Era para ser uma história de amor, mas a realidade sociopolítica levou o espetáculo “Gritos” – cartaz a partir de hoje no CCBB – a outra direção, tornando-se um assumido ato político, envolvendo temas como racismo, homofobia e menosprezo por pessoas consideradas invisíveis.
“Tínhamos como base a busca do amor, mas fomos influenciados por esse momento do país e virou uma história sobre a falta do amor e a busca do reconhecimento”, observa André Curtis, que, ao lado de Artur Luanda Ribeiro, assina a dramaturgia e a direção e está no elenco da peça.
Os dois criaram a companhia franco-brasileira Dos à Deux, radicada há quase duas décadas na França, e, pela primeira vez, montam um espetáculo inteiramente no Brasil. Apesar dessa mudança, a proposta de trabalho do duo continua a mesma, expressando somente pelos gestos.
O título pode ser lido como uma ironia, mas André registra que o silêncio e o corpo podem ser tão eloquentes quanto a fala. “Nada contra a palavra. Na verdade, a gente vai construindo o gesto e, quando pensamos num texto, ele acaba sendo meramente ilustrativo”, afirma o artista, que destaca a “precisão absurda” dos movimentos.
“Gritos” apresenta três histórias sobre margina-lização. O primeiro trata da homofobia e reflete uma triste estatística, que mostra o Brasil como campeão de assassinatos de homossexuais. O segundo texto é mais metafísico, em torno de um homem que tem sua cabeça separada do corpo, resultado dos muros que vão sendo criados.
O terceiro é, nas palavras de André Curtis, uma história de amor passada no Oriente, mostrando o grito de uma mãe que abandona o seu filho. “Ele fala de migração, de pessoas morrendo em travessias de barcos clandestinos”, salienta o dramaturgo.
Serviço: “Gritos” – Da companhia Dos à Deux. De hoje a 12 de junho, de sexta a segunda, às 20h, no CCBB (Praça da Liberdade, 450). Ingresso: R$ 20 e R$ 10 (meia).