Livrarias de rua de BH se unem para enfrentar a concorrência da venda pela internet

Pedro Artur - Hoje em Dia
07/12/2013 às 09:37.
Atualizado em 20/11/2021 às 14:38
 (Lucas Prates)

(Lucas Prates)

Na fé absoluta nas mudanças que seriam implementadas pela tal Geração Y, um mantra constantemente repetido apontava o que seria uma aposta certeira: a venda de livros na internet constituía-se uma ameaça às livrarias físicas, principalmente as ditas “pequenas” (sem demérito). De fato, no Brasil, não foram poucas as que sucumbiram à concorrência – um exemplo, a Letras & Expressões, em Ipanema, que chegou a ter, como frequentadores, nomes como os do escritor João Ubaldo Ribeiro. Mas são os bastiões de resistência que comprovam a força das livrarias tradicionais – inclusive na capital mineira.   Se na Inglaterra mais de mil estabelecimentos independentes dedicados à comercialização de livros estão em plena campanha (“Books are My Bag”) por sua sobrevivência face à concorrência pesada das grandes redes e da internet, em Belo Horizonte há a Associação de Livrarias de Rua de Belo Horizonte, que reúne espaços já familiares ao público leitor da cidade, como a Scriptum, Mineiriana, Quixote, Ouvidor e Floriano.   A maioria dos estabelecimentos acima citados localiza-se na Savassi – alguns, inclusive, na mesma rua, a Fernandes Tourinho. Que, especialmente aos sábados, tem suas livrarias cheias, por se tratar também de um espaço de convivência, com um “plus”: as sessões de autógrafos. Caso de “Memórias dos ‘abitantes’ de Paris”, de David Paiva, que acontece no próximo sábado, 14, na Quixote – na via citada, número 274.   A casa aposta no tripé atendimento, literatura de qualidade e espaço de convivência para atrair _ e fidelizar – o leitor (consumidor). “Temos livreiros qualificados para o atendimento e um espaço de convivência, com café e livraria. Trabalhamos nas áreas humanas, ciências sociais, história, filosofia... Outro ponto forte é a literatura infantojuvenil, segundo maior segmento de vendas, atrás da literatura (romances, contos). Meu foco não é o best-seller”, afirma o proprietário Alencar Perdigão, que ajudou a criar a associação numa tentativa de sinalizar às pessoas a importância desses espaços para a cidade.    Luta desigual   Para Welbert Belfort, da Scriptum (Fernandes Tourinho, 99), a saída é, por ora, trabalhar com segmento literário. “Nosso interesse é por segmentos mais especializados. Exemplo: temos livros sobre psicanálise que ninguém tem, e não somente daqui (BH), mas do Brasil. Faço vendas, mesmo sem site, para cidades como Salvador, Recife, Goiânia...”, enumera.    Nessa queda de braço entre lojas físicas X virtuais, a Mineiriana (rua Paraíba, 1.419) ficou com a primeira. Ela “fechou” a venda virtual, que funcionou por quase um ano. “Não dava lucro”, alega o funcionário Thiago Natali, para quem a concorrência no mercado é extremamente desigual. “Você pega uma rede como a Cultura, de São Paulo, que desde 1995 trabalha com o virtual. Ela tem maior volume de venda”, ressalta o vendedor de 35 anos, 11 deles dedicados ao ramo de livros.   Belfort destaca outro aspecto. “As grandes editoras têm um sistema com os grandes sites com o qual é impossível concorrer, por causa dos descontos (aos consumidores), que não chegam às livrarias. Fora quando a editora, em seu próprio site, oferece descontos que não são repassados às pequenas livrarias”.    Capital mineira ganha Asa de Papel   É justamente no atendimento personalizado que parece residir o segredo da longevidade das pequenas livrarias. A escritora Cristina Agostinho, por exemplo, é uma das que não perdem a chance de entrar numa. “Para quem realmente gosta de livro, não há outro espaço que não seja a livraria. Você chega, entra e olha a estante. Retira o livro, folheia. É completamente diferente de estar em casa, diante do computador, e entrar no site para procurar um título. E, para mim, que tenho contato com livros desde criança, é importante até sentir a textura, o cheiro”, argumenta a escritora, que, durante a entrevista, se encontrava na Quixote, na Savassi.    Ela acredita na sobrevivência do livro impresso, embora diga que a tendência da nova geração é mesmo optar pela leitura online. Para o público que não aceita o fim do livro “físico”, Cristina Agostinho avisa que, em fevereiro do ano que vem, vai lançar, pela Quixote, o livro “Alfonsina e o Mar”, biografia da poeta argentina (nascida na Suíça) Alfonsina Storni, do início do século passado (1892– 1938), parte de uma coleção sobre autoras latino-americanas.   E surfando nessa “onda” das livrarias tradicionais está o experiente livreiro Álvaro Gentil. Ele acaba de inaugurar a livraria Asa de Papel – lá, ainda é possível perceber o cheiro de tinta no ar. O espaço “pega emprestado” o nome da editora, que, na realidade, foi o que deu vida a tudo. É um novo espaço dedicado às letras, localizado na Rua Piauí, 631, entre as avenidas Brasil e Francisco Sales, na área hospitalar, onde o leitor também pode desfrutar do Café Book (Rua Padre Rolim, 616), entre outros espaços charmosos.    Acolhimento   Mineiro de Ituiutaba, Álvaro explica que uma boa livraria vai além de uma caixa registradora. É fundamental, por exemplo, oferecer um espaço confortável – até mesmo intimista. “A proposta é disponibilizar a boa literatura em um ambiente aconchegante, de preferência tendo, ao fundo, música de qualidade. Um ambiente no qual a pessoa se sinta acolhida por bons livros e bons CDs”, destaca.   Leitura fecha virtual e investe pesado nas lojas   A venda virtual de livros pode ainda decolar no Brasil. Não agora ou pelos próximos anos. Pelo menos para uma das maiores redes de livrarias do país, que, após a entrada na web, decidiu se retirar do meio, para voltar a investir pesado nos postos tradicionais de venda, aqueles de antanho.    A Leitura fechou em abril sua livraria virtual, que vinha funcionando por quase 13 anos. E o motivo é um só: a procura foi tão baixa que não houve lucro. Pelo contrário. Deu prejuízo.   “Nesses 13anos na web, a gente não teve lucro em nenhum ano; nenhum resultado positivo. Só prejuízo”, afirma Marcus Teles, sócio-diretor da Leitura.    “O problema é que se vende na internet com prejuízo”, ressalta o empresário, alertando sobre o prejuízo em outros setores virtuais, que teria atingido desde a venda de calçados a equipamentos eletrônicos”. “A (rede) Carrefour também fechou a loja virtual”, exemplifica.   Para Marcus, há ainda um caminho a percorrer até que as lojas virtuais, no caso, as livrarias, consigam se impor no mercado. “Passados 15 anos, o livro virtual ainda não tem a maior fatia do mercado. O principal mercado continua sendo o livro impresso, com 97%”, destaca.    Livraria de cimento   Assim, a Leitura volta suas baterias para as livrarias tradicionais. A empresa começou 2013 com 35 pontos e fecha com 43 lojas. Em 2014, serão mais oito no país. “Vamos terminar 2014 com presença em 13 estados, mais Distrito Federal. A Leitura é líder em Minas, no Centro-Oeste, no Maranhão, Alagoas e Paraíba”.   Na avaliação de Telles, a hegemonia do papel sobre o digital vai perdurar. Pelo menos por uma década. “Acho que vai ocupar um espaço a livraria virtual com o tablet e e-Book. Mas, pelos próximos dez anos, o livro impresso ainda será o principal meio de circulação no país”, prevê.   Café com Letras e Floriano Livraria   Evidentemente, e para felicidade geral da cidade, não há como listar, aqui, todos as livrarias de BH. A música também norteia o Café com Letras (rua Antônio de Albuquerque, 781), enquanto que a Floriano (av. Cônsul Antonio Cadar, 147, São Bento) vale também como um dos espaços interessantes que a capital mineira ganhou nos últimos anos.

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