Mineiros mostram que conciliar medicina e literatura é possível, apesar da correria

Elemara Duarte - Hoje em Dia
18/02/2015 às 08:03.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:03
 (Carlos Rhienck)

(Carlos Rhienck)

A letra ou o estetoscópio? Os dois! Esse pensamento parece ser a escolha de vida do neurocirurgião, filósofo, dramaturgo e cronista Jair Raso. Ainda neste semestre, ele quer lançar o primeiro livro, “A Caneta que Mata”, com crônicas do blog jairraso.blogspot.com.br, abastecido mensalmente. No ano que vem, completa quatro décadas de teatro – boa parte do tempo, como autor.
 
Raso é um dos médicos mineiros que, mesmo trabalhando mais de dez horas por dia, ainda consegue uma brecha para escrever.

“Escrevo ‘azuma’”. Azuma o quê, doutor? “‘Azuma’ (1h) da manhã, aos domingos ou no ‘buraco’ entre uma consulta e outra, como agora, quando dou esta entrevista para vocês”, brinca Raso, que recebeu a equipe do Hoje em Dia em um dos três consultórios onde atende.

O neurocirurgião é autor de mais de 11 peças encenadas na capital mineira. Dentre elas, “Memórias em Tempos Líquidos” – que em 2013 venceu o prêmio Sinparc como melhor texto inédito – e o musical “Chico Rosa” – que promove o encontro, em cena, de obras de Chico Buarque e Noel Rosa. Outras 14 estão na gaveta.

Mesmo com a longa trajetória literária, poucos colegas conhecem a outra face do “doutor Jair”. “Uai, o senhor é escritor também?”, espanta-se uma enfermeira, ao ver a movimentação para que o fotógrafo fizesse a imagem.

Na primeira peça em que trabalhou, Raso ainda era estudante secundarista. Ele foi chamado por uma amiga para atuar de forma amadora. O ano: 1976. Depois, passou a dirigir outras produções e a escrever.

A formatura na medicina foi em 1982, mas o lado escritor não ficou de lado. “A vantagem do teatro é que falo o que quero. O pior que pode acontecer é eu dar com os burros n’água e o público não comparecer”, reflete.
Em festa há 15 anos

Falta de plateia é algo que beira a ficção científica para o médico aposentado, dramaturgo e autor infantil Angelo Machado.

Há 15 anos, está em cartaz a peça “Como sobreviver em festas e recepções com buffet escasso”, adaptada de um livro dele. A montagem pode ser conferida no Teatro Sesiminas (rua Padre Marinho, 60, Santa Efigênia), até 8 de março.
Em cena, desde o início, o ator Carlos Nunes. “Mais de 800 mil pessoas já assistiram à comédia. Para mim, cada noite é uma emoção diferente”, afirma Nunes.

Machado, por sua vez, joga confete na parceria com o ator: “A gente combina muito. O sucesso é dos dois”.

Mesmo não tendo atuado em hospital, mas como professor no curso de Medicina da UFMG, Machado, aos 80 anos, ainda conserva os garranchos típicos dos médicos. “Escrevo meus textos à mão. Só a minha secretária entende”.

Angelo Machado contabiliza 37 livros publicados. Em 2015 sai outro: “A Patinha Feia”, sobre bullying sofrido por meninas. “Ser feio é mais grave para as mulheres”, pontua.

Por essas e outras é que o médico e membro da filial mineira da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores, Sebastião Abrão Salim, afirma: “A literatura e a medicina são irmãs. Ambas prestam serviços à sociedade”. Salim tem três livros publicados, incluindo de poemas, e prepara outro no mesmo gênero.
Medicina Roseana

O escritor mineiro Guimarães Rosa (1908-1967) talvez seja um dos médicos mais conhecidos da literatura brasileira.

“No centenário da Faculdade de Medicina da UFMG, em 2011, a escola prestou homenagem ao ex-aluno e fez a publicação do livro ‘O Viés Médico na Literatura de Guimarães Rosa’, que escrevi”, lembra o pediatra Eugênio Goulart.
 
“A vida inteira li os livros de Guimarães Rosa e sempre marquei as referências dele sobre medicina”, lembra, sobre o processo para compor o conteúdo.

Goulart é professor na Faculdade de Medicina da UFMG e tem livros publicados em áreas da geografia e da história. Um sobre a Serra do Espinhaço deve sair no segundo semestre.

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