Cult de Hitchcock destrona Kane

Paulo Henrique Silva - Do Hoje em Dia
12/08/2012 às 12:02.
Atualizado em 22/11/2021 às 00:23
 (Divulgação)

(Divulgação)

A expressão “o melhor filme de todos os tempos” já não pode mais ser aplicada a “Cidadão Kane” (1941), de Orson Welles. Durante décadas, absoluto na preferência de críticos de cinema, a produção que inovou a linguagem dessa arte, com o uso de profundidade de campo e a narrativa em flashback, acaba de ser desbancada por “Um Corpo que Cai” (1958), de Alfred Hitchcock. Promotora da pesquisa desde 1962, que acontece a cada dez anos, a revista “Sight and Sound”, do British Film Institute, reuniu 846 especialistas (recorde de participação), de várias partes do mundo. Nomes respeitáveis que tornam o resultado ainda mais relevante.   A derrota de “Cidadão Kane” não foi tão fragorosa como pode parecer – ficou 34 votos atrás do longa-metragem do mestre do suspense, passando a ocupar o segundo posto. Em 2002, “Um Corpo que Cai” já tinha ameaçado a soberania de Orson Welles, perdendo por cinco votos apenas.   Estigmatizado nos Estados Unidos por um bom tempo, Hitchcock só começou a ter seu trabalho sendo reconhecido no exterior, em especial com a turma da revista francesa “Cahiers du Cinema”, que mais tarde criaria o movimento da Nouvelle Vague.   O status de cult de “Um Corpo que Cai” cresceu com o passar dos anos, embora ainda divida a opinião dos críticos se é a melhor obra de Hitch – muitos optam por “Janela Indiscreta”, “Psicose” e “Os Pássaros”. Razão que pode explicar a escalada do filme na lista da “Sight and Sound”.   Lucas Salgado, jornalista do site Adoro Cinema, é um dos que acham que o longa de suspense, sobre o detetive acrófobo (James Stewart) que se envolve com o alvo (Kim Novak) de sua investigação, é superior.    “Acho que a eleição faz parte de um processo de valorização do Hitchcock para superar o estigma de mestre do suspense. A forma com a qual ele conduz a narrativa, escondendo do protagonista e do público a natureza do problema da personagem de Novak, impressiona. Assim como o fato do filme tomar um caminho totalmente surpreendente em sua metade final, seguindo para uma conclusão apoteótica”, destaca.   Marcelo Müller, crítico de cinema do site gaúcho “Papo de Cinema”, não esconde que ficou comovido com a presença de “Um Corpo que Cai” no topo.   “Não há dúvidas quanto às imensas qualidades do filme. Por sua vez, Cidadão Kane se instalou numa espécie de unanimidade infrutífera. Apontar o filme de Welles como o maior de todos, por suas inúmeras inovações narrativas, sem confrontá-lo com alguns de seus geniais pares, não leva a lugar algum”, alfineta.    Para Müller, a discussão fará bem a “Cidadão Kane”, provocando a sua revisão e rediscussão, no “lugar de ser apenas sacralizado, mesmo por quem não viu”. E pondera que o alvoroço da lista divulgada pela revista se deve mais à queda do antes incontestável filme de Welles que propriamente a nova posição alcançada por “Um Corpo que Cai”.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por