Eventos atraem turistas, mas não seduzem moradores da histórica Tiradentes

Clarissa Carvalhaes - Hoje em Dia
28/03/2015 às 09:25.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:25
 (Cid Costa / Divulgação)

(Cid Costa / Divulgação)

Em tempos de festival, encontrar um quarto dentre os 5 mil leitos disponíveis em Tiradentes ou conseguir reserva em um dos mais de 30 restaurantes não é tarefa das mais fáceis. Sinal de que os dez grandes eventos realizados a cada ano na cidade atraem cada vez mais turistas. Até hoje, porém, muitos moradores sentem-se “excluídos” dessa festa.   “Há pouca participação dos tiradentinos porque eles não sentem que os eventos são para a população. Ouvimos sempre de quem vive aqui que as atrações são para os visitantes”, justifica Mônica Cardoso Gomes, secretária Municipal de Turismo e Cultura.   O frenesi em torno da histórica Tiradentes – localizada na região Central do Estado e hoje com cerca de 7 mil habitantes – começou em 1998, com a chegada do que é hoje um dos mais importantes festivais do país, a Mostra de Cinema, tradicionalmente em janeiro.   Na esteira do sucesso desse encontro de atores, diretores, críticos, produtores e cinéfilos, vieram, por exemplo, os festivais de gastronomia e o de fotografia, realizado no último fim de semana.   A dona de casa Isadora Brandão, de 62 anos, faz parte do grupo de moradores que dificilmente participa da programação oferecida durante os festivais – por mais que os eventos sejam gratuitos, democráticos e variados. “Não fico à vontade nesses lugares. É uma realidade muito diferente, e também não entendo dessas coisas”, justifica.   Joaquim Silva, de 47 anos, explica que, na maior parte das vezes, as atrações estão distantes do cotidiano dele. “Faço queijo e doces desde menino. Gosto muito de ver gente passeando na cidade, mas não sinto necessidade de estar lá”.   Dona de uma pousada em Tiradentes, a empresária Alexia Hermanny lamenta que o sentimento de “dona” Isadora e “seu” Joaquim seja mais comum do que se possa supor. “Existem muitas formas de envolver a comunidade, mas as iniciativas são ainda tímidas. Para mudar, é preciso ocupar as escolas, atrair jovens e crianças”.   Pedro Pellegrini, de 14 anos, e André Duarte, de 16, dizem que a dificuldade de locomoção é o maior problema. “A falta de transporte dificulta o passeio”, resume André, morador do bairro Alto da Torre, afastado do centro histórico, sede dos festivais.   Prefeitura tenta estreitar diálogo com organizadores dos festivais   A secretária de Turismo e Cultura de Tiradentes, Mônica Cardoso Gomes, assegura que, nos últimos anos, vem tentando estreitar o diálogo com os organizadores dos festivais para garantir maior envolvimento da comunidade nos eventos.   “O objetivo é aproximar a proposta dos festivais com a identidade local a partir, por exemplo, do desenvolvimento de oficinas que tenham relação com a cultura local. Acredito que assim a comunidade vai se envolver mais”, comenta a secretária, que não soube precisar o quanto a cidade lucra com os festivais.   “Para resolver essa questão, há o projeto de reunir os organizadores para termos em mãos os números reais”, explica Mônica, que assumiu o cargo em setembro passado.   Idealizador do Festival de Fotografia que movimentou a cidade no último fim de semana, Eugênio Sávio lembra que, na edição de 2014, charretes de passeio turístico circularam estampando imagens de moradores.   “As pessoas se sentem importantes com ações como essa e a aproximação acontece de forma espontânea porque há identificação com a realidade delas”.   Neste ano, outra intervenção surtiu efeito positivo: o projeto Envelopa. Uma casa inteira foi “embalada” com fotos feitas por moradores, permitindo que a comunidade vivenciasse a fotografia. Iniciativa do fotógrafo Samuel Costa, do Hoje em Dia.   Identificar interesse dos nativos é fundamental   Coordenadora da Mostra de Tiradentes, o mais badalado festival da cidade, Raquel Hallack diz que o diálogo com a população local tem crescido com o tempo.   “O cinema é de fácil identificação. É gratuito e acontece na praça. As pessoas estão passando por ali e simplesmente param para ver. Tudo isso contribui”.   Para ela, o festival, pautado não apenas na exibição de filmes nacionais, mas também na formação e na reflexão sobre o cinema brasileiro, permite maior participação dos nativos.   “Nos preocupamos sempre em criar ações voltadas para a cidade e que de fato interessem à comunidade. Durante o cineminha para as crianças, por exemplo, o grande público é formado essencialmente por moradores”.   Diretor artístico do Artes Vertentes, festival internacional sobre música, teatro, cinema, dança e literatura, Gustavo Carvalho defende a valorização do patrimônio humano para garantir maior integração dos tiradentinos.   “De outra forma, a cidade é somente usada como cenário. Acreditamos que é necessário criar uma ponte com a realidade cultural do município”, pondera Carvalho.   Foco   Desde fevereiro de 2014, o Artes Vertentes, que este ano chegará à quarta edição, inclui na programação oficinas para as crianças da cidade e região.   “Ministradas por artistas que acreditam na importância desta ação educativa contínua, são realizadas duas vezes ao mês, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação e com o Museu da Liturgia”, diz o diretor.   Apesar de o evento só ocorrer em setembro, atualmente já estão sendo realizadas atividades em diversas áreas culturais. 

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