Trinta anos sem Cazuza: compositores mineiros falam sobre o legado do 'Exagerado'

Thiago Prata
@ThiagoPrata7
06/07/2020 às 19:37.
Atualizado em 27/10/2021 às 03:57

Há exatas três décadas, um dos maiores expoentes da música brasileira saía de cena de forma prematura. Aos 32 anos, Agenor de Miranda Araújo Neto, o Cazuza, morria em decorrência de um choque séptico causado pela Aids, deixando para a posteridade uma obra que mesclava canções de amor e críticas ácidas à sociedade e representava o epítome de uma geração. Uma poesia que segue atemporal, como enfatizam várias figuras mineiras ao Hoje em Dia.

“O que marca a obra de Cazuza é o discurso. Persiste nas composições dele uma visão crítica, aguda, muitas vezes irônica, de existência. Ele não se deixa levar por promessas de felicidade eterna ou qualquer outro tipo de idealismo. Pelo contrário, está sempre apontando as contradições do ser humano. Por isso sua obra vai na contramão do moralismo e se torna imortal”, ressalta o escritor, compositor e jornalista Raphael Vidigal.

Musicista, compositora e mentora do grupo Sara Não Nome, Sara Braga exalta a veia questionadora do “Exagerado”. “Ele teve uma relevância muito grande para a música brasileira, seus costumes, sua cultura, e até hoje isso reverbera muito, pela forma como ele vivia, sua sexualidade, sua performance. Uma música muito forte e atual é ‘Burguesia’. Estamos num momento em que a luta de classes se torna cada vez mais clara, por conta da crise que vivemos e a pandemia. E o Cazuza, naquela época (fim dos anos 80), já entendia que existia uma coisa muito podre e que é atual”, diz.

Poeta e cronista

Ao mesmo tempo, Sara destaca outro viés do cantor: “’Preciso Dizer que Te Amo’, que ele fez com Bebel Gilberto (e Dé), é uma das músicas mais bonitas da música brasileira e fala sobre amor e relacionamento. Se fosse resumir, eu diria que o Cazuza estava nesse lugar em que se fala da importância do amor e da liberdade acima de tudo”.

O músico e compositor Fábio Gruppi, ex-The Spacetime Ripples, ressalta que o legado do poeta carioca se faz presente de várias formas, mas acredita que “falta uma certa ‘Cazuzice’ do rock brasileiro de hoje em dia”. “Acho que o rap tem dado mais conta desse recado atualmente no Brasil, de transgredir barreiras e romper com preconceito em busca da liberdade para a gente poder ser o que a gente quiser ser”, destaca.

Canções como “Brasil”, “Ideologia” e “O Tempo Não Para”, na visão do vocalista e guitarrista do grupo Kaust, Emerson Fluyd, continuam sendo o retrato do Brasil. “Olha essa letra: ‘Eu vejo o futuro repetir o passado’. Isso foi escrito há mais de 30 anos. O que ele dizia é o que está ocorrendo agora novamente, os erros continuam acontecendo”, sintetiza.

E, como comenta Vidigal, Cazuza era um ser autêntico e único na música brasileira: “Não vejo herdeiros (musicais). Cássia Eller, provavelmente, foi quem melhor soube carregar esse legado. Cazuza dizia que cantava ‘o lado escuro da vida’. Além de, poeticamente, estar muito à frente de seus pares, hoje o que se vê são pessoas que pedem para o sol não esquecê-las”.

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