Titãs retomam o lado rebelde no novo disco "Nheengatu"

Cinthya Oliveira - Hoje em Dia
26/05/2014 às 07:49.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:44
 (Marcos Hermes)

(Marcos Hermes)

A Copa do Mundo terá início em algumas semanas e o país já se prepara para uma avalanche de protestos nas grandes cidades. De olho na grande massa de descontentes, os Titãs acabam de lançar “Nheengatu” (Som Livre), seu 18º álbum, que busca retomar a sonoridade pesada e a acidez dos anos 80, após uma sequência de seis álbuns bastante pop desde o “Acústico”, de 1997.

A intenção, aparentemente, é voltar à criatividade e atitude de sua obra-prima, “Cabeça Dinossauro”, de 1986, mas o tiro saiu pela culatra. “Nheengatu” até poderia ser uma obra relevante dentro da discografia dos Titãs, se tivesse sido lançado no final dos anos 80. Mas em 2014, soa ultrapassado e ingênuo. Pode parecer uma atitude madura deixar de lado o pop dos últimos anos e relembrar o punk pesado em suas 14 faixas – com direito a riffs muito bem trabalhados e a uma bateria pesada de Mário Fabre –, mas o conteúdo das letras mostram que os quatro remanescentes perderam o dinâmico bonde da história do rock.

A banda decidiu fazer um retrato da efervescente atualidade brasileira, com músicas sobre violência policial, religião, a opressão do politicamente correto, política, corrupção, machismo e, até, pedofilia. O problema é que não há aqui qualquer preocupação estética ou poética. Quatro cinquentões se colocam como adolescentes revoltados a partir de reportagens do “Jornal Nacional”.

O refrão de “Pedofilia” é bem representativo: “Eu não vou te fazer nenhum mal, ele disse/ e então me pegou pela mão/ ele disse que era normal que eu pedisse/ e eu não tinha por que dizer não”.

Ou “Senhor”, que poderia ser uma continuação de “Igreja”, se ainda fosse impactante criticar religiões: “Querem meu dinheiro/ querem meu salário/ um santo no banheiro/ uma sombra no armário”. Ou ainda “Quem São os Animais?”: “te julgam pela cor da pele/ te insultam e te condenam a penar/ te julgam pela roupa que vestes/ te humilham e não te deixam falar”.

As duas letras mais interessantes do álbum, na verdade, passam por outros dois compositores. “Cadáver sobre Cadáver” é uma parceria de Paulo Miklos com Arnaldo Antunes, mas é muito fácil ver ali a marca poética do ex-Titã (“morre o homem, morre Deus, o luto não alivia”). Já “Canalha” é uma versão pesada para música de Walter Franco, cantada (e recebida com vaias) no Festival da Tupy de 1978.

Há quem possa dizer que o punk é assim, duro, cru e direto, independentemente da época. Mas é impossível não esperar mais de uma turma que já soube unir protesto com criatividade e poesia – vide “Comida”, “O Pulso”, “Marvin”, entre outras.

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