Quadrinhos: gênero se reinventa com maior uso na educação e abordando temas adultos

Bernardo Almeida
18/06/2019 às 09:31.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:09
 (Riva Moreira)

(Riva Moreira)

Os exemplares tornaram o romance gráfico “Dom Casmurro de Machado de Assis” no livro mais requisitado por professores da rede pública de ensino dentro da vertente literária do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD Literário) em 2018, voltado para alunos da 1ª a 3ª séries do Ensino Médio.

A adaptação foi feita em 2011 pela editora Nemo – braço de histórias em quadrinhos da editora Autêntica – com ilustração de José Aguiar e roteiro de Wellington Srbek, que já havia adaptado “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, outro romance machadiano, um ano antes. 

Srbek frisa que a adaptação para as salas de aula não tem objetivo ou pretensão de substituir a original, publicada pela primeira vez em 1899. “Trata-se de uma releitura, homenagem que fazemos ao grande autor e à obra original”, diz. “Os quadrinhos têm grande apelo para o público jovem, e o diálogo entre imagens e palavras contribui para que os jovens mergulhem na narrativa, potencializando o despertar do interesse pela leitura e também a formação de novos leitores”, pondera. 

É a mesma compreensão do presidente da Associação Nacional de Livrarias (ANL), Bernardo Gurbanov. “Esse formato constitui uma porta de entrada para o mundo da leitura e da imaginação, um convite ao conhecimento”. 

Para Gurbanov, a “aproximação da literatura em forma simplificada e ilustrada é importante para os jovens que, muitas vezes, praticam um tipo de leitura fragmentada, não aprofundando o suficiente para ler obras mais consistentes, porque além de imaginação, a leitura requer o esforço da concentração”. 

A tática é ainda mais válida ao levar os jovens a buscar o texto original, garante Célia Abicalil Belmiro, pesquisadora do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da UFMG (Ceale). No entanto, ela destaca que é importante manter a essência da obra, apesar da linguagem mais acessível, que cativa o público. “Não fica bom quando o objetivo é facilitação, sem a preocupação com o pano de fundo e o enquadramento que se dá, porque aí você perde a densidade literária. Tão importante quanto a história em si é o modo como se conta essa história”, analisa.

Romances gráficos

As histórias em quadrinhos são mais comumente associadas aos gibis de super-heróis, narrativas infantis e assuntos cômicos, como o espaço ocupado por quadrinistas em jornais. 

Desde a década de 1970, no entanto, os quadrinhos passaram por uma legi-timação cultural, e com a nomenclatura de graphic novels (romances gráficos, em inglês) adentraram espaços mais nobres, explica o coordenador do Observatório de História em Quadrinhos da USP, Waldomiro Vergueiro.

“O que se tinha antes era de que a linguagem dos quadrinhos só fosse adequada para assuntos de menor importância e para pessoas sem a mesma capacidade de leitura. E podem ser usadas assim, mas não há nada que impeça os quadrinhos de tratar assuntos como holocausto, suicídio ou questão de gênero”, ratifica, lembrando da HQ Maus, de Art Spielgeman, agraciada com o prêmio Pulitzer em 1992.

O termo graphic novel foi popularizado por Will Eisner. É um recorte dentro do universo das HQs, em formato de livro e com histórias fechadas, na maioria voltadas para um público adulto e com conteúdo mais denso.

“Os HQs deixaram só o espaço das bancas e foram para as livrarias, bibliotecas públicas e acadêmicas, congressos acadêmicos e exposições”. 

A tendência de tratar temas densos nas HQs tem se consolidado, mas o gênero ainda sofre com certa resistência para não ser equiparado à literatura geral. É o que lembra Carol Cunha, professora da escola de artes visuais Casa dos Quadrinhos. “Em 1991, Neil Gaiman ganhou o prêmio literário World Fantasy Award de melhor história curta pela edição 19 da HQ Sandman. Foi a primeira e única vez em que uma HQ conquistou esse prêmio, e no ano seguinte, as regras do concurso foram mudadas para isso não se repetir. Uma pena!”.

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