Livro mostra conexões entre telas e poemas

Patrícia Cassese - Hoje em Dia
16/04/2015 às 07:43.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:40
 (Partners)

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Foi encanto à primeira vista: “Assim que recebi a foto de uma pintura inédita do Fernando Pacheco, chamada ‘Conexões Bilaterais’”, conta Lucas Guimaraens, que, instigado, escreveu um poema, batizado com o mesmo nome da tela. Nascia, ali, o embrião do livro “33,333 – Conexões Bilaterais”, que será lançado nesta quinta (16), às 19h, no Café com Letras do Centro Cultural Banco do Brasil. A obra une as pinturas de Pacheco aos poemas de Lucas.   “Logo que voltou a Belo Horizonte (de Saquarema, cidade localizada na Região dos Lagos, Rio, onde mantém um atelier), Fernando me chamou para uma noite em sua casa, regada a vinhos e boas amizades”, rememora Lucas. E foi ali que o projeto começou a ganhar corpo. “Fernando não somente é um grande artista plástico, mas um habitante das ideias e palavras, coisa rara nos dias de hoje. Assim chegamos ao ‘33,333’: conversávamos sobre as interligações inusitadas que poderiam vir de nossas obras e seus desdobramentos: 1,2, 3: eu, Fernando e o leitor/fruidor do livro”.   Pacheco, de imediato (“e em uma tacada de mestre”), remeteu à dízima periódica. “Um leitor/fruidor, dois leitores/fruidores, infinitos olhares, infinitas interpretações, uma ‘obra aberta’, como bem preconizou Umberto Eco”, conta Lucas. A partir desse momento, veio o norte: 33 desenhos-pinturas ou pinturas e 33 poemas, todos em conexões bilaterais.   Mesmo com as especificidades do projeto em questão, para Lucas, trata-se, sim, de um trabalho a quatro mãos. "Não porque foram (os trabalhos de cada um) produzidos em conjunto ou sobre um tema em específico. Mas porque as conexões nele presentes transformaram, alquimicamente, o livro em uma obra a quatro mãos". Sobre Fernando Pacheco, ele diz que o artista despontou em seu caminho como uma tempestade, como é sua obra. "m meio ao mundo das produções culturais, fui apresentado ao homem – cuja obra eu já conhecia e admirava – pelas mãos de Murilo Antunes, poeta e letrista do Clube da Esquina. Desde então, já não mais nos desgarramos".   No caso de seus poemas, o fio condutor, lembra, é a própria vida. "Como há de ser. A sensação de absurdo e desassossego de um lado e, de outro, a certeza de que as relações humanas, esses fios invisíveis existentes entre as pessoas, são mais reais do que a própria realidade". Para o livro, Lucas diz ter mergulhado, mais uma vez e com mais intensidade, na linguagem surrealista ("um neo-surrealismo talvez"), atrelando a contemporaneidade da literatura marginal e beat. Instado a escolher, a seu bel prazer, um poema entre os 33 garimpados, Lucas aponta sua mira para "Que?" (leia, ao final). "São versos reflexivos e auto-reflexivos. Se, de um lado, reflito o mundo em desmoronamento, de outro também remeto ao desmoronamento do próprio homem, das ruínas do 'eu'. O binômio abstração/concretude permite a leitura em múltiplas interpretações e, ao mesmo tempo, tem seu fio condutor pautado pela indignação de qualquer homem em qualquer cidade, em qualquer mundo possível. A incerteza não é mais no futuro, é no próprio pressente. Este poema foi, então, escrito a partir de perguntas nunca respondidas, posto que as mesmas encontram-se arraigadas no homem desde que o mundo é mundo".   Sobre o autor
Lucas Guimaraens é mineiro de Belo Horizonte, 35 anos. Vindo de uma família de poetas, contistas e romancistas, dentre eles, Bernardo Guimarães, Alphonsus de Guimaraens, João Alphonsus, Alphonsus de Guimaraens Filho e Afonso Henriques Neto, esteve, sempre, rodeado pela literatura em sua casa: de Drummond a Ana Cristina César, de Rimbaud a Jacques Prévert, a poesia, cedo, se apresentou a ele.   Bacharel em Direito, morou anos na França, onde desenvolveu seu mestrado em filosofia pela Universidade Paris 8. Trabalhou, também, como intérprete, tradutor e parecerista no CCFD (Comitê contra a Fome e pelo Desenvolvimento sustentável), órgão criado pela ONU.   De volta ao Brasil, tornou-se embaixador do Cercle Universel des Ambassadeurs de la Paix (ONU/UNESCO) e desenvolve acordos internacionais na área de cultura e educação. Publicou poemas em diversas antologias, periódicos e revistas no Brasil e no exterior (dentre as quais, a Revista Poesia Sempre, da Fundação Biblioteca Nacional, a Revista da Academia Mineira de Letras, a revista Espanhola En Sentido Figurado e a francesa Caravelles). Lançou, em 2011, o livro "Onde (poeira pixel poesia)", pela editora carioca 7Letras. "Até o final do ano passado, desenvolvi diversos projetos culturais através da empresa que criei, a Villa Cultura. Agora, fui instigado – porque só trabalho se houver desafios e se houver possibilidade de inovar – para assumir a Superintendência de Bibliotecas Públicas e o Suplemento Literário de Minas Gerais. Caminhos tortuosos, certamente. Como todos são. Mas libertadores em um mundo carente de conhecimento efetivo e que ultrapassa as informações – comumente sem lastro – das mídias virtuais". Lucas ressalva que continua, sim, atrelado à Unesco e ao conceito de transculturalidade desenvolvido pelo filósofo e catedrático da Unesco em Filosofia das Instituições e Multiculturalismo, Jacques Poulain. "Considero que este conceito tem muito a agregar em todas as esferas da cultura e das relações societais. Contaminar-se pelo outro para suprir suas próprias lacunas". Não bastasse, lançou também, há poucos meses, em Paris, “Michel Foucault et La Dignité Humaine (Editora L'Harmattan). Trata-se de um livro de filosofia ligado aos direitos humanos.   “Que?”: que tocha de aldebarã brilha sobre dias cinzas? que proa de barco afogado repensa trilhos das águas?
que estrelas de cais entornam mistérios na tela
do computador ou na tatuagem alada do homem caído? que liberdade que cidade pensada que poema que cinema que pintura? que pele que escama que couro que casco? pássaros sibilam notas de desarvorado
poeiras choram nas cerdas da vassoura
nascentes retomam correntezas de escuros caminhos de pedra e barro
manhãs têm olhos vidrados de pérola pixel e espasmo crianças nomeiam nuvens
palavras aparam a grama do jardim da casa
livros incendeiam lareiras de inverno
cosmopolitas leem à luz de bytes. serpentes de mil dentes ancora presas na nuca do não.
que castelos erguemos na palma da paz?   “Conexões Bilaterais” – Lançamento nesta quinta, às 19h, no Café com Letras CCBB (Praça da Liberdade).

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