Odisseia 50 anos: ciência ainda tenta responder as mesmas perguntas feitas no clássico '2001'

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
02/07/2018 às 06:00.
Atualizado em 10/11/2021 às 01:06
 (Flávio Tavares)

(Flávio Tavares)

Cinquenta anos já se passaram desde que o computador HAL 9000 desafiou o comandante da Discovery One e tomou o controle da nave em “2001 – Uma Odisseia no Espaço”. O tempo só serviu para tornar esse marco da ficção científica – adaptado do livro de Arthur C. Clark e transposto para a tela grande por Stanley Kubrick – profético e real, hoje cultuado não só pelos cinéfilos como por cientistas de renome.

“O filme é muito atual e, mais do que isso, nos faz pensar que aquela concepção de futuro de 50 anos atrás em nada avançou”, analisa Silvania Sousa do Nascimento, coordenadora do núcleo de astronomia do Espaço do Conhecimento, na Praça da Liberdade. “Teoricamente teríamos avançado, pelo o que temos hoje em relação a cinco décadas, mas na prática mudou muito pouco”, compara.

Na trama, dividida em três atos, vemos uma tribo de homens primitivos encontrando um monolito no deserto. Pouco depois, um deles descobre que um osso pode se transformar em arma. A imagem do osso é fundida a de uma nave, milhares de anos depois (uma das cenas mais icônicas do filme), em que astronautas reencontram o monolito e tentam encontrar sua origem e propósito. 

Silvania observa que a busca por respostas sobre a existência humana, um dos temas de “2001”, ainda se faz mais forte do que nunca. “Como no início do filme, quando se discute a possibilidade de a tecnologia tornar possível a busca do totem (o monolito, que seria a representação de vida alienígena), a gente se volta para questão das origens, pensando sobre a questão epistemológica da ciência”.Divulgação


Sem conversa

Ela registra que a ciência caminhou para ter disciplinas e métodos científicos bem verticais que pouco conversam entre si. “A Física não conversa mais com a Química, que não conversa com a Antropologia... Temos que nos voltar para a filosofia natural, em que a Física não é só uma solução matemática. São diversos pontos nesta rede que convergem para a transdisciplinaridade”, analisa.

Cientista da Nasa, agência americana especializada em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias e programas de exploração espacial, Ivan Paulino comenta que “as agências espaciais estão loucas para encontrar vida fora da Terra, qualquer microorganismo inteligente”. E enfatiza: “A questão em aberto em torno da exploração especial como um todo, é se somos o único planeta com vida no universo”. 

A comunidade científica, segundo ele, trabalha com a ideia de que não estamos sozinhos e que uma descoberta neste sentido é questão de tempo. Em seu campo de atuação, a microbiologia, Paulino tem trabalhado com microorganismos extremófilos, que poderiam sobreviver a condições extremas fora da Terra. “É uma longa pesquisa e cada vez mais temos a convicção de que existe vida em outros lugares”.

Fã de “2001”, o cientista destaca que livro e filme preconizaram algumas situações, como o fato de o robô ser um personagem quase humano, com uma vida própria. “Hoje se discute o direito dos robôs após, no ano passado, um deles ter recebido cidadania iraniana. Cada vez mais a gente vem se deparando com grandes transformações para o futuro”, avalia Paulino.

 Divulgação

 Obra de Stanley Kubrick desperta fascínio e curiosidade

Em 1968, o jornalista João Nunes foi um dos primeiros espectadores de “2001”, vendo, “com espanto, aquele filme ao mesmo tempo deslumbrante e incômodo”, num cinema de São Paulo. Reviu o longa-metragem outras tantas vezes, ainda tentando decifrar todos os seus enigmas. 

Há três anos, após retornar de Nova York, não conseguia dormir até que resolveu ligar a TV. “Foi assim que me deparei com o filme novamente. A diferença era a tela, desta vez, minúscula. Mas, em vez de ser empecilho, o detalhe serviu como ponto de partida para uma viagem inesquecível.

Baixei o som (porque não escutamos sons no espaço sideral) e viajei nas imagens desse filme hipnótico. Como a nave futurista de Kubrick, eu me via suspenso no ar”, recorda.

Perspectiva

Editor do site “A Escotilha”, o professor de cinema Paulo Camargo assistiu a ficção-científica nove anos depois de seu lançamento, numa sala do Rio de Janeiro, quando tinha 12 anos. “Sabia que era um filme importante, mas não tinha muita ideia do que iria assistir”, lembra.

“Como sou filho único, desde muito cedo meus pais me levavam para assistir a filmes mais adultos, que muitas vezes eu não entendia direito, mas acabaram sendo fundamentais na minha formação”, afirma Camargo, citando, entre outros, “Derzu Usala”, de Akira Kurosawa, e “A História de Adéle H”, de François Truffaut.

“Recordo-me, vividamente, das imagens do macaco lançando ao céu o osso que se transforma em nave espacial ao som de ‘Danúbio Azul’; do décor futurista, de cores fortes, saturadas (laranjas, amarelos), mas também asséptico (branco); da presença do computador HAL; e do bebê sendo gerado em contraponto à imagem do envelhecimento e da morte no desfecho”, entabula. 

Garoto ainda, Camargo lembra de ter saído da sessão atordoado, por não conseguir, racionalmente, ligar todos os pontos do enredo e, principalmente, ter dado conta da existência do futuro naquele momento.

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