Gigaton é a energia necessária para esses dias de agonia

Marcelo Jabulas
@mjabulas
01/04/2020 às 11:26.
Atualizado em 27/10/2021 às 03:09
 (Danny Clinch)

(Danny Clinch)

Já percebeu como uma música pode ativar gatilhos da nossa memória e resgatar passagens de nossas vidas que andavam adormecidas? Uma trilha de novela, uma canção que você ouvia enquanto estava trancado no quarto estudando, na fossa ou aos beijos intermináveis. Músicas são como perfumes, ativam nosso pensamento. E certamente Eddie Vedder, Stone Gossard, Mike McCready, Jeff Ament, Matt Cameron e Boom Gaspar nunca pensaram que as faixas de “Gigaton” poderiam ativar as lembranças de um dos momentos mais insólitos da humanidade.

Foi em meio ao caos da pandemia que o Pearl Jam lançou novo álbum. “Gigaton” é o décimo trabalho de estúdio da banda de Seattle, e marca os 30 anos de estrada da turma. Trata-se de um trabalho que deixa bem clara a maturidade de Vedder e seus companheiros. 

E antes que alguém pergunte: é muito difícil que “Gigaton” supere “Ten”. Afinal, o primeiro disco da banda é como uma maldição. De tão perfeito, todos os demais ficam menores. Mas, “Gigaton” supera de longe “Lightning Bolt” (2013) e “Backspacer” (2009).

É um disco que chega num momento conturbado para a vida na Terra, assim como para o mercado fonográfico, que há muito deixou de vender CD’s. E para se ajustar ao novo mundo da música o Pearl Jam fez uma campanha de lançamento interativa, com imagens espalhadas por diversos países, inclusive uma colocada num canto do bairro Morumbi, em São Paulo. 

No dia do lançamento, a banda fez um chat global, onde pessoas de todo mundo ouviram o disco e trocaram mensagens, como nas antigas salas de bate-papo do início do milênio. Algo emblemático, pois foi uma forma de unir pessoas confinadas em casa para curtir e comentar sobre o disco. Realmente insólito e surreal, como esses dias de pandemia que vivemos.

Quando o Pearl Jam divulgou “Dance of the Clairvoyants”, a faixa chegou a gerar estranheza, pelo uso de sintetizadores e um ritmo que flertava com o New Wave pré-Grunge dos anos 1980. Muita gente chegou a acreditar que a banda viveria sua crise de meia idade, como visto em “Pop”, do U2.

No entanto, o álbum mostra uma combinação de elementos como uso dos sintetizadores, muitos teclados, que de certa forma congratulam a grande participação de Boom Gaspar, até hoje visto como um contratado, como ocorre com Darryl Jones, nos Stones.

Uma das faixas mais vigorosas de “Gigaton” é “Quick Escape”, um rock cru, com o característico solo de McCready. Por outro lado, “Alright” deixa clara a pegada folk - que Vedder executa em sua carreira solo - no melhor estilo do excelente “Into de Wild”. 

Já “Seven O’Clock” mostra um lado progressivo do sexteto, talvez influenciado pelas incontáveis vezes que o Pearl Jam tocou “Comfortably Numb”, do Pink Floyd. Não vou me arrastar por todas as 12 faixas do álbum. Mas recomendo que você escute, mesmo que não seja seu estilo ou banda favorita. 

Mas saiba que o Pearl Jam é grunge, ativista e irritado. Uma banda que usa suas músicas para atacar políticos, como Donald Trump, gravadoras, produtoras de shows, e defender minorias. Uma banda que doa cachê para as vítimas de Mariana e alerta sobre para onde estamos levando o planeta. Mesmo que, ao que tudo indica, hoje seja o planeta a nos levar para o desconhecido. 

Assim, daqui alguns anos, vamos ouvir qualquer faixa desse disco e lembrar de um dos momentos mais doloridos, surpreendentes ou reveladores de nossas vidas. Que bom que é o Pearl Jam.

  

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