Nova pintura de Priscila Amoni faz alusão à tragédia de Brumadinho

lbuzatti@hojeemdia.com
04/03/2019 às 19:05.
Atualizado em 05/09/2021 às 16:49
 (Leandro Guerreiro/divulgação)

(Leandro Guerreiro/divulgação)

Duas mulheres que emergem da lama, com folhas na cabeça, e uma flor de lótus roubam olhares em um imenso paredão da linha férrea na avenida Nossa Senhora de Fátima, junto ao viaduto Itamar Franco, no bairro Prado, em Belo Horizonte. Assinada pela mineira Priscila Amoni, a obra integra o Projeto Gentileza, edital da Prefeitura de Belo Horizonte que selecionou 40 artistas visuais da cidade para compor murais entre novembro do ano passado e março de 2019. 

O mural pintado por Amoni tem 25 metros de largura por sete de altura e foi entregue cerca de um mês depois do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. O trabalho mostra duas mulheres caminhando dentro de um rio de lama, protegidas por folhas gigantes. De dentro do lamaçal, nasce uma flor de lótus, que dá origem ao título da pintura: “Lótus – Renascer da Lama”. 

A artista conta que, ao chegar ao local para traçar o layout original, decidiu mudar toda a concepção da obra. “Quando fui riscar o muro, tinham uns dois dias que havia acontecido o crime ambiental em Brumadinho. E logo quando cheguei, passou um trem da Vale lotado de minério. Fui para a casa e mudei o layout todo”, conta. 

Segundo Amoni, o mural – assim como a maioria de suas obras – evoca a espiritualidade por meio da figura das mulheres e das plantas. “Eu costumo falar que meu trabalho é uma reza, um pedido, uma evocação. Então, resolvi fazer uma grande reza quando houve essa tragédia. Muitas pessoas rezaram pelos que se foram, mas também senti muito pelas pessoas que ficaram, por nós, que continuamos aqui na lama”, reflete. “Essa sucessão de tragédias, para quem mora em Minas Gerais, é uma invasão da nossa memória. Estão intoxicando nossa história, matando os rios em que a gente se banhava, de onde a gente bebe a água”.

Portanto, a ideia da obra é, também, exaltar a resistência. “Minha pintura invoca a cura e a resistência do feminino por meio do uso das plantas de poder, que nos remetem também às religiões que ainda são oprimidas por usar da natureza. Meu voto é pela cultura popular, pelas mulheres curandeiras”, sublinha. “E a flor de lótus simboliza essa resistência, já que é uma flor que nasce da lama. Já as duas mulheres estão saindo e renascendo da lama e a partir da lama”, completa a artista.

Uma das criadoras e produtoras do Cura – Circuito Urbano de Arte, Amoni ressalta a potência criativa das artes visuais em Belo Horizonte, amplificada pelo projeto que tem pintado diversas fachadas cegas (as chamadas empenas) de prédios do Centro. 

“Sinto que BH está se tornando um polo de street art no Brasil. O Cura é hoje um dos grandes festivais de murais do Brasil”, afirma. “E não existe em nenhum outro lugar essa coisa do mirante (da rua Sapucaí), de ver todos os prédios de um mesmo lugar. Isso vai criando um território onde os artistas têm a possibilidade de fazer murais, o que afeta as instituições e cria uma cultura local”. 

O projeto Cura foi lançado em 2017 pela Prefeitura de BH com o objetivo criar condições para que artistas plásticos utilizem grandes áreas cegas de prédios na região central da capital para a pintura depainéis coloridos. Os primeiros são os que dão frente para a rua Sapucaí, pintados naquele mesmo ano. 

No fim do ano passado, mais três painéis passaram a integrar a galeria de arte do Projeto Cura. São as fachadas do Amazonas Palace Hotel (avenida Amazonas), do Edifício Chiquito Lopes (rua São Paulo) e as duas torres do Edifício Satélite (rua da Bahia), todas com vista também para a rua Sapucaí.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por