Mostra coletiva do CCBB-BH traz Berlim após a queda do muro

Thais Oliveira - Hoje em Dia
21/10/2015 às 07:49.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:09
 (Carlos Henrique)

(Carlos Henrique)

Não pense que os vídeos ambientados nos anos 1920 e 30, de Julian Rosefeldt e Reynold Reynolds, expostos a partir desta quarta (21) no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) são puras obras de ficção. “Berlim sempre foi um lugar muito permissivo e de um certo deboche. Isto já era assim há cem anos e se manteve. Não existe nada que não seja possível nestes clubes hoje”. Quem afirma é o curador da mostra coletiva “Zeitgeist – A Arte da Nova Berlim”, Alfons Hug.

Belo Horizonte é a primeira cidade a receber a exposição, que fica em cartaz até 11 de janeiro de 2016 e depois segue para o Rio de Janeiro. O título – “Zeitgeist” – confirma: a proposta é trazer o “espírito de um tempo”, que, no caso, é a contemporaneidade, pois trata-se de um panorama do período após a queda do muro de Berlim, em 1989, marcando o fim da Guerra Fria e reunificando a Alemanha. O que se vê na mostra é pluralidade, demonstrada através da evolução da arte, cultura e relações humanas. Ao todo, 22 artistas e sete DJ’s foram incumbidos da tarefa desencadeada a partir de vídeos, pinturas, fotografias, instalações e performances.

“Babel dos pecados"

Se no Brasil, os lugares onde “tudo pode” ficam, muitas vezes, escondidos ou silenciados, na “cidade mais legal do mundo” eles estão, literalmente, em qualquer espaço. “Os clubes de Berlim são, normalmente, fábricas ou usinas desativadas. Toda a cultura, toda a cena da arte se beneficiou de uma certa ‘desindustrialização’ de Berlim, que houve ali por causa do muro, pois ninguém investia mais. Então, muitas fábricas ficaram abandonadas e depois foram ocupadas pelos artistas e pelas iniciativas culturais. Até hoje é muito fácil conseguir ateliê e espaços acessíveis”, conta Hug.

Talvez você se pergunte se não existe fiscalização destas ocupações... “Estes clubes não são como no Brasil, que você leva a namoradinha. São lugares ‘largados’, não são arrumadinhos. Ninguém constrói uma casa para fundar um clube nela. Comprar um imóvel para isto é mal visto em Berlim. Isto não existe”, justifica o curador.

Capítulo de destaque da exposição alemã, os clubes também estão na sombria série de fotos “Kubus”, de Friederikevon Rauch e Martin Eberle, nas instalações de Marc Brandenburg, a sala “Clube Berlim”, com música eletrônica e uma instalação visual e sonora com fotos de Sven Marquardt e música de Marcel Dettmann. “As obras remetem ao hedonismo, mas não em sua forma leve, mas, sim, cruel, de uma Berlim suja e abandonada”, reforça Hug.

Uma cidade em (des)construção marcada por feridas históricas

Em várias salas da mostra no CCBB-BH, a sensação que se tem é a de que a obra está em construção ou em desconstrução. A decisão fica a cargo do contemplador. Divida por um muro por quase três décadas, depois de ferida pela Segunda Guerra e marcada pela Guerra Fria, fica difícil, se não impossível, representar uma única Berlim com tantas segregações históricas.

Certo da responsabilidade que estava em suas mãos, Alfons Hug foi feliz ao apontar não apenas um, mas seis “caminhos” conceituais a serem percorridos pelos visitantes: “Hedonismo Cruel” (retratado pelos já citados clubes), “O vazio e o Provisório” (sobretudo nas obras dos pintores), “Novos Mapas e os Outros Modernos” (como o vídeo “A Caça”, de Christian Jankowski), além de “Eterna Construção e Demolição”, “Tempo que Corre e Tempo Estagnado” e “A Ruína como Categoria Estética”, destacados a seguir.

Ruínas

Os confrontos são bem marcados pelas fotografias de Thomas Florschuetz do Neues Museum (Novo Museu, na tradução para o português). “Na reconstrução do museu, decidiram deixar, propositalmente, as marcas das balas perdidas na guerra de 1945”, frisa Hug.

A ruína é destaque também nos trabalhos do fotógrafo Frank Thiel. “Ele foi um dos artistas que mais captou esta questão, pois nunca se sabe se aquilo está sendo construído ou demolido”, diz o curador.

O tempo é outro ponto que chama a atenção. A começar pela performance “Standard-time”, de Mark Formanek, na qual trabalhadores montam um grandioso relógio com tábuas de madeira. “A ideia é mostrar o tempo sendo autoconstruído pelas próprias pessoas”, diz Hug.

O mesmo conceito foi trabalhado por Michael Wesely, que conseguiu captar o tempo por meio das fotos. “Ele registrou Berlim nos últimos 20 anos. Cada câmera ficou no mesmo lugar durante um ano. Por isto, tudo que se moveu, ou seja, que estava sendo construído, ficou diluído”, explica Hug.

Quem for visitar a mostra perceberá ainda que retomar a vida após a queda do muro foi, não apenas no sentido figurado da palavra, um tormento. Um pouco disto poderá ser sentido pelo ensurdecedor barulho das 12 betoneiras, de Julius von Bismarck, que giram sem parar no pátio do CCBB.

- Assista ao vídeo das betoneiras em funcionamento, clicando aqui.

Veja a galeria de fotos da exposição:

Serviço

Zeitgeist– A Arte da Nova Berlim” – CCBB BH (Praça da Liberdade, 450). Nesta quarta (21), às 18h30, Conversa com Sven Marquardt e o curador da Sala Clube Berlim, Heiko Hoffmann, mediada pelo curador da exposição, AlfonsHug. Abertura da mostra a partir das 19h30 desta quarta (21). Visitas: de quarta a segunda, das 9 às 21h. Entrada franca.

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