‘Matamos os rios. É preciso fazer algo agora’, afirma Sebastião Salgado

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
03/03/2015 às 08:40.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:12
 (Ricardo Beliel/Divulgação)

(Ricardo Beliel/Divulgação)

A crise hídrica não é novidade para Sebastião Salgado, que há anos luta para alavancar um projeto de recuperação das nascentes no Vale do Rio Doce. Esse será um dos temas da palestra que ele dará em Belo Horizonte ao lado da mulher, Lélia Wanick, na próxima segunda, no Sesc Palladium, dentro do projeto “Sempre um Papo”. Em entrevista ao Hoje em Dia, o fotógrafo fala ainda de “O Sal da Terra”, registro da própria vida e obra feito pelo filho Juliano Ribeiro Salgado e pelo alemão Wim Wenders, e do lançamento, em maio, de um livro sobre o café, com fotos realizadas em dez países.

De que forma a indicação para o Oscar de “O Sal da Terra” pode ajudar na divulgação dos projetos do Instituto Terra?
Evidentemente que tudo ajuda, inclusive essa matéria que estamos fazendo agora. Estão todos indo no mesmo sentido. O filme vai abrir as portas um pouco mais. Mas “O Sal da Terra” é uma coisa, e o Instituto, outra. Não podemos esperar que o documentário vá ajudar na recuperação de nascentes. O projeto é mais amplo e complexo.

O projeto de recuperação de nascentes do Vale do Rio Doce é antigo, mas ganhou relevância devido à crise hídrica. Está mais confiante para levantar todos os recursos, da ordem de R$ 2,3 milhões?
Pode parecer um valor alto, mas numa escala global é pouco. Já fizemos um piloto com 1.200 nascentes, com todos os ajustes realizados no ecossistema. Na verdade, o projeto “Olhos d’água” é um piloto para todo o Brasil. Ele pode ser reaplicado em todos os rios do país, num momento em que se transformou numa necessidade. Já tínhamos as evidências desse problema anos atrás. O engraçado é ver as pessoas ligando a crise à falta de chuvas. O que aconteceu foi que matamos os rios, destruindo fontes com a agricultura à revelia. É preciso fazer (algo) agora, pois leva-se 12 anos para recriar o ecossistema em torno de um rio.

Qual a relação do senhor com Aimorés? Muitos moradores o veem como uma pessoa misteriosa, que pouco aparece na cidade.
Vou pouco ao Brasil. Mas não deixo de ir a Aimorés. Muitas vezes pego uma bicicleta e circulo pela cidade, indo ao restaurante e à casa da Penha. O interessante é que as pessoas não me reconhecem. Digo “oi” para elas e mal me respondem. Creio que esperam a minha chegada em um carro grande.

Seu filho, Juliano Ribeiro Salgado, que dirige “O Sal da Terra”, observou que o filme ajudou a estreitar as relações entre vocês. E como era a relação com o seu pai?
Ele era um senhor muito antigo, muito... severo. Lembro de uma vez viajarmos para a fazenda de um primo dele, em Rio Casca, que era tão bravo que a mulher tinha medo dele. De noite, meu pai avisou que era para dormirmos logo e ir embora cedo. Ou seja, as pessoas daquela época eram assim.

O senhor lançará um livro sobre café em maio. É uma forma de retomar uma parte de sua vida, quando trabalhou nos escritórios da Organização Mundial do Café?
É mais longe do que isso, remetendo aos anos 40 e 50, quando o meu pai vinha de Manhuaçu com várias sacas sobre o lombo das mulas. E eu ia com ele, permanecendo em algumas fazendas para brincar com outras crianças. Embora eu não tome café, eu vivia entorno dele.
 

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