"Trauma" em "Quincas Borba" levou Machado de Assis aos livros

Pedro Artur - Hoje em Dia
22/03/2015 às 14:15.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:26
 (Arquivo/Hoje em Dia)

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Sobre Machado de Assis, o “Bruxo do Cosme Velho”, já se escreveu tudo. Ou melhor, quase tudo. Com base nos resultados da pesquisa de seu doutorado, realizada entre 2003 e 2007, a professora Ana Cláudia Suriani da Silva lança, agora, o livro “Machado de Assis: Do Folhetim ao Livro” (nVersos Editora, 288 páginas).

A pesquisadora (que também já se debruçou sobre o universo de Arthur Azevedo e Joseph Conrad) trata disso principalmente a partir de “Quincas Borba”, publicado, no formato de folhetim, em “A Estação”, edição brasileira de “Die Modenwelt”, revista de moda e entretenimento alemã. “Machado conhecia bem o seu público, por isso espelhou suas personagens, sobretudo as femininas, no leque dos possíveis leitores de carne e osso”, explica.

A professora acredita que outra característica da revista, que Machado de Assis aproveita na obra, é a sua inclinação imperial, com uma carga ainda mais irônica, para, assim, retratar a decadência da Monarquia antes da proclamação da República. Assim, a loucura de Rubião se manifesta através da megalomania imperial.

Ana Cláudia – que produziu o trabalho entre 2003 e 2007, no Centro de Estudos Brasileiros da Universidade de Oxford – aponta especificidades nas versões de “Quincas Borba” nos dois formatos – folhetim e livro.

"A leitura estendida ao longo de mais de cinco anos e feita em intervalos ritmados pela periodicidade quinzenal da revista é um elemento crucial na determinação do envolvimento do leitor, com a história e das suposições temporárias que iam sendo construídas, à medida que o texto era publicado”, diz, comparando o público-leitor do folhetim ao telespectador das novelas.

Além disso, o processo de leitura na revista estava embutido numa armação material diferente da do livro. “O leitor do folhetim tinha, no campo de visão, a continuação da narrativa e outros elementos textuais e iconográficos. Era, portanto, convidado, a todo tempo, a saltar de um texto (ou imagem) a outro”, argumenta a professora.

Para Ana Cláudia, Machado de Assis abandonou o folhetim, como meio de publicação primário dos seus romances, em função de uma experiência traumática com “Quincas Borba”, “uma vez que os parâmetros narrativos desse romance já não cabiam no folhetim”, enfatiza.

Reconhecimento

Dono de uma obra extensa e de estilo e texto impecáveis e únicos, Machado de Assis ainda não tem o reconhecimento do grande público fora do Brasil. Mas Ana Cláudia está otimista, principalmente por ter, pelo menos na Europa, crescido o interesse pela língua portuguesa e pela literatura brasileira, tanto nas universidades como entre o grande público.

“O número de feiras e festivais que homenageiam o Brasil e a sua literatura, e de traduções dos nossos novos autores, é considerável. Os clássicos certamente se beneficiarão com isso”, vaticina.

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