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Acervo de família mineira e livro lembram história da Panair do Brasil

Elemara Duarte - Hoje em Dia
Publicado em 21/11/2015 às 09:51.Atualizado em 17/11/2021 às 03:01.

Há 50 anos, quando Wilson Robini, tesoureiro da Panair do Brasil em BH, chegou para trabalhar, as portas da filial, situada na av. Amazonas, no Centro, estavam fechadas. Dos funcionários à porta, só alguns foram autorizados a entrar – entre eles, Robini, que tinha um cargo “sênior”. Porém, ele preferiu ficar do lado de fora, em solidariedade aos outros. O clima, claro, era de desolação. Um dos funcionários foi até o Parque Municipal e enfartou. Era o fim de uma das mais empreendedoras companhias aéreas no Brasil.

Robini morreu em 2010, aos 82 anos. Hoje, quem conta estas histórias e mantém um vasto acervo de documentos é a sua viúva, Inah, 83, que mora em Sete Lagoas com os filhos – entre eles, Gilson, 51, que aparece, aos 8 meses, no colo do pai, junto a um avião da Panair.

Sonho da adolescência

A Aerovias S/A de Minas Gerais (anos 1940) foi a primeira empresa aérea em que ele trabalhou. Lavava os aviões, pesava os passageiros para dividi-los a bordo. Em seguida, foi para a Panair”, lembra Gilson. Inah acrescenta que o funcionário Panair podia levar alguém da família para viajar de avião de graça.

Mas tudo acabou quando o governo militar cassou as concessões da empresa. Era 10 de fevereiro de 1965. “Ninguém na companhia cassada conseguiu dormir. (...) Não se via revolta ou raiva nos rostos. Tudo parecia um grande mal-entendido”, diz a recém-lançada e ampliada edição do livro “Pouso Forçado” (Record), do jornalista Daniel Leb Sasaki. Cinco dias depois, em Minas ainda ressoava a crise nacional da empresa. Na carteira de trabalho de Wilson, o registro: “Desligado por motivo de falência da empresa”.

Sasaki lembra que a relação entre a empresa e a sociedade ia além dos contratos de prestação de serviços. Ao Hoje em Dia, o autor diz que a Panair representava, ao mundo, o domínio e a competência dos brasileiros na aviação comercial. “Acredito que o nome ressoa forte ainda hoje também por causa da enorme violência que seus proprietários e servidores sofreram com o fechamento imposto”.

Inah e Gilson tinham três filhos na época. Ele foi trabalhar como auxiliar de enfermagem no Serviço de Assistência Médica Domiciliar de Urgência (Samdu), similar ao atual Samu.

“Meu pai tinha um orgulho ao falar da Panair. Até suspirava...”, diz Gilson. Anos depois, Wilson foi convidado a atuar na Aerolíneas Argentinas, onde se aposentou. Hoje, no acervo, os Robini guardam pedaços de uma lamparina, usada para marcar as pistas para pousos à noite, na Pampulha. O objeto nunca mais foi aceso.

 

Hoje em Dia

"ROBINE" - Validade do cartão funcional até 1967 foi interrompida abruptamente em 1965. Crédito: Acervo família Robini


Curiosidades

- A Panair trouxe voos domésticos para BH, Valadares, Montes Claros, Pedra Azul, Pirapora, Poços de Caldas, Uberaba e Uberlândia
- Todo ano, ex-funcionários da Panair do Brasil ainda se encontram em almoço de confraternização no Rio de Janeiro, mesmo meio século após a
empresa encerrar atividades
- “Conversando no Bar”, de Fernando Brant, se chamaria “Saudade dos aviões da Panair”. Mas, receando que não passasse pela censura, ele mudou o título


‘Nas asas da Panair’: simuladores de voo emocionam on-line

“Outro dia recebi um e-mail perguntando sobre como cancelar a passagem da Panair”, lembra o empresário carioca Marcus Hollanda. Radicado em Minas Gerais (na Zona da Mata) há 25 anos, ele exerce a presidência da “Panair Virtual do Brasil” (panairvirtual.com.br).

Trata-se de um grupo on-line para simular voos, fundado por Hollanda e mais quatro amigos. “Existem pilotos profissionais e amadores”, explica.

A diferença é que no mundo virtual não acontecem acidentes e/ou atentados e a chance de as licenças da “empresa” serem cassadas por algum governo ditatorial, como aconteceu com a Panair “física”, são remotas.
 

Hoje em Dia

DEMISSÃO COLETIVA - Na carteira de Wilson Robini, o protocolo feito cinco dias após cassação das concessões da empresa. Crédito: Acervo família Robini

Novo conteúdo do livro

“Em 2012, tive acesso à mesma base documental que seria, meses depois, estudada pelos membros da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Esse material, obtido por meio da Lei n° 12.527, de 2011, que regula o acesso à informação, trouxe à luz, pela primeira vez, fatos até então desconhecidos fora do âmbito militar”, lembra o jornalista Daniel Leb Sasaki, autor do livro “Pouso Forçado”.

Ele diz que os documentos revelaram detalhes sobre alguns mecanismos utilizados para desmoralizar Celso da Rocha Miranda, um dos acionistas majoritários da Panair do Brasil, ante a opinião pública e o mercado, e torná-lo “réu” em processos criminais forjados.

Além da referência à Panair do Brasil, há outras empresas pelas quais os participantes podem voar “virtualmente” como Gol, TAM e Varig, esta também extinta. Nas simulações, são usados os aviões de modelos antigos da Panair.

E nesta viagem pelo tempo, diz Hollanda, há pessoas que viram madrugadas nos comandos. “Saem do Rio com um Constelation, de 1943, e vão para Recife. Os instrumentos são mecânicos. A maioria dos pilotos que ingressam fala que é pelo saudosismo”. São mais de 400 inscritos. O cadastro é grátis.

No Facebook do site (que existe desde 2006), a integração acontece até com quem não curte as simulações. “Uma mulher pediu uma carta da Panair para o avô, com 90 anos, que tinha trabalhado na empresa. Ele estava com Mal de Alzheimer. Mandamos uma carta da Panair Virtual agradecendo a ele pelos trabalhos. Ela agradeceu muito”, diz.

Sasaki diz que, após o encerramento das atividades da Panair, os aviões mais modernos, a jato, foram arrendados “por pressão” à Varig e à Cruzeiro do Sul. “Boa parte da frota enferrujou no pátio do Galeão. Os leilões aconteceram entre 1969 e 1973. As fuselagens foram arrematadas por sucateiros e transformadas em lingotes de alumínio”. O jornalista diz que ainda hoje está preservado, no Museu Eduardo André Matarazzo, em Bebedouro (SP), uma aeronave DC-6, que voou temporariamente nas cores da Panair, nos anos 1960.

 

Hoje em Dia

 

A bordo, Serguei - "o divino do rock" cantava blues quando foi surpreendido ao ver as pernas de artista hollywoodiana

O roqueiro carioca Serguei (foto Multishow/Divulgação), que acaba de completar 83, no último dia 8, também guarda saudades da Panair do Brasil, onde trabalhava como comissário de bordo. Sérgio Augusto Bustamante, nome de batismo do músico, diz ao Hoje em Dia que, na companhia, conheceu artistas hollywoodianos e grandes nomes da música brasSergueiileira a bordo. Atualmente, o artista zela pelo seu histórico Templo do Rock, uma espécie de casa-museu onde vive, no município de Saquarema (RJ). E avisa: “Sou um eterno adolescente”.

Como foi sua carreira na aviação?

Fui comissário na linha internacional. Foi a maior companhia de aviação que já houve no Brasil. Mas foi fechada sem mais nem menos pelos militares, e nossas linhas foram entregues para a Varig. Trabalhei na Cruzeiro do Sul e, em seguida, consegui passar na prova, e fui para a Panair.

Que lugares você conheceu?

Boa parte da Europa e Estados Unidos. Que maravilha! A gente a chamava a Panair do Brasil de “Mãe Air”. Nossas diárias eram pagas em dólar. Éramos muito felizes, pois ganhávamos muito bem. O que aconteceu foi uma verdadeira tragédia imposta por um idiota.

Você já cantava rock and roll naquela época?

Eu ia para o “galley” (cozinha, geralmente no final do avião) e cantava rock and roll e um pouquinho de blues para os colegas. Em um avião da Panair, conheci uma rainha negra, Josephine Baker (1906-1975) – uma das maiores intérpretes do jazz e dançarinas americanas. Ela estava com uns 70 anos, foi até o galley, levantou a saia e disse para nós: “Look at my legs of a million dolars” (Olhe para as minhas pernas de um milhão de dolares). Eu levava um café da manhã exclusivo para ela. Conheci várias outras estrelas de Hollywood a bordo da Panair.

Servia com utensílios plástico?

Que isso!? Servíamos em louças. Os talheres eram em prata e os guardanapos eram alemães, de linho azul. Era uma coisa estupenda! Pela Panair, cansei de levar Roberto Carlos e a Wanderléa para a Jovem Guarda.

Algum recado para os mineiros?

Agradeço a todo povo de Minas Gerais. Uma vez fui a Coronel Fabriciano. Foi uma loucura! Todos gritavam. Eu dizia: “Vou morar aqui, vou trazer minha cama para cá”. Viva BH e viva, políticas à parte, Juscelino Kubitschek! Que tirou o Brasil daquela coisa de só crescer de um lado e invadiu o país, construindo Brasília. Quando ele morava no Palácio Laranjeiras, eu passeava por lá com uma garota, para admirar o jardim. Nós o chamávamos: “Juscelino! Juscelino!” Ele olhava pela janela e sorria para nós. (À reportagem) Ah, e obrigado por terem se lembrado de mim. Quando vierem ao Rio, a Saquarema, lembrem-se de conhecer o “Templo do Rock”, são dois andares para vocês serem transportarem para os anos 1960.

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