Aos 66 anos, Tonico Pereira repassa uma trajetória marcada por bons papéis

Elemara Duarte - Hoje em Dia
06/04/2015 às 08:03.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:31
 (Frederico Haikal)

(Frederico Haikal)

Em mãos, uma taça de vinho tinto. Como indumentária, um despojado bermudão para enfrentar os dias ainda quentes (mesmo outonais) e uma camiseta bem-humorada, da própria “grife”. Nos pés, chinelo de couro da tradicional Feira de São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Para coroar tudo, frases extraídas de sua própria filosofia de vida. Foi assim que o ator Antonio Carlos de Sousa Pereira, ou simplesmente Tonico Pereira, recebeu os fãs belo-horizontinos na abertura da edição 2015 do projeto “Curta Circuito – Mostra de Cinema Permanente” no Cine Humberto Mauro, na última semana.

O evento lembrou o primeiro longa-metragem que contou com Tonico no elenco, “A Lira do Delírio” (1978), exibido ao público com direito a bate-papo no final com o ator e o diretor do filme, Walter Lima Jr. Hoje, já são mais de 80 filmes no vasto currículo, que abarca também a televisão e o cinema. Na sétima arte em particular, ele conta que, neste ano, deve ser finalizado mais um título. Não bastasse, ele poderá entrar em cena em outros três.

Com o despojamento de corpo e de alma, o ator, hoje contabilizando 66 anos, conversou com a reportagem, e ainda anunciou a participação em séries e na novela “Favela Chic”, próxima investida da Rede Globo no horário nobre das 21h, com dramaturgia de João Emmanuel Carneiro.

Mas filósofo que se preze – mesmo que popular – tem que publicar livro. E Tonico Pereira não foge à regra. Um segundo título, aliás, está previsto. Mas, para quando? “Não sei ainda. Porque depende de mim. E no que depende de mim, a organização é nenhuma”, admite.

Tudo derivado dos posts que ele publica no perfil no Facebook. Dono de duradouras e inesquecíveis interpretações que entraram para a memória dos brasileiros – caso do “Mendonça”, o divertido chefe do personagem Lineu (Marco Nanini) na segunda montagem de “A Grande Família” na TV, durante 14 anos, ou de “Zé Carneiro”, do “Sítio do Picapau Amarelo”, mais uns oito, Tonico ultrapassa os 40 anos de carreira e declara: “Meu sonho é morrer contemporâneo”.

Há algum segredo para fazer com que um personagem não caia no tédio diante do público de televisão?
Meu amor, você tem que humanizar o personagem, então, ele se torna atemporal.

Para quem não compreende este “humanizar”, como explicaria este termo?
Se você me oferecesse uma viagem para visitar Paris e, ao mesmo tempo, se me desse uma oportunidade, profissionalmente ao menos, para me visitar por dentro, escolheria me visitar por dentro. Uma, porque seria mais barato. E outra, porque o autoconhecimento é fundamental para quem lida com criação. É fundamental para todo ser humano. Eu me ligo numa coisa que é apresentar o personagem. Faço como se apresentasse um amigo aos outros amigos. Meus personagens fazem comigo uma quadrilha. E a gente age junto para sobreviver.

E sobre os recentes trabalhos?
Gravei o primeiro capítulo do programa que substitui “A Grande Família”, na Globo (“Chapa Quente”, com Ingrid Guimarães e Leandro Hassum, no qual ele aparecerá encarnando, mais uma vez, o personagem Mendonça). Também estou fazendo “Assombrações” (série que estreia em maio, na mesma emissora). Este cabelo, por exemplo, é de aluguel, é um mega hair para fazer um coveiro em “Assombrações” (diz, puxando a madeixa branca de dentro do casaco). Depois tem a próxima novela das 21h, “Favela Chic”, onde faço o cara que cria o personagem principal, que deve ser feito pelo Alexandre Nero.

E cinema?
Há filmes que fiz em Vitória, outro que vou fazer em São Paulo, talvez em Brasília, outro no Rio de Janeiro, “As Polacas”, tudo para este ano.

Assim, você logo vai chegar ao marco de 85 filmes fácil, fácil.
(Risos). Eu espero aguentar. Eu parei de contar os filmes depois de um certo tempo.

São quantos anos de carreira?
Entrei em cena pela primeira vez aos oito anos de idade. Era em teatro religioso, na minha terra, em Campos dos Goytacazes (cidade fluminense). Mas eu não conto isso. Depois passei a contar sério a partir de 1968, quando fui para o Rio de Janeiro e comecei a fazer teatro em um grupo da universidade, em Niterói. De lá, venho até hoje.

E no cinema?
Veio com este “A Lira do Delírio”. Nele encontrei o Claudinho (Claudio Marzo, falecido recentemente), o Waltinho (Walter Lima Jr., diretor) e tal... Mas, além de ser meu primeiro filme, é um longa-metragem do qual eu gosto muito. Eu era figurante. Eles foram muito legais comigo. Eu fazia teatro e nunca tinha visto uma câmera. Apareceu uma entrevista para figurante e eu me ofereci para fazer de graça (em 1973). Mas as filmagens foram interrompidas, uns dois ou três anos. Com isso, eu evoluí na profissão. Aí, na segunda fase, o Waltinho me chamou.

E o seu blog, “O Analfabeto que Escreve”?
Está meio parado. Mas estou postando muito no “Face”. São frases. Já virou um primeiro livro, o “Primeiro (E Talvez o Último) Almanaque à Mão das Toniquices do Pereira” (lançado em 2012, pela Editora Multifoco). Agora vai sair o segundo. (O ator mostra o telefone com vídeos curtos com as frases que posta no Facebook). E eu ainda tenho essas camisetas aqui (“Meu sonho é morrer contemporâneo”, são os dizeres que estampam a t-shirt) Tem minha assinatura. Vendo em um quiosque em (no bairro carioca de) Laranjeiras e agora vai entrar na internet. São camisetas, canecas, calças, cuecas com frases minhas.
É a grife do Tonico!
Não gosto da palavra “grife”, não, mas é isso.

E este chinelo é da sua marca?
Feira de São Cristóvão, R$ 23! (risos). Minha filha e meu neto me deram. Vou lá de vez em quando. As minhas primeiras experiências profissionais foram com teatro nordestino.

Os personagens populares sempre na sua frente, hein?
É porque eu tenho uma antropologia popular. Tanto é que não é muito fácil me reconhecerem na rua. E quando notam, não acreditam que seja eu.

Você tem cara de brasileiro?
Eu sou profundamente brasileiro. Acho a melhor coisa do mundo!

Imagine um “Tonico Pereira” suíço?
De jeito nenhum! (risos)

E a cachaça, você parou de produzir?
Era produzida em (na cidade de) Rio das Ostras. Era meu e de meu sócio, que também era produtor, ator e diretor de teatro. Tinha um nome bom: “Saudável Corrimento”. Artesanal até no rótulo, que era feito à mão. Meus clientes adoravam, o Tom Jobim, por exemplo. Eu entregava umas três garrafas para ele. De Antonio para Antonio...

E por que acabou?
É porque, minha filha, a vida muda. Mas agora estou com estas camisas…
 

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