Fé e resistência marcam os 10 anos do Festejo do Reinado em Ouro Preto

Lucas Buzatti
03/01/2019 às 07:00.
Atualizado em 05/09/2021 às 15:50
 (Ane Souz/Divulgação)

(Ane Souz/Divulgação)

“A Fé que Canta e Dança”. Este é o nome da edição comemorativa de dez anos da Festa do Reinado de Nossa Senhora do Rosário e de Santa Ifigênia em Ouro Preto. O tradicional festejo popular, que reúne grupos de congados, guardas de moçambique e marujadas, comemora uma década de revitalização na cidade histórica, com programação volumosa que começa neste domingo (6) e vai até o dia 13 de janeiro. 

Além dos cortejos e missas em devoção a Nossa Senhora do Rosário, Santa Ifigênia e São Benedito, os festejos incluem oficinas e palestras sobre a fé e a resistência do povo negro brasileiro. Ao todo, participam cerca de 30 grupos de vários estados do país, além de irmandade locais. 

Presidente da Associação dos Amigos do Reinado (Amirei), Kátia Silvério ressalta a importância de celebrar a retomada do encontro em Ouro Preto. “A festa tem mais de 300 anos, mas com o passar do tempo ela acabou se perdendo. Esse resgate acontece desde 2008, com a revitalização dos congos, moçambiques e marujadas”, explica, pontuando que a revitalização partiu da Amirei em parceria com o Fórum de Igualdade Racial e os grupos locais. 

Primeira mulher no cargo de capitã da Guarda de Congo Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia, Silvério sublinha que o festejo reafirma a luta pelo respeito às culturas e manifestações religiosas afro-brasileiras. “É o momento de celebrar nossa resistência e resiliência, que mantiveram a cultura viva. Somos congadeiros, vivemos isso no dia a dia, e manter a tradição exige muita garra e vontade, ainda mais nestes tempos”, pontua, lembrando que a tradição do congado é passada às novas gerações por herança familiar. 

Capitão da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia, Kedison Guimarães faz coro. “A festa simboliza a renovação da fé e da esperança do negro. Passamos por tudo, desde a escravidão, mantendo firme a fé na Nossa Senhora do Rosário”, afirma, lembrando a reverência da santa católica pelo povo negro. “É a santa que nos escolheu e que nos amparou durante o momento em que mais precisamos, que foi a escravidão”, completa.

Guimarães explica as diferenças entre os três grupos que integram o Reinado. “O congado é um grupo mais alegre, que dança e abre caminhos para Nossa Senhora do Rosário passar. Já a marujada representa o mar, os escravos que foram capturados e vieram como marujos nos navios negreiros”, afirma. “Já o moçambique simboliza os negros mais velhos, acorrentados. Por isso, eles dançam com a gunga, aquelas latinhas nos pés, que hoje representam a liberdade. A marujada vem ao final, com cantigas mais chorosas, de lamento”, diz.

Chico Rei

Os festejos do Reinado também celebram a ancestralidade de Chico Rei, figura de extrema importância para a cultura negra em Ouro Preto, conta Kedison Guimarães. Nascido Galanga, no Reino do Congo, Chico Rei era um monarca africano que foi raptado por traficantes de escravos portugueses e trazido para a então Vila Rica, em 1740. 

Na cidade, trabalhando como escravo, conseguiu comprar sua alforria e a de seu filho. Aos poucos, foi comprando a liberdade de outros conterrâneos, sendo por isso chamado de “rei”. Sua irmandade, criada em honra a Santa Efigênia, teria sido a primeira de negros livres em Vila Rica. “Na festa, resgatamos a memória de Chico Rei, nosso grande ancestral”, finaliza Guimarães. Editoria de Arte

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