Espetáculo convida o público a vivenciar o cotidiano da Guaicurus

Vanessa Perroni
vperroni@hojeemdia.com.br
04/11/2016 às 18:25.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:31
 (Cristiano Machado)

(Cristiano Machado)

Motivada pela curiosidade e as fantasias que permeiam o universo de um bordel, subi as escadas do antigo hotel Imperial Palace na rua Guaicurus, região central de BH. Só consegui essa façanha por causa do espetáculo teatral “Rua das Camélias”, que a companhia Vórtica estreia neste sábado (5) para o grande público, já que, nos mais de 20 hotéis da região destinados à prostituição, mulher só entra se for para trabalhar.

A cada passo pelos longos corredores escuros e quentes que abrigam quartos com camas de alvenaria, pouca infraestrutura e nenhuma privacidade, as imagens pré-concebidas da prostituição e as poucas certezas que tinha sobre o assunto se dissolviam e davam lugar a interrogações. 

Dirigida por Gabriela Luque, a peça nos convida a entrar nos quartos onde uma das sete personagens esperam os “clientes” para contar uma história. São 15 minutos e “seu tempo acabou!”. Algo raro, pois, como conta uma das personagens, “ganham dinheiro as mais caladas”.

As ações não acontecem apenas nos quartos. Os corredores também nos inserem na atmosfera de um bordel da Guaicurus. São momentos onde os personagens interagem entre um “programa” e outro. E conseguimos desenhar alguns arquétipos, embora a peça mostre que eles são muitos, e poderia ser eu ou você em algum momento. “Não tem característica fechada para elas. Tem mães e a menina branca de classe média, por exemplo. Provavelmente, o que você imagina que é uma prostituta não é”, comenta a atriz Marina Abelha, que integra o elenco ao lado de Ariádina Paulino, Edsel Duarte, Flávia Pacheco, Gabriel Zocrato, Istéfani Pontes e Regina Ganz. Cristiano Machado / N/A

O elenco passou quatro meses conversando com mulheres que trabalham em bordéis

Reflexão

O espetáculo não levanta bandeiras, apenas questionamentos. E faz isso sem soar panfletário. Com interpretações convincentes e texto limpo e direto, levanta também a questão do papel da mulher na sociedade. “Quando a mulher rompe com algum padrão ela é chamada de puta, vagabunda e outras coisas”, pontua Marina.

A ideia da peça surgiu de uma pesquisa para conhecer a identidade das mulheres que trabalham nesses hotéis e das vidas que estão submersas em preconceito. 

A recente ocupação cultural que vem acontecendo na região também levou o grupo a tentar compreender como é o diálogo entre as festividades para a classe média e as mulheres que ali trabalham. “Muitas delas falam que para elas não é bom que isso aconteça, pois o movimento cai”, conta a diretora Gabriela Luque. “Quem frequenta essas festas ignora que ali é um ambiente de prostituição. Não acho que não se deva fazer a festa, mas tem que ter consciência”, acrescenta. 

Para Gabriela, não havia como falar do lugar sem levar o público para vivenciar a rua marginalizada. Assim encontrou Hotel Imperial, que estava fechado há 10 anos, e agora serve de palco. 

Ao final do espetáculo ficam muitas interrogações, conflitos e a vontade de voltar para ouvir as outras histórias, pois em cada sessão é possível passar por três dos sete quartos.

Serviço: “Rua das Camélias”, Hotel Imperial Palace (rua Guaicurus, 436). Até 27/11. Sexta a domingo, às 20h. Por R$ 30 e R$ 15 (meia)

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