Acasos alimentam narrativa do filme japonês 'Roda do Destino'

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
01/01/2022 às 14:25.
Atualizado em 04/01/2022 às 00:17
 (PANDORA/DIVULGAÇÃO)

(PANDORA/DIVULGAÇÃO)

No primeiro dos três episódios de “Roda do Destino”, em cartaz a partir da próxima quinta-feira (6) no cine Belas Artes, duas personagens travam um longo diálogo num táxi. Quando uma delas sai do carro, a outra ocupante pede para o motorista fazer o caminho de volta.

Essa trajetória se repetirá em maior ou menor grau no filme japonês de Ruysuke Hamaguchi: um encontro repentino transforma a vida dos personagens, que se veem conduzidos a lugar inesperado, sempre misturado à fantasia e a ações orquestradas pelo destino.

É uma fantasia pautada pela palavra oral e a capacidade desta de provocar a imaginação. O melhor exemplo disso está na terceira parte, em que uma dona de casa encontra casualmente uma garota na estação do metrô. Esta diz reconhecer a mulher dos tempos de escola.

Logo saberemos que se trata de um engano, mas elas embarcam nesse universo farsesco como uma necessidade de momento: elas precisam se abrir e pôr para fora os seus incômodos. Assim criam uma amiga que não é imaginária e sim “emprestada”, se assim podemos definir.

Algo parecido foi mostrado em outra produção japonesa, “Uma História de Família”, do alemão Werner Herzog, sobre uma empresa japonesa que cria parentes de fachadas, em que os clientes buscam um sentimento postiço para preencherem a vida deles e de todos os que o cercam.

Apesar da simplicidade como são mostrados esses encontros em “Roda do Destino”, o texto é forte e capaz de nos tornar cúmplices dessas narrativas fantasiosas, explícito especialmente no segundo episódio, em que um escritor de contos eróticos se vê atraído em sua própria armadilha de sedução. 

Cultura

As mulheres são as principais protagonistas do filme, o que diz muito a respeito da cultura oriental, em torno de seus papéis sociais preponderantemente machistas. Ao se abrirem, elas revelam sentimentos represados e a vontade de serem, ao menos, ouvidas.

O mérito do longa de Hamaguchi é tornar essas revelações singulares, nos fazendo desejar escutá-las até o fim. Para um cinema cada vez mais apoiado no aspecto visual, com narrativas muito fragmentadas, filmes que se sustentam simplesmente em seus diálogos são uma raridade.

O tema amoroso se abre para discussões variadas, como as marcas de um relacionamento do passado a se refletirem no presente. Seriam eles mais uma pegadinha de nossa memória, que, com o passar do tempo, torna tudo mais doce? É a pergunta que o filme deixa no ar.

Curiosamente, todos esses encontros se mantêm praticamente inconclusos, colocando várias reticências sobre as dúvidas amorosas das personagens. Mais do que isso, deixa-se a dúvida sobre como aqueles encontros fortuitos foram transformadores na vida de cada um.

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