Atores mineiros driblam sotaque para dublar estrelas de Hollywood

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
01/07/2015 às 06:26.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:42
 (Carlos Henrique)

(Carlos Henrique)

São mais de 80 nomes mineiros a serviço do cineasta Woody Allen, um dos mestres do humor refinado. “Quando é um filme dele, temos que convocar Belo Horizonte inteira, mais Betim, Contagem... Ele trabalha com muitos personagens”, diverte-se Luciano Luppi.

O veterano ator está se referindo a “Celebridades”, filme de 1998 que o estúdio mineiro BW dublou para exibição na TV paga, entrando num segmento antes dominado pelo eixo Rio-São Paulo. A capital mineira conta hoje com duas empresas no setor – a segunda é a Haja.

Dezenas de atores da cena mineira, como Alexandre Cioletti e Ricardo Righi, já emprestaram suas vozes a Penélope Cruz, Ian McKellen, Gérard Depardieu, Roberto Benigni e Jason Statham. “Quando precisam de um vovô bonzinho, eles me chamam”, diz Luppi.

O diretor de dublagem Alexandre Silva – um dos responsáveis por, após receber os filmes originais e as traduções, escolher as vozes – acompanha o crescimento desse mercado desde o seu nascimento, há dez anos, beneficiado com as facilidades tecnológicas de hoje.

Concorrência

“É difícil se equiparar a Rio e São Paulo, mas em qualidade a gente não perde. Embora não tenhamos um gênio como Garcia Jr, o material humano é muito bom, preparado para fazer qualquer coisa”, observa Alexandre, que já trabalhou para estúdios de São Paulo.

Localizado no bairro São Luís, o estúdio Haja se resume a um mezanino de poucos metros quadrados, onde estão duas cabines apertadas e duas mesas com computador para Alexandre coordenar e editar a dublagem de programas, em sua maioria, religiosos.

Alexandre dubla, por exemplo, o pastor nigeriano Chris Oyakhilome. Mas também já fez a voz de Statham em “Revólver” (2005), “contracenando” com Luppi – ou melhor, Vincent Pastore.

Alexandre Silva destaca que o trabalho de dublagem também envolve uma atenção redobrada no roteiro de falas, já que o tradutor muitas vezes não vê os filmes (Fotos: Carlos Henrique/Hoje em Dia)

Sotaque

No caso dos estúdios mineiros, uma das preocupações é com o sotaque. “Além de ‘cantar’ um pouco, a gente tem dificuldade em terminações como ‘ando’, engolindo a letra d. Sem falar na quantidade de nú, nó, cê e uai”, assinala Alexandre, que já viu muito novato exagerar na interpretação, usando mais o corpo do que a voz.

“Certa vez pedi para um ator dublar o momento em que recebe o tiro. Quando me dei conta, ele estava no chão da cabine, baleado”, lembra, entre risos.

Para Luppi, o desafio está em dublar grandes atores. “Você sente que ficou devendo milhões”, salienta o ator, citando Ian McKellen.

Ele é um dos poucos atores que gosta de fazer vozerio, aquelas vozes de fundo num lugar movimentado. “Você não precisa falar nada importante, então a gente inventa. Uma vez, como estava de viagem para a Croácia, comecei a falar dos lugares que iria visitar”, recorda Luppi, que já cansou de beijar o braço nas cenas mais calientes.

Arnold Schwarzenegger e He-Man têm em comum o dublador

Garcia Jr. tinha apenas 17 anos quando foi apresentado a Arnold Schwarzenegger. Ou melhor, a voz do Mr. Universo austríaco que, no início dos anos 80, começava a dar os seus primeiros passos como astro hollywoodiano.

“Precisavam de uma voz forte para a dublagem de Schwarzenegger em ‘Conan, o Bárbaro’ e eu já estava fazendo naquela época o desenho do He-Man, um herói musculoso que manejava uma espada como o Conan”, lembra.

Durante 38 anos, Garcia Jr. fez algumas das vozes mais marcantes da dublagem brasileira mas sempre é identificado com o grandalhão dos filmes de ação, que volta a dublar em “O Exterminador do Futuro: Gênesis”.

O filme entra em cartaz nesta quarta-feira (2), em versões legendadas e dubladas. Quem vir as duas perceberá que as vozes de Garcia Jr. e a original têm pouca relação. “Se eu tentasse reproduzir o acento austríaco dele seria suicídio”, justifica.

O dublador destaca que, apesar de falar fluentemente o inglês, Arnold tem um sotaque muito forte, muito característico dele. E se tentasse imitá-lo soaria ridículo. Por isso preferiu só acentuar a falta de emoção do personagem.

E entrega aos fãs do ciborgue: “Diferentemente do primeiro e segundo ‘Exterminador’, dessa vez ele fala bastante. Como ele é um astro, todo mundo quer mais que ele fale e apareça bastante”, avalia Garcia Jr.

“Meu nome é Bond”

Outro ícone que o dublador está trabalhando é o espião a serviço de Sua Majestade, James Bond. Começou com a escalação de Daniel Craig para viver 007, dublando-o em “Cassino Royale” e “Operação Skyfall”.

Uma boa coincidência, pois é um grande fã de Craig. “Desde os seus primeiros trabalhos percebi que era um bom ator. E fui descobrir depois que nascemos na mesma data (2 de março), com a diferença de um ano”, afirma.

Somente uma vez que Garcia implorou aos diretores de dublagem para fazer um personagem: o locutor de rádio vivido por Robin Williams em “Bom Dia, Vietnã” (1987). “Tinha acabado de voltar de Portugal, onde havia trabalhado com rádio”, lembra.

“Vi o filme lá e quando ele apareceu no estúdio, achei que poderia contribuir, pois havia me identificado com ele. Estudei muito para fazê-lo, algo que não era e não é muito comum entre os dubladores”, observa.

Garcia Jr – Ele acredita que fechou um ciclo na dublagem, fazendo trabalhos esparsos para se dedicar à atuação e direção

‘Exterminador 5’ muda a cronologia da franquia

Um aviso para os fãs que se agarraram à cronologia de “O Exterminador do Futuro” nos quatro primeiros filmes da franquia: esqueçam-na. A quinta parte, dirigida por Alan Taylor, simplesmente joga no lixo 30 anos de relações entre passado e futuro, estabelecendo uma nova linha do tempo.

Isso não quer dizer que personagens como John Connor, Sarah Connor, Kyle Reese e o ciborgue ex-malvadão T-100 tiveram que sair de cena. O que podemos dizer, sem adiantar muitos detalhes do roteiro, é que eles ganharam novos perfis e funções, especialmente o primeiro.

Pode soar como um atentado à verossimilhança, mas o fato é que mudanças temporais fizeram com que John (Jason Clarke) deixasse de ser o líder absoluto dos rebeldes contra as máquinas. Para ser mais direto, é como se os produtores retirassem um dos eixos da saga.

Só essa mudança já é capaz de alterar substancialmente a premissa dos filmes: já não mais importa seguir o destino traçado para Sarah, Kyle e John, como se esse último fosse o grande salvador. Ou seja, abandonam-se o caráter messiânico e a ideia de sacrifício.

Salvadora

A dificuldade de encarar essa nova percepção é estampada em Kyle (Jai Courtney), que a todo tempo tenta realinhar os fatos como deveriam ser. Sarah, com quem ele deveria se relacionar para nascer o futuro líder, deixa de ser a mãe protetora para se tornar a grande protagonista.

Vivida por Emilia Clarke, a personagem cria outra relação, substituindo mãe/filho por pai/filha, sendo ela (atenção: spoiler) a “filha” de T-100, que a criou desde pequena, abrindo caminho para uma salvadora feminina e até prequels. Isso mesmo puristas, a ação não começa mais em 1984.

Confira algumas dublagens mineiras:

CENA DO SERIADO "MAD MEN" - DUBLAGEM DE LUCIANO LUPPI



CENA DO FILME "O QUINTO ELEMENTO" - DUBLAGEM DE LUCIANO VIVACQUA



CENA DO FILME "O QUE É O AMOR" - DUBLAGEM DE ALEXANDRE SILVA



 

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