Diretor Cao Guimarães ganha mostra na Holanda, a maior já realizada na Europa

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
11/08/2017 às 19:18.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:02
 (SAMUEL COSTA/ARQUIVO HD/27-2-2013)

(SAMUEL COSTA/ARQUIVO HD/27-2-2013)

A memória de Cao Guimarães não é como um daqueles HDs usados para armazenar filmes, falhando no momento de lembrar nomes de atores e títulos. “A única vantagem de ficar gagá é que você pode ver de novo grandes obras do cinema, depois de esquecer tudo, do nome à história”, diverte-se o diretor mineiro, em entrevista de Montevidéu pelo WhatsApp, um dos poucos apetrechos tecnológicos que ele aderiu.  “O ‘Whats’ é útil, mas nunca tive Facebook. Comecei no Instagram há três meses e estou adorando, por que você só posta imagens”, observa Cao. Escolhas que se refletem em seu percurso cinematográfico, a partir de filmes como “A Alma do Osso” e “Andarilho”, que têm em comum a busca pelo ordinário, extraindo poesia de pessoas que estão na contramão de um mundo cada vez mais veloz e plugado.  

A maior mostra dedicada ao trabalho de Cao Guimarães foi realizada em São Paulo, há quatro anos, no Itaú Cultural. Intitulada “Ver é uma Fábula”, ela teve a curadoria de Moacir dos Anjos e ocupou dois andares da sede

 Essa característica chamou a atenção do curador holandês Jaap Guldemond, responsável por montar a maior mostra de Cao na Europa, com início em 16 de setembro, num moderno museu dedicado ao cinema em Amsterdã, o Eye Filmmuseum. Ele não estará sozinho: Jaap criou um interessante diálogo das obras do mineiro com um dos diretores mais cults da atualidade, o tailandês Apichatpong Weerasethakul. “Conheci o Jaap na Bienal de Veneza, na Itália. Ele gosta muito do meu trabalho e convidou para essa mostra ao lado do Apichatpong. Segundo ele, há muitos pontos em comum. Além de trabalharmos com filmes e videoinstalação, a maneira de filmar é semelhante, mais direta, sem floreios, deixando que a realidade vibre mais forte. Dividimos também o apego às coisas simples, mostradas de forma expressiva”, salienta. 

A mostra também lançará um livro sobre o trabalho de Cao e Apichatpong. Quem assina a parte brasileira é Consuelo Lins

 Para os próximos dias, o diretor estabeleceu como meta rever os filmes de Apichatpong. “Gosto dos filmes dele. Vi basicamente os longas-metragens. Também uma instalação em algum museu, mas não me lembro do nome. Assisti ‘Mal dos Trópicos’ com legendas em francês, sem conseguir entender algumas coisas, já que meu francês é meio mau. Quero ver de novo, até para poder conversar com ele”. O encontro acontecerá na abertura da mostra, cuja programação também reserva, para os primeiros dias, debate sobre o filme “O Homem das Multidões”, o último trabalho de Cao exibido nos cinemas, codirigido por Marcelo Gomes, que também estará presente no bate-papo. Haverá ainda uma master class, quando abordará sua filmografia. Todos os longas de Cao serão exibidos, no formato DCP, além de nove videoinstalações. “A organização até me pediu cópias em 35mm, mas eu só as tenho de dois filmes, ‘O Andarilho’ e ‘O Fim do Sem Fim’. Estão na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, e não sei em que estado estão. Na última vez que exibimos uma cópia de ‘O Andarilho’, ela voltou e parou na Alfândega, onde está até hoje. Na época, cobraram R$ 1.500 em taxas e preferi deixar por lá”, assinala. DIVULGAÇÃO / N/ACartaz oficial da mostra holandesa Novo longa, “Espera” deverá ter primeira exibição na Holanda, no fim de novembro  Holanda deverá conhecer, em primeira mão, o novo longa de Cao Guimarães, intitulado “Espera”. O filme será apresentado como work in progress, no final de novembro, com a presença do diretor. “A ideia é falar justamente do momento de espera, fazendo esse diálogo com o passar do tempo, com aquilo que (o diretor russo) Andrei Tarkovsky chama de esculpir o tempo”, explica Cao. A espera no filme percorre desde fatos triviais, como alguém na fila ou no aguardo do trem, a aqueles que vivem a expectativa pelo fim do mundo ou pela cirurgia para mudança de sexo. “É a espera em seus mais variados graus, tudo o que você pode imaginar. Escolhemos dois ou três personagens principais, para que não ficasse uma coisa chata, como a própria espera é”, adianta o cineasta. Em Belo Horizonte, Cao Guimarães aproveitou a realização da ópera “Norma” no Palácio das Artes para filmar a espera nos bastidores, mostrando o momento anterior à entrada no palco. InsôniaHá ainda esperas dolorosas, que dizem respeito ao corpo. “Filmei uma garota que tem problema de insônia. Ela chega a ir em clínicas especializadas, à espera de um algo aparentemente simples como o sono”, registra. As buscas de Cao extrapolaram o território mineiro, chegando a Alto Paraíso de Goiás, onde estão instalados mais de 40 grupos místicos, filosóficos e religiosos, entre eles o Vale do Amanhecer.

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