Na contramão da tecnologia, Músicos de BH investem em instrumentos antigos

Thais Oliveira - Hoje em Dia
02/02/2016 às 07:43.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:16
 (Tamires Guimarães)

(Tamires Guimarães)

Ao ouvir os primeiros acordes, fica claro que há algo diferente e genuíno naquele som. Nada de violas ou metais da atualidade. Os responsáveis por tanta autenticidade são instrumentos usados há séculos para compor e tocar as canções. E, ao contrário do que se pensa, há, sim, lugar para eles no mercado.

Músicos da capital, diferentemente da maioria, escolheram se especializar nesse tipo de instrumento. Nos concertos da Orquestra 415 de Música Antiga, as melodias são tiradas do alaúde, flauta doce, viola da gamba, espineta, fagote e oboé, os dois últimos, barrocos.

Segundo o flautista André Salles Coelho, de 46 anos, a Orquestra 415 nasceu da paixão pela música barroca. “Sempre ‘namorei’ à distância esses instrumentos até que, em 2009, resolvi comprar uma flauta transversal barroca”, recorda.
 
Custo alto
 

Como passo seguinte, Coelho formou uma orquestra de câmara – caracterizada pelo número menor de integrantes. Vendo que havia campo em Belo Horizonte, em 2012, ele ampliou a equipe. “Vimos que seria interessante criar a Orquestra 415, que, hoje, tem de 16 a 18 músicos. Ela é a única independente no Brasil, se não me engano”.

O músico explica que a falta de outras orquestras semelhantes se deve, entre outros motivos, ao alto custo dos equipamentos. “A maioria dos instrumentos é comprada fora do Brasil, já que as cordas são de tripa, diferentes dos modernos que têm cordas de nylon, o que fica mais caro”.
 
Retorno positivo
 
O esforço para manter o grupo teve resultado. No ano passado, eles fizeram uma temporada no Museu Inimá de Paula. Para ele, o evento foi uma confirmação de que a cidade carecia da iniciativa.

“As orquestras modernas não conseguem fazer o repertório barroco perfeitamente. As composições foram escritas pensando na sonoridade que somente é reproduzida por instrumentos antigos”, destaca André.

De acordo com o flautista, o retorno foi tão positivo, que o projeto irá voltar em março ao Museu Inimá de Paula, ocorrendo sempre na última quinta-feira do mês.
 
Grupo tem alaúde de 400 anos
 
Assim como a Orquestra 415 de Música Antiga, a Camerata Rococó surgiu a partir de um sonho de Wolney Garcia, de 42 anos, de criar um grupo de música antiga. Hoje, a Camerata é especialista em tocar em casamentos, mas o grupo não se limita a apresentar somente canções de séculos passados. “Também tocamos músicas contemporâneas, como ‘He’s a Pirate’, do filme ‘Piratas do Caribe’, e ‘Now We Are Free’, do ‘Gladiador’”, exemplifica.

Ele atua ainda na composição de trilhas para cinema. Entre os trabalhos, a trilha do curta-metragem “Sexta-feira da Paixão”, de direção de Ivo Costa, e do longa “Fora de Ordem”, do diretor Sérgio Gomes, ambos de Minas Gerais.
 
Formação
 
Além de Wolney Garcia – que toca alaúde, instrumento originado no século 16 –, a Camerata Rococó é formada pelos músicos Helder Araújo (percussão e violino barroco), Eduardo Fonseca (viola da gamba), Renato Gomes (violino barroco) e Patrícia Chow (canto e harpa).

“Existem vários modelos. O meu alaúde é de 400 anos atrás e tem 19 cordas. Foi o instrumento mais popular da Europa, como hoje o violão é para a gente”, exemplifica Garcia.
 
Falta de cursos dificulta formação


A dificuldade em encontrar formação superior em instrumentos seculares é pontuada pelos músicos como problema.

Para o professor e integrante do grupo Musica Figurata – que atua na interpretação de época há mais de 10 anos –, Gustavo Bracher, para quem quer atuar na área, é preciso recorrer a cursos livres. “Não existe estudo formal no Brasil desses instrumentos. Cursos assim apenas fora do país”, explica.

Segundo o músico Wolney Garcia, da Camerata Rococó, ele foi o primeiro a se graduar em Alaúde na América do Sul, na Escola de Música da Universidade Estadual de Minas Gerais.

“A disciplina só existiu após eu e um professor travarmos uma luta ferrenha, e apenas um ano depois conseguirmos que o curso fosse aprovado. Infelizmente, foi extinto por falta de candidatos”.

Som diferente

Gustavo Bracher explica que uma das maiores diferenças entre instrumentos antigos e modernos está no número de cordas e na sonoridade.

“O som do alaúde é parecido com o do violão, mas a família dele é gigantesca, de 5 a 14 ordens (mudança na afinação). Já a guitarra barroca se aproxima mais com o som da viola caipira”, compara.
 
Além disso...
 
No ano passado, arqueólogos chineses encontraram restos de instrumentos musicais que seriam os mais antigos achados na história do país. De acordo com a agência oficial “Xinhua”, os instrumentos seriam datados de 2,7 mil anos atrás. O material estava na província de Hubei, em túmulos feitos em um período conhecido como Período de Primavera e Outono, durante a dinastia Zhou, entre os séculos 11 e 5 a.C.

Devido ao tempo em que resistiram no local, os instrumentos foram encontrados bastante deteriorados. Um deles consiste num instrumento de 25 cordas para dedilhar. Já o outro trata-se de uma estrutura de um “bianzhong”, que possui um sistema de sinos de bronze. O “bianzhong” mede 4,7 metros e está sendo considerado como o maior do modelo já encontrado.

Além disso, no antigo cemitério onde os instrumentos foram encontrados, os arqueólogos acharam centenas de peças de bronze, 27 veículos e cerâmica.
 
Veja os vídeos:

 

Orquestra 415 de Música Antiga:


 

Camerata Rococó:




Gustavo Bracher:

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