Projeto leva grafite 'drummondiano' às favelas de BH

Elemara Duarte - Hoje em Dia
17/07/2015 às 22:15.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:57
 (Hoje em Dia)

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A poesia de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) não para de ganhar vida. Agora mais fôlegos para ela saem das latinhas de spray de dez grafiteiros participantes da exposição “Arte Favela”. A sexta edição do projeto começa a rodar pelos becos de cinco comunidades de BH a partir deste domingo (19), com grandes telas, de 1,40 metro por 2 metros, expostas ao longo das vielas. Duelo musical e bate-papo também completam os eventos.

“Os meninos já trabalham com a poesia do rap, por isso foi fácil entrar com esta linguagem”, conta o coordenador do projeto, o grafiteiro e artista plástico Hely Costa. Mas para fazer o mergulho na obra de Drummond foi organizada uma oficina com uma professora de literatura para mostrar as principais eixos da obra do escritor aos grafiteiros.

“Eles leram alguns poemas. Mas não são textos tão simples quanto a gente pensa. Depois que começaram a entendê-los, viram que as obras de Drummond tinham um significado maior”, indica Costa.

Esta não é a primeira vez que o mundo dos livros é abordado neste formato de projeto de “street art” criado em BH. Em edição anterior, o escritor e jornalista Murilo Rubião (1946-1991) também foi homenageado nas telas.

Depois de expostas, as telas de “Arte Favela nos Becos – Releituras das Obras de Drummond” poderão ser vendidas. As obras também são fotografadas e estas imagens viram cartões postais, que são distribuídos gratuitamente nos eventos.

Além da exposição, o evento de domingo do Arte Favela terá a apresentação de um "duelo musical", mas de conhecimento gerais, e com a batida do funk.

Corações também saem do spray

Morador do bairro Renascença, Região Nordeste de BH, o grafiteiro Rodrigo Scalabrini, o “Kaos”, escolheu o poema “Mundo Grande” (do livro "Sentimento do Mundo", 1940) para se inspirar: “Não, meu coração não é maior que o mundo./ É muito menor./ Nele não cabem nem as minhas dores./ Por isso gosto tanto de me contar./ Por isso me dispo,/ por isso me grito,/ por isso freqüento os jornais, me exponho cruamente nas livrarias:/ preciso de todos”. Eita, Drummond, que vai no alvo do afeto!

“Fiz um comparativo com o que a gente vive em relação aos sentimentos. As pessoas estão envolvidas com a rotina diária e esquecem de se socializar”, explica Scalabrini, que fez um coração com um sentimento de “solidão” o cercando.

O artista diz que uma das propostas do grafite na rua é justamente esta necessidade de se expressar e de entrar no cotidiano das pessoas. “Uma hora a pessoa presta atenção no desenho”, espera, em relação aos cidadãos apressadinhos. Nos últimos meses, Scalabrini tem desenhado uma série de corações em paredes de BH.

Um deles está em uma das saídas do Hospital São Francisco, no bairro Concórdia, Região Nordeste de BH. “Queria fazer um coração Brasileiro neste. E este tem uns remendos. Isso quer dizer que o brasileiro não para nunca, mesmo que sofra”, explica.

Outro coração está sendo desenhado na Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (APAC), de Santa Luzia, na Região Metropolitana de BH. O projeto mostra mais um coração, porém, dividido: metade vermelho, o lado certo; e a outra metade, em preto, branco e cinza, ou seja, mais amargurado. “Todo ser humano tem escolhas. E ele pode seguir tanto pelo lado ruim quando bom”, ensina.

E na exposição... Além dos corações de Kaos, a mostra também traz obras de grafiteiros como Daniel Alves (o "Bogú"), com a tela sem título que mostra o Drummond revivido em uma máquina do tempo; Henrique Coral ("Coral"), que mostra o poeta em um azul "céu com nuves", cujo título do desenho é "Ausência"; Alexsander Fellipe ("Lash"), que traz o rosto do poeta, ainda jovem, em preto e branco, tela chamada "A Pena Escreve".   Já a tela que mostra um menino em um trem de ferro é de Murilo Neri. O título: "A Viagem". Juliano Cesar (o "Nica") fez um Drummond mais conceitual, com a cabeça em formato de relógio - a tela recebeu o título "De Volta à Cena". Já Paulo Rodrigues ("Nove") fez o poeta itabirano com um coração destacado na tela "Drummond é Introspecção".   Em outro trabalho estão os traços de Júlio Cesar (o "Pixone"), que fez uma máscara cortada chamada "Sete Faces". O nome é referência ao título do famoso poema que diz: "Quando nasci, um anjo torto/ desses que vivem na sombra/ disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida".    O artista Ronald Nascimento ("Credo Sete") mostra um homem com várias palavras na cabeça, em um "black power" intenso de reflexões. A obra é: "Os Ombros Suportam o Mundo". Por fim, na tela de Claudinei de Carvalho ("Ploc") uma mulher com cachimbo é a chamada "Rosa do Povo Sá Maria", inspirada no livro do poeta, "A Rosa do Povo", de 1945.  

SERVIÇO

Cronograma da exposição “Arte Favela nos Becos – Releituras das obras de Drummond”:

Dia 19/07 - Beco Epaminondas Otoni, Cabana do Pai Tomás Dia 26/07 - Vera Cruz Dia 2/08 - Conjunto Felicidade Dia 09/08 - Serra Dia 16/08 - Goiânia (Vila Presid. Vargas)

Mais informações sobre as próximas paradas da exposição, em breve no: www.artefavela.org
 

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