Exposição mostra a resistência dos pasquins nos anos de chumbo

Clarissa Carvalhaes - Hoje em Dia
21/05/2014 às 07:08.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:40
 (Orlando Brito/ Divulgação)

(Orlando Brito/ Divulgação)

Depois de atrair mais de 300 mil pessoas nas cidades pelas quais já passou – Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília – a exposição “Resistir é Preciso”, concebida pelo Instituto Vladimir Herzog, chega nesta quarta-feira (21) à capital mineira, podendo ser visitada até dia 28, no Centro Cultural Banco do Brasil, no Circuito Praça da Liberdade.


Para Ivo Herzog, engenheiro naval e diretor executivo do Instituto, filho do jornalista Vladimir Herzog, morto durante a ditadura, a imprensa alternativa, também conhecida como “nanica”, é o grande destaque na mostra que também acentua o componente cultural.


“O que pode ser visto é uma tentativa de recuperação ao máximo do papel dessa imprensa. É impressionante como a história de resistência dos pasquins é rica. São centenas de títulos à disposição. Em um ano no qual se recorda os 50 anos da ditadura, a mostra ganha ainda mais força e visibilidade”. A exposição, que tomou três anos de pesquisa, se apresenta como um livro que conta a história de tragédias, violência e resistência desde a instauração da ditadura, em 1964, até a eleição indireta de Tancredo Neves, em 1985.


Segundo Herzog, é preciso destacar que todos os trabalhos foram feitos numa época em que a própria palavra “liberdade” era censurada. “E não havia recurso tecnológico. Então, era preciso uma criatividade imensa para conseguir publicar sem ser pego pela censura”.


Estão expostas obras de arte, cartazes, fotografias, depoimentos em vídeos e uma linha do tempo que percorre períodos no qual muitos intelectuais, artistas, sindicatos, estudantes e diversos setores da sociedade civil lutaram pelo restabelecimento da democracia no país.


Integra a exposição, ainda, a coleção do jornalista e ex-preso político Alípio Freire. Nela, estão reunidas obras de artistas plásticos como Sérgio Freire, Flávio Império, Sérgio Ferro e Takaoka, produzidas no período de cárcere do presídio Tiradentes, em São Paulo.


A mostra também abarca criações de Rubem Grilo, ilustrador de publicações como “Movimento”, “Opinião” e “Pasquim”, todas da década de 1970.


Imagens feitas pelos fotojornalistas Luis Humberto e Orlando Brito fazem parte do acervo da exposição, com fotografias que expressam o cotidiano político do país durante a ditadura, integrando uma importante parte dos registros históricos. Muitas dessas fotos foram censuradas e só mais tarde tornaram-se conhecidas.


“Há ainda um vasto material disponível no site, que traz entrevistas com 60 jornalistas discorrendo sobre como viveram aquele momento e o que ele de fato representa”, explica Ivo.


Aos 47 anos, Ivo Herzog celebra o sucesso da iniciativa, mas diz que ainda precisa correr atrás de patrocínio para a digitalização e microfilmagem do acervo. “Conseguimos preservar, até agora, cerca de 48 mil páginas, mas ainda restam 200 mil”, estima. E sobre o tal jornalismo de resistência, Ivo não consegue encontrar algo que se compare ao que era feito nos anos passados. “Hoje, vejo blogs editoriais, mas aquele jornalismo de investigação já não existe mais”, lamenta.


"É bom que jamais nos esqueçamos do horror e da luta"


Entre os curadores da exposição “Resistir é preciso”, em cartaz a partir desta quarta-feira (21) no CCBB, está José Luiz Del Roio – um dos fundadores, ao lado de Carlos Marighella (1911–1969), da Ação Libertadora Nacional (ALN): organização que participou da luta armada contra a ditadura militar no Brasil.


Bem antes, entretanto, o ativista político filiou-se, aos 17 anos, ao Partido Comunista Brasileiro (PCB). Com sua saída, assumiu a retirada de importantes documentos e acervos ainda do século 19 – jornais, livros e revistas.


“Era um conteúdo de protesto do movimento operário brasileiro”, recorda Roio – também autor do livro “As Capas desta História”. O que traz para Belo Horizonte é, de igual maneira, um importante retrospecto da história que também ajudou a resgatar.


“Essa exposição conta com cerca de dois mil títulos de jornais, e mais de 100 deles são do exterior. Além disso, a mostra traz obras de arte que têm grande valor – seja sentimental seja de mercado. Trabalhos que imprimem o modo de pensar e sentir dos artistas naquele momento”, explica.


Del Roio, que passou a infância em São Paulo, carrega hoje um sotaque estrangeiro – “por muitos anos, precisei viver na Itália”, justifica.


De volta ao Brasil para a mostra, ele comemora o sucesso da exposição que vem atraindo principalmente grupos escolares. “É bom que jamais nos esqueçamos do horror e da luta contra a censura”.
 

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