O canto que sobrevive

Pedro Artur/Hoje em Dia
06/08/2014 às 08:16.
Atualizado em 18/11/2021 às 03:40
 (Agnaldo Rocha Papa  )

(Agnaldo Rocha Papa )

A seresta praticamente desapareceu das grandes cidades, em parte devido ao corre-corre da vida moderna – mas, sim, a tradição resiste em alguns lugarejos do país. Em Minas, por exemplo, embora sem a força de tempos atrás, o que é agravado pela falta de renovação de seresteiros. Mesmo assim, é possível encontrar grupos atuantes em cidades ribeirinhas do São Francisco, que preservam uma sonoridade própria no cantar dessa região.

Em Januária, a família Félix dita o ritmo; em São Francisco, o tom é dado pelos mensageiros do amor, sob a guarda de Guilherme Barbosa e João Canário; em São Romão, há um grupo de veteranos – homens e mulheres –, além do som inconfundível do grupo de Dona Maria do Batuque, cuja música retrata fatos e costumes da região. Mas tudo feito à moda antiga, de forma espontânea, sem patrocinadores.

Todo esse “patrimônio cultural” passa, agora, por um trabalho de resgate promovido por duas paulistanas: a jornalista e produtora Maída Novaes e a professora de história Patrícia Pacini, que, aos moldes de antigos viajantes, fizeram uma expedição (de 15 a 29 de julho último), por essas cidades ribeirinhas do São Francisco.

No projeto – batizado “Seresteiros do Rio São Francisco” –, elas filmaram, colheram depoimentos, ouviram histórias e causos e, como resultado, serão confeccionados um livro e um documentário, com lançamento previsto para novembro deste ano. A produção de um CD também não está descartada. “Dá vontade”, diz Maída, encantada com o que viu e, sobretudo, ouviu por suas andanças.

Ela emenda: “Primeiramente, adorei a sonoridade. É uma música bem sertaneja, brasileira. Tem um orgulho com o ‘presidente seresteiro’ JK, então, ‘Peixe Vivo’ é parte obrigatória, assim como ‘Luar do Sertão’ (Catulo da Paixão Cearense), ‘A Lenda do Arco-Íris’ (de Pedro Boi, compositor, cantor e violeiro mineiro). Eles cantam a saudade do caboclo/a, o amor’, sintetiza.



 Descaso tanto com o rio quanto com a cultura


Para a professora de História Patrícia Pacini, que está à frente do projeto “Seresteiros do Rio São Francisco” junto com a jornalista e produtora Maída Novaes, o “Velho Chico” também, com suas águas, contribui para essa sensibilidade à flor da pele.

“A seresta que surge à beira do São Francisco é muito forte, traz muito amor. Quando você se banha nele deixa sua tristeza, sofrimento irem embora; o Velho Chico inspira o amor seresteiro”, ressalta Patrícia, incomodada, no entanto, tanto com o descaso dessa cultura quanto com o rio.

“Em Januária, a família Félix, formada pelo casal e as filhas, jovens de 20 e poucos anos, se mantêm em atividade, mas essa participação de pessoas mais jovens é uma exceção. A seresta está indo embora como o Velho Chico está secando”, diz, lembrando que a intenção era que o trecho de Pirapora a Januária fosse pelo rio, mas por conta da seca, foi feito por terra.

Na criação desse projeto, que poderá ser estendido a outras partes do país, prevaleceu a conjunção de ideais fortalecidos por uma amizade de 30 anos, além da combinação profissional e espiritual.

Quando foi convidada por Patrícia, Maída – que impulsiona o Instituto de Trovadores Urbanos na capital paulista – fazia pesquisas em cidades do São Francisco. Foi o casamento perfeito. E grande parte do dinheiro envolvido no projeto sai do bolso de Patrícia – as prefeituras ajudaram com a alimentação e hospedagem.





 

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