Dez anos sem Marlon Brando

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
01/07/2014 às 08:55.
Atualizado em 18/11/2021 às 03:12
 (United Artists)

(United Artists)

“Passei a vida inteira tentando não ser descuidado. Mulheres e crianças podem ser descuidadas; homens não”, exclama o capo Vito Corleone, um dos muitos personagens inesquecíveis da galeria de Marlon Brando. Mas o “conselho” ficou restrito à esfera da ficção. Na vida real, a personalidade destrutiva de um dos monstros sagrados do cinema mundial – cuja morte completa, nesta terça-feira (01), uma década – acabou levando-o a uma grande decadência física e psicológica: em seus últimos anos de vida, estava acima do peso e sem contato social. Quando morreu, em 1º de julho de 2004, de insuficiência respiratória, Brando recusava-se até mesmo a atender telefonemas, resumindo-se a ficar deitado no sofá, assistindo a comédias do cinema clássico.     Pouco servil   Mas nada que apagasse a sua atuação magnética em “Sindicato dos Ladrões” (1954), “O Poderoso Chefão” (1972) ou “O Último Tango em Paris” (1972). “Brando sabia bem como usar o estrelato, o que sua imagem representava e que o interessava à interpretação, sem se submeter às exigências dos ‘capi’ de Hollywood”, destaca o crítico de cinema Humberto Pereira da Silva.   Está nessa atitude pouco servil ao sistema a razão de o ator ter, de acordo com Humberto, aceitado papéis em produções que geram controvérsias. “Até então o cinema americano se orientava em dois princípios: o star system e o studio system”.     Divisor de águas   Brando surgiu no momento certo, quando diretores como Elia Kazan já buscavam sair das fórmulas da indústria. Foi ele quem o dirigiu em seu segundo filme, “Uma Rua Chamada Pecado” (1951), marcante pelo trabalho visceral do ator. “Ele está indissoluvelmente ligado a Kazan (ainda fizeram, juntos, ‘Sindicato de Ladrões’ e ‘Viva Zapata!’). Para que seus filmes tivessem a força que queria imprimir, Kazan precisava de um ator genial como Brando”, registra.   Para o crítico, a atuação de Brando em “Uma Rua Chamada Pecado”, na pele de um cunhado grosseiro, foi um divisor de águas. “De algum modo, a partir dele abre-se uma geração que inclui Montgomery Clift, James Dean e Paul Newman”.     Método   Ele frisa a importância do Actor’s Studio – escola seguidora do método do teórico russo Constantin Stanislavski – na formação de Brando. “Passa à história do cinema como o mais completo representante do método”. O método consistiria fundamentalmente, em levar o ator a construir o personagem a partir da caracterização física, “da expressividade do corpo e da plasticidade de movimento”. Em Vito Corleone e no Coronel Kurtz de “Apocalypse Now”, o crítico enxerga elementos como contenção e controle, entonações e pausas típicos de um homem da máfia e de um militar enlouquecido.    Por sinal, uma das poucas frases do mafioso que levou a termo em sua trajetória foi: “Quem lhe oferecer segurança será o traidor”. Conforto, definitivamente, não fazia parte do vocabulário de Brando.

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