Internet é berço de expressões que são logo incorporadas ao vocabulário

Paulo Henrique Silva
06/05/2019 às 09:37.
Atualizado em 05/09/2021 às 18:31
 (Editoria de Arte)

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BFF, flodar, crush, TBT, stalkear, shipar, hater, nude, fail, trollar. São tantos os termos (alguns nem tão novos assim) que aparecem numa simples troca de mensagens nas redes sociais que, para quem não está integrado ao universo virtual, seria preciso recorrer a um dicionário de “internetês”. Boa parte deles é uma corruptela de palavras inglesas que ganharam novos significados. 

Antes, porém, de se assustar com a quantidade de vocábulos nascidos em berço tecnológico e condenar os criadores do Facebook, do Twitter e do Instagram, é bom que se diga que esses “assaltos” ao português são bastante comuns em nossa história, tornando-se mais evidentes de acordo com a língua de maior influência. E, hoje, sem dúvida, o nosso maior guia é a internet.

É o que a poetisa e linguista Ana Elisa Ribeiro chama de “empréstimo”, um processo bastante natural da língua – e não somente da nossa. “As línguas se interinfluenciam, não vivem isoladas umas das outras”, afirma. Ela observa que esses novos vocábulos tanto podem se limitar a um modismo, desaparecendo logo em seguida, como serem incorporados – e, bem acomodados, acabamos esquecendo as próprias origens.

Foi com os chats que surgiu a mania de abreviar e modificar palavras, devido à falta de acentuação do programa

​ “Abajur, por exemplo. Ele vem do francês abat-jour, que significa filtrar a luz. O francês esteve muito na moda por aqui no fim do século 19 e começo do 20. Era chique, o que gerou muita importação. No português também tem muita palavra formada do árabe, pelo menos todas aquelas iniciadas com Al, como alface”, analisa a poetisa.

Uma característica do “internetês” é a velocidade com que invade o vocabulário, impulsionado por um mundo cada vez mais conectado. “Vivemos uma realidade globalizada, com as pessoas entrando em contato mais cedo com o inglês e com a tecnologia virtual, em que a terminologia é baseada na língua inglesa”, observa Lucas Mariano, que defenderá tese de mestrado sobre as narrativas publicadas em meios digitais.

Ele se debruçou principalmente sobre as comunidades de fanfics – histórias criadas por fãs que se apropriam de personagens e enredos já conhecidos. “É algo tão forte que acabaram por atualizar a expressão fic, de ficção. Agora serve para nomear algo que não é verdadeiro. Você vê muitos perguntarem se é uma história fic, no sentido de ser falsa”, explica.

Digital ao analógico
Jogos on-line também são uma grande fonte de estrangeirismos. Mariano cita o termo GGWP, abreviação da frase inglesa good game, well played (bom jogo, bem jogado). “Quando você perde a partida, é uma forma de elogiar o adversário. O termo acabou extrapolando o meio e hoje é bastante usado em hashtags no Twitter”, comenta.

“Como todo mundo tem celular e está conectado à internet, a propagação é muito mais ágil. Hoje você usar googlar para pesquisar e, por causa dos jogos on-line, startar para começar”

Da mesma maneira que esses termos inundam nosso cotidiano, eles também desaparecem. “Ficam mais em ambientes restritos e não são acessíveis a um grande número de pessoas. Mas se conseguem passar do digital para o analógico, se podemos dizer assim, acabam permanecendo na linguagem”, destaca Mariano.

Um exemplo bem-sucedido, citado por ele, é stalkear. Originário do inglês “to stalk” (perseguir), o termo virou, principalmente no Facebook, sinônimo de interesse exacerbado na vida de alguém. “A palavra foi apropriada por muitas pessoas e tem uma vida útil maior”.

Há também situações que podem parecer um exagero, como a criação de um gênero digital chamado GTS. “São histórias narradas em linguagem de programação, como terminações de programas. Para destacar um momento que acontece ou um sentimento, por exemplo, usa-se field.png, embora não haja nenhuma foto (anexada)”, assinala Mariano.

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