o longa foi filmado em Minas



Pouco visto

Tonacci salienta que seus filmes nunca deixaram de ser políticos, embora a raiva de antes já tenha se dissipado. “Não é da mesma forma, com a política como conteúdo. Na época, ela estava mais na narrativa. Hoje já tenho mais conhecimento da situação”, analisa o realizador, nascido em Roma há 71 anos.

Classificado como “dono de uma obra até hoje menos vista do que deveria”, Tonacci não se arrepende de suas escolhas. “A questão financeira nunca foi a preocupação primeira. Felizmente pessoas atentas responderam ao filme. Os filmes fazem isso: são descobertos e nos fazem sermos descobertos”.

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