Crianças podem interagir com músicos em “Concertos para Bebês”

Cinthya Oliveira - Hoje em Dia
23/05/2014 às 11:40.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:42
 (Joaquim Dâmaso)

(Joaquim Dâmaso)

No Brasil, é uma completa novidade um espetáculo cênico-musical dedicado exclusivamente para a primeira infância. Talvez por isso, houve uma imensa procura pelos ingressos de “Concertos para Bebês”, criação da companhia portuguesa Musicalmente que se apresenta no Teatro Francisco Nunes sábado (24) e domingo (25), dentro da programação do Festival Internacional de Teatro de Palco & Rua (FIT). Os ingressos estão esgotados desde a semana passada.

Nesse espetáculo, as crianças não apenas ouvem as músicas (clássicas, no geral), como também podem interagir com o grupo – com permissão até mesmo para tocar nos músicos e nos instrumentos. Não é um show com músicas infantis, como estamos acostumados a ver, mas uma apresentação com conteúdo de grandes salas de concerto.

Confira a entrevista com Paulo Lameiro, diretor do concerto, em que ele mostra uma perspectiva diferenciada sobre a plateia formada por bebês e crianças pequenas. Para ele, esse não é o público do futuro, mas do presente.

Como nasceu a ideia de "Concertos para Bebês"?

Em 1991 teve início numa Escola de Artes Pousos (em Leiria, Portugal) um programa de ensino artístico para crianças os 0 aos 5 anos. Trata-se de um conservatório oficial de música, que tem programas para grávidas, e depois para bebés que têm 2 aulas semanais durante os seus primeiros 5 anos de vida. Mais tarde, em 1996, teve início o programa músicos de fraldas, que forma profissionais (educadores de infância, psicólogos, pediatras, e pais) que mais tempo passam com bebés, uma vez que os bebês depois dos 4 meses deixam as suas famílias e vão para para creches e jardins de infância. Destes dois programas chegou-se a uma conclusão: os bebês até aos 3 anos de idade estão proibidos legalmente de assistir a um concerto da chamada música clássica, e por isso não existia programação musical para esta faixa etária. Ora sendo os primeiros meses de vida o momento em que o ser humano tem a sua capacidade de audição mais elevada, não fazia sentido não poder assistir a um concerto. Nasceram assim em 1998 os “Concertos para Bebês”.

Há quantos anos o espetáculo é apresentado? Por quais países já passou?

Aulas e oficinas de música para bebês e grávidas fazemos desde 1991 na Escola de Artes SAMP, e foram já vários milhares de bebés e famílias que passaram por este projeto, havendo já profissionais licenciados que aqui se iniciaram. Os concertos fazemos desde 1998, e ultrapassamos este ano os 800 programas, percorrendo algumas das principais salas da Europa. Portugal, Espanha, Suécia, Inglaterra, França, Irlanda, Bélgica e China são alguns dos países por onde já passamos.

Qual é a importância de um espetáculo musical que tenha como objetivo a interação com crianças tão pequenas?

Os concertos para bebês, contrariamente às aulas e oficinas musicais, não têm objetivos pedagógicos ou educativos (ainda que estes sempre estejam presentes) e a interação não é estimulada. Acontece é que o modelo de concerto confere inteira liberdade ao bebê, e este pode escolher o que mais lhe interessa, ouvir, dançar, dirigir-se aos interpretes, ou mexer nos instrumentos. Mas a importância dos concertos que realizamos, o que neles é mais significativo, é a possibilidade de os bebês ouvirem músicos ao vivo e não em gravações, num palco e não no carro ou em casa, por intérpretes ao mais alto nível artístico e não por músicos que só fazem "espetáculos para crianças”, música complexa e rica estrutural e artisticamente e não “música infantil”. Os bebês e as crianças não são o público do futuro, não são seres em formação para serem pessoas, são já público aqui e agora, são já pessoas com gostos, critérios, e capacidade de se emocionarem com o que ouvem.

Como as crianças reagem ao espetáculo? Qual foi o caso mais surpreendente?

As crianças reagem ao concerto de forma muito diversa e individual, como os adultos. São contudo mais honestos e verdadeiros no ato de escuta, pelo que, se não gostam de alguma obra, de imediato reagem, e isso obriga a uma gestão em tempo real do concerto muito criteriosa. Podemos contudo dividir em 3 grupos as reações do público mais novos destes concertos. Os bebés de colo, que permanecem nos braços de suas mães ou pais, reagem ao concerto e à música que ouvem com indicadores mais sutis: bloqueio de respiração em momentos mais dramáticos, abertura de olhos, movimentação de lábios, posturas corporais mais ou menos tensas, suspiros, primeiros sons, babam em momentos de prazer, querem comer o que conseguem apanhar, etc. Os bebés que começam a andar, estimulam-se com a música e o som para gatinhar ou dançar, dirigem-se ao centro da cena e permanecem junto aos intérpretes em posturas mais ou menos ativas. As crianças mais velhas já adotam a postura que vêm nos seus pais, e permanecem sentadas nas almofadas, participando somente quando em algum momento do concerto solicita é suposto cantar ou percutir no corpo.

Casos surpreendentes há em todos os concertos, e temos histórias sem fim. Um dos que recordo agora foi a cara de uma mãe, estupefacção, surpresa e encanto, quando ouviu o seu bebê cantar pela primeira vez num concerto que fizemos para bebês surdos.

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