Parceiro do Grupo Galpão tem sua obra lançada em livro

Miguel Anunciação - Do Hoje em Dia
16/07/2012 às 11:43.
Atualizado em 21/11/2021 às 23:35
 (Elias Gomes/Divulgação)

(Elias Gomes/Divulgação)

É por razões óbvias que Luís Alberto de Abreu é tido o "mais constante parceiro" do Galpão. Desde que assumiu a coordenação do primeiro núcleo de dramaturgia oferecido pelo Galpão Cine Horto, em 1999, o dramaturgo paulista já esteve envolvido em dois espetáculos do grupo ("Um Trem Chamado Desejo" e "Till, a Saga de um Herói Torto"), em seis Oficinões e se junta ao núcleo de pesquisa em dramaturgia que mantém inscrições até 7 de agosto.

Reúne Grace Passô, Jô Bilac, Márcio Abreu, Newton Moreno e Roberto Alvim. Feras.

Abreu é fera também. Há quem o eleja o mais interessante dramaturgo brasileiro, profissional que transita bem pelo teatro, cinema e TV. Das mais de 60 peças que ele escreveu, a dramaturga e pesquisadora Adélia Nicolete foi convidada a escolher as 14 melhores – além de artigos, trechos de dissertações, teses e um panorama da crítica sobre seu trabalho. O extenso material foi juntado num só volume, pela Editora Perspectiva, o que trouxe Abreu a Belo Horizonte, de novo, para lançá-lo.

O lançamento aconteceu no Cine Horto, no último dia 7, enquanto a Cia de Teatro da Cidade, de São José dos Campos (SP), exibia "Um Dia Ouvi a Lua", texto de Abreu. Aqui, ele falou do entusiasmo de vir trabalhando o cinema de animação, num grupo reduzido de amigos; do desapontamento com o teatro, que condiciona ter lei de incentivo para criar; do "grande parceiro" que teria encontrado em Luiz Fernando Carvalho; e dos projetos que mantém no teatro com Maria Thais e João das Neves. Com este, sonha adaptar "Anna Karenina", de Tolstoi. Abaixo, Abreu responde perguntas por e-mail.

Você está seguro que é possível aprender a escrever dramaturgia ou apenas burilar uma qualidade já inata?

Em qualquer área do conhecimento é possível aprender técnicas. Já a utilização e a organização criativas dessas ferramentas creio que são pessoais. Tanto técnica quando criatividade são fundamentais na dramaturgia. As técnicas se aprendem, a criatividade cada um desenvolve pessoalmente.

Que autor ou texto não dramático mereceria uma adaptação que nunca foi realizada?

É difícil saber, já que o teatro contemporâneo tem aproveitado muitos textos não dramáticos, principalmente da literatura, em suas encenações. Gostaria de ver mais textos poéticos encenados em teatro. "A Divina Comédia" de Dante, pelo menos o "Inferno", seria um grande desafio, mas também gostaria de ver o poema "O Cavaleiro de Bronze", de Pushkin.

Você estaria propenso a achar que existe uma nova dramaturgia nacional ou apenas novos dramaturgos propondo soluções isoladamente?

Creio que será cada vez mais difícil definir o que seria uma dramaturgia nacional. Pelo menos como a expressão era considerada no século XX: alguns fundamentos, conceitos e valores que representariam o pensamento nacional. Hoje, os caminhos, procedimentos e temas tornaram-se muito amplos e universais, o que é muito positivo.

O que lhe parece definitivamente impossível de levar ao palco, mas lhe provocaria muita vontade de levar?

O prazer que nos proporcionam os grandes épicos. "Guerra e Paz", "Cem Anos de Solidão", "Grande Sertão: Veredas" e outras obras da mesma estatura me parecem impossíveis adaptar para a cena. Sempre serão meras aproximações. A grandeza do épico não cabe no palco, da mesma forma que a intensidade e a magia do ator no palco não é possível transferir para a literatura.

Você considera algum texto dramatúrgico perfeito, irretocável?

Muitos: "Édipo" (Sófocles), "Macbeth" (Shakespeare), "Casa de Bonecas" (Ibsen), "Sumidagawa" (Motomassa), "Mãe Coragem" (Brecht), "Esperando Godot" (Beckett), "Perseguição e Assassinato de Jean Paul Marat" (Peter Weiss) e alguns outros. São perfeitos em seus propósitos. Não me atreveria a mexer neles, não vejo necessidade.

A dramaturgia nacional deveria se debruçar mais sobre a cultura nacional ou isso é uma decisão de foro íntimo do dramaturgo?

Não sei definir o que seria uma dramaturgia nacional, mas se debruçar sobre a cultura nacional, sobre seus aspectos universais, me parece uma necessidade. A língua, a cultura e a história são ferramentas imprescindíveis para estabelecer comunicação com o público. Claro que a decisão é de foro íntimo, mas é uma temeridade abrir mão de uma cultura rica como a nossa.

Qual o pior legado da dramaturgia que destaca a trajetória do herói guerreiro?

É reduzir o mundo à visão dos valores do herói guerreiro. Nesta visão unilateral não cabem heróis e heroínas compassivos, amorosos, sábios, que fazem da renovação e da esperança o motivo de suas trajetórias. O herói guerreiro nos deu uma grande literatura dramática, mas existem outros tipos de heróis e heroínas que devem subir ao imaginário humano.

Você considera que Shakespeare realmente escreveu toda a obra atribuída a ele ou teria acolhido contribuições de parceiros?

É provável que Shakespeare tenha acolhido contribuições de parceiros. Isso era comum no processo de criação onde a obra era feita sempre em diálogo com outras obras e autores mortos e vivos.

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