Montagem inspirada na obra de Tchekhov chega a BH, explorando as fronteiras das artes cênicas

Patrícia Cassese - Hoje em Dia
06/06/2014 às 07:58.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:53
 (Marcelo Lipiani)

(Marcelo Lipiani)

Foi somente nessa quarta (4) à noite, em conversa informal com Chico Pelúcio, integrante do Grupo Galpão, que a diretora teatral Christiane Jatahy se deu conta de uma coincidência no mínimo instigante: “E Se Elas Fossem para Moscou?”, espetáculo que a traz de volta a BH, está sendo montado no mesmo local – Galpão Cine Horto – onde Eduardo Coutinho filmou “Moscou”.

Explicando: a peça teatral em questão estabelece uma ponte entre o cinema e o teatro, a mesma levantada pelo (já) saudoso diretor, ao transpor o cotidiano do Galpão (ensaiando Tchekhov) para o écran. “O trabalho de Coutinho me interessa muito, ele foi um revolucionário. Vejo pontos de convergência (entre as duas iniciativas) e pontos de vista totalmente diferentes, mas o curioso é estar aqui, no mesmo lugar onde ele se perguntou sobre as fronteiras entre o cinema e o teatro”.

Outras explicações necessárias. Baseada no clássico russo “As Três Irmãs”, de Anton Tchekhov, na peça (que será apresentada desta sexta (6) a domingo), Jatahy cria uma interseção entre as duas artes – filmando com a presença do público no teatro e, ao mesmo tempo, editando e projetando as imagens produzidas. Pode parecer complicado... Só que não. O resultado é não só uma peça, mas também um filme, produzido ao vivo a partir do próprio espetáculo. Detalhe: ambos são apresentados simultaneamente em dois ambientes do Galpão Cine Horto: a peça no teatro e o filme na sala de cinema do espaço. A experiência já foi feita no Rio de Janeiro com sucesso. “A primeira descoberta positiva foi que muita gente que viu (um dos suportes) voltou no outro dia (para ver o outro). Pessoas que queriam ver os dois lados da moeda”, brinda Christiane, ressaltando que o filme não se limita à “peça filmada”.

Estilingue que lança a pedra da atualidade rumo ao texto

Assistindo aos dois suportes (filme e peça), é possível ao espectador entender aonde os dois pontos se ligam. “O filme está sendo feito ao vivo, mas os espectadores não têm a sensação de filmagem, as câmeras são integradas à cena, como se participassem de um encontro onde há gente filmando – o que, aliás, é comum na contemporaneidade. No nosso dia a dia, acaba que o ‘cinema’ está sendo feito ali, na hora”, diz ela, referindo-se ao fenômeno do registro de tudo, feito a partir de celulares e afins.
 
Sobre Tchekhov, Christiane conta que o interesse pelo dramaturgia do autor sempre esteve presente em seu trabalho, mesmo que não diretamente, apenas a partir de algumas premissas. “Essa peça, especificamente, me instigava, e, desde o meu ultimo espetáculo, ‘Julio’, fiquei movida pela ideia de trabalhar com clássicos. Mas não é uma desconstrução (do texto)”, esclarece.

A imagem que ela mesma forma é a de um estilingue que lança uma pedra da atualidade rumo ao texto. “É o Tchekhov, mas é o Tchekhov hoje. Aprofundo o agora no clássico, e como essa versão propõe dois espaços, multiplico o ponto de vista: tenho o mais aberto, o do teatro, e o mais fechado, o do cinema. Coloco o espectador em uma relação com a peça similar à que as irmãs vivem no seu conteúdo. Elas desejam o que não têm – no caso, voltar a Moscou – e o espectador (da peça ou filme), por sua vez, reconhece a existência do outro lugar”, conclui.

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