“No momento em que estamos sendo tão bombardeados, repensando sobre tudo, viemos falar do que é essencial”, diz a atriz e jornalista Bianca Ramoneda. A artista se refere à peça “Inutilezas”, em cartaz neste fim de semana no Teatro Sesiminas, com textos do escritor mato-grossense Manoel de Barros (1916-2014) e direção de Moacir Chaves. Bianca assina o roteiro e atua ao lado de Gabriel Braga Nunes.
A trama não tem personagens definidos; pode falar tanto de um casal de irmãos quanto de uma dupla de atores. “É uma peça que dura através dos tempos e promove a valorização das coisas imprestáveis, daquilo que não serve para nada”, indica Gabriel.
Para Bianca, o espetáculo traz também uma “herança que o Brasil ganhou do sertão mineiro”. “Fala sobre quando você acha não ter nada, mas tem o mais precioso que é a capacidade de inventar. Manoel de Barros faz a gente dar uma acordada para isso”, diz ela.
Invenções
O diretor musical Pedro Luís (nome à frente do grupo A Parede) contribuiu nesse sentido. Assim como Barros fazia com as palavras, Pedro Luís fez invenções sonoras. Quem manda o recado em cena é Pepê Barcellos – músico que faz as intervenções musicais ao vivo.
De latas velhas a máquina de escrever, qualquer coisa pode virar instrumento. “É preciso desinventar os objetos. O pente, por exemplo. É preciso dar ao pente funções que não a de pentear. Até que ele fique à disposição de ser uma begônia”, anuncia Gabriel, do palco, logo no início da sessão. “A abertura já fala sobre desconstrução, porque o Manoel acreditava que só desconstruindo ou desinventando você chega no sentido genuíno”, afirma o ator.
E, se tinha uma coisa na qual Barros era mestre, era em desconstruir. “A sintaxe dele era genial. Ele transformava substantivo em verbo, inventava palavras, torcia a função gramatical de propósito justamente para a gente pensar fora da caixinha, nos tirar do lugar acostumado”, diz Bianca.
Reapresentação
O espetáculo chega à capital mineira cerca de 15 anos depois da primeira montagem. Na época, Manoel aprovou com louvor o trabalho. Numa entrevista, o escritor disse que se sentia quase um Nelson Rodrigues, “só que não trágico, mas meio engraçado”. “Isso me comove até hoje. Trocamos cartas e ele (Barros) escreveu coisas lindas. (…) Depois, nos recomendou para vários lugares”, diz Bianca, que idealizou a montagem.
“O Manoel era um homem muito doce, sempre foi muito carinhoso conosco. Quando fomos fazer a peça em Campo Grande, fomos à casa dele e conhecemos a família toda. Foi muito importante conhecer todos eles, porque você desmitifica muita coisa. São pessoas muito carinhosas”, recorda Gabriel.
Nenhuma palavra da obra de Barros foi alterada para o teatro. E o roteiro segue como o do original. No entanto, os tempos são outros, o que faz da reapresentação uma novidade. “A obra do Manoel é a mesma, mas a nossa interpretação dela é mais profunda agora. A encenação ficou mais enxuta em termos cênicos e a palavra e o som ganharam mais força ainda”, finaliza Bianca.
: “Inutilezas” tem sessões sábado (11), às 21h, e domingo (12), às 18h, no Teatro Sesiminas (rua Padre Marinho, 60, Santa Efigênia). Ingresso: R$ 40 e R$ 20 (meia).